A moda do contrato de namoro

O namoro sempre foi socialmente considerado uma etapa transitória da vida para se conhecer o outro, uma fase pautada na temperança, na moderação, no respeito à intimidade pessoal, na modéstia e na paciência. A seu respeito, a doutrina cristã sempre orientou que toda e qualquer relação entre um homem e uma mulher deva se construir aos poucos, para dar espaço à paulatina compreensão de vícios e virtudes, até haver condições para o estabelecimento de um compromisso em caráter definitivo. Nosso atual modo apressado de viver e inúmeras pressões sociais parecem levar o namoro, cada vez mais, para outros caminhos. Diversos casais passaram a adotar o contrato de namoro, uma estranha concepção da liberdade do casal.

A liberdade pautada em um contrato regula as relações entre os amantes, para colocar freios e esclarecimentos especialmente nas relações patrimoniais. O instrumento jurídico toma o lugar da intimidade.

Se o pular etapas virou algo comum e a permissividade dos costumes levou a facilitar demais as coisas, rumo ao reconhecimento civil de uma união estável quando não se quer casar, mas se equipara a entidade familiar ao casamento para fins de proteção, as pessoas passam a buscar a segurança jurídica e o freio dos excessos dessa liberdade e permissividade dos costumes nas cláusulas jurídicas.

Tantas vezes, excessos de demonstração pública passam a impressão diversa daquela que o próprio casal gostaria de passar. Embora ainda ausente à maturidade necessária para levar o casal a um relacionamento mais duradouro, estabelece-se uma corrida para antecipar resultados íntimos e estabelecer uma habitação comum, com grandes preocupações em relação a bens, direitos e pretensões das partes. Passa a imperar uma nova forma de prudência, a regrar restritivamente a etapa da relação transitória do casal.

No contrato de namoro, prevê-se o reconhecimento de que nada é tão estável nessa união quanto possa parecer a público.

Esse contrato de namoro vem sendo reconhecido como válido e eficaz pela literatura jurídica e pela jurisprudência por se pautar em questões disponíveis e focar em proteger, especialmente, aspectos patrimoniais, com incomunicabilidade de bens e impossibilidade de sua partilha, limitações a proteções legais da união estável, tais quais os alimentos, devido ao reconhecimento expresso pelas partes de ausência de seus elementos para equiparação da situação de fato à união estável, com consequente aplicação de efeitos civis do casamento.

Vale notar que o contrato de namoro em nada se confunde com um pacto antenupcial, no qual se preveem promessas prévias ao casamento e se trata de variação no regime de bens padrão da comunhão parcial ou o próprio contrato de união estável, equiparável, para todos os efeitos civis, ao casamento e no qual também se preveem especialmente a separação de bens na relação patrimonial.

O namoro e seu contrato, portanto, na forma como propostas nos dias de hoje, em nada se assemelham a uma preparação para uma união duradoura. Apenas refletem uma situação descompromissada e existente enquanto tal e reafirmem, por meio de uma disciplina jurídica, que nada é tão sério a ponto de afetar a lógica patrimonial do “o que é seu é seu, o que é meu é meu”.

Práticas jurídicas são produtos de uma cultura e de seus desvirtuamentos. Pode-se ter no contrato de namoro a evidência das vicissitudes atuais pelas quais passam os relacionamentos. O jurídico prevalece à construção confiante e moderada de uma relação amorosa; atribui-se à disciplina jurídica a solução para a tranquilidade do casal. Proclama-se em letras expressas a insuficiência da intimidade para a construção estável de uma entidade familiar, por medo, desconfiança, pouca concórdia e constatação de que tudo foi rápido demais. 

Por tudo exposto, conclui-se fundamental focar menos no aspecto jurídico-patrimonial e dar mais tempo ao tempo para o amadurecimento do relacionamento, para o conhecimento um do outro e para o fortalecimento do bem querer, elementos essenciais para se lograr a constituição efetiva de um núcleo familiar.

Crisleine Yamaji é advogada, doutora em Direito Civil e professora de Direito Privado. E-mail: direitosedeveresosaopaulo@gmail.com

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