A dignidade humana é um tema constantemente em pauta, dada sua relevância e a necessidade permanente de ser debatido – sobretudo por, muitas vezes, não ser tratada como prioridade.
Em todas as esferas da sociedade, a dignidade humana se manifesta de forma significativa no mundo do trabalho. Esse tema foi abordado pela Igreja Católica já em 1891, em meio aos impactos da 1ª Revolução Industrial, por meio da encíclica Rerum novarum, do Papa Leão XIII. Esse documento histórico destacou a questão social e os direitos dos trabalhadores, defendendo o salário justo e condições de trabalho dignas, com o objetivo de promover o bem-estar social e a justiça em um cenário de profundas transformações no sistema produtivo e nas relações entre empregadores e empregados.
O Papa Leão XIV, ao escolher esse nome, prestou homenagem ao legado de Leão XIII, especialmente por seu pensamento sobre a dignidade no trabalho. A importância do diálogo social e da justiça social permanece como um desafio para a Igreja, particularmente frente às novas tecnologias – como a Inteligência Artificial (IA) – e aos dilemas trazidos pela 4ª Revolução Industrial.
Em dezembro de 2024, o Papa Francisco alertou os jovens que ingressam no mundo do trabalho para que “não cedam a exigências que humilham ou causam desconforto, a práticas que comprometam sua autenticidade”.
De fato, serão os jovens os mais diretamente afetados – e por mais tempo – pelas transformações da nova revolução industrial, especialmente no que se refere à Inteligência Artificial.
Segundo o neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis, a chamada Inteligência Artificial “não é nem inteligente, nem artificial”, pois carece de consciência, cognição e criatividade genuínas. A IA depende integralmente do trabalho humano para ser treinada e operada.
Contudo, há estudos que apontam que uma fração, talvez entre 10% e 20%, das capacidades da IA já envolve algum grau de autoprogramação. E se esse percentual crescer? Seria possível que a IA se tornasse totalmente autônoma?
A tecnologia, em si, pode e deve ser uma aliada dos trabalhadores – não apenas por criar oportunidades de emprego, mas por possibilitar a automação de tarefas repetitivas e perigosas, o que é extremamente positivo.
Entretanto, quando essa revolução tecnológica se dá dentro de uma lógica puramente capitalista, ela frequentemente serve para favorecer o capital em detrimento do trabalho. A produtividade e o lucro aumentam, mas esse ganho raramente é revertido em melhores salários ou na redução da carga horária dos trabalhadores. Os efeitos negativos, inclusive, extrapolam o mundo do trabalho e atingem a sociedade como um todo.
Seria lógico imaginar que, com o aumento da produtividade e dos lucros, os trabalhadores – que viabilizaram esse progresso – também fossem beneficiados, seja com remuneração mais justa, seja com mais tempo livre para uma vida com mais qualidade. Mas essa lógica depende profundamente da ideologia e da orientação econômica dominante no sistema.
Em 2021, o Papa Francisco lançou a iniciativa “Chamada de Roma por uma Ética na Inteligência Artificial”, incentivando a criação de grupos de estudos permanentes ao redor do mundo, com o propósito de promover o uso ético da IA.
O documento Rome Call for AI Ethics foi elaborado pela Pontifícia Academia para a Vida e, posteriormente, impulsionado pela Fundação RenAIssance, com o objetivo de estimular uma abordagem ética no desenvolvimento e aplicação da Inteligência Artificial.
Estamos, portanto, diante de um momento que exige reflexão profunda, para que sejamos conduzidos a atitudes conscientes, mantendo viva a esperança de um mundo no qual a dignidade humana seja, de fato, respeitada e valorizada.