Comunhão dos santos: o plano divino de salvação

Na última edição, refletíamos sobre a vida de santidade: como Deus nos chama, a cada um de nós, para uma vida de intimidade consigo, pela imitação de Cristo. Esta imitatio Christi, dizíamos, manifesta-se das formas mais diversas nos vários santos da Igreja: de padres a freiras, de médicos a engenheiros e crianças… Pois bem, hoje queríamos lembrar o ensinamento da Igreja sobre esta comunhão dos santos, esta grande família de almas amigas de Deus.

São Paulo nos ensina que existe um plano misterioso e divino de salvação, que Deus livremente propôs em seu desígnio benevolente: “Foi em Cristo que Deus Pai nos escolheu, já bem antes de o mundo ser criado, para que fôssemos, perante a sua face, sem mácula e santos pelo amor” (cf. Ef 1,3-10). 

E como se faria esta filiação adotiva, esta recapitulação de tudo em Cristo? Em princípio, Deus poderia ter disposto as coisas de tal forma que cada pessoa percorresse os caminhos de sua vida terrestre sem receber ou exercer influência sobre as outras – e, contudo, “aprouve a Deus salvar e santificar os homens, não individualmente, excluída qualquer ligação entre eles, mas constituindo-os em povo que O conhecesse na verdade e O servisse santamente” (Lumen gentium, 9). Em outras palavras: o país em que você nasceu, sua família, seu círculo de amigos… de alguma forma, tudo isso entra no desígnio providencial do Pai.

Mas as influências recíprocas entre os filhos de Deus não acontecem apenas entre aqueles que peregrinam juntos nesta terra (a Igreja Militante): também os membros da Igreja Triunfante (os santos no Céu) se relacionam conosco, nos ajudam… E muitas vezes, inclusive, este socorro nos vem de onde menos esperamos, de santos por quem nem temos tanta devoção. 

De fato, conta Santa Teresinha, em sua História de uma alma, de um sonho místico que ela teve, num momento em que passava por uma grande tempestade interior. No sonho, ela viu algumas santas carmelitas – dentre as quais a Beata Ana de Jesus, fundadora do Carmelo na França, que lhe falou com ternura e sorriso repletos de amor. “A tempestade já não se alastrava; o céu estava calmo e sereno… eu cria, eu sentia que existe um Céu, e que este Céu é povoado de almas que me amam, que me olham como sua filha… Esta impressão permanece em meu coração, especialmente porque a V. Madre Ana de Jesus tinha-me sido até então absolutamente indiferente (…). Assim, quando entendi até que ponto ela me amava, quanto eu não lhe era indiferente, meu coração se derreteu de amor e de gratidão, não apenas pela Santa que me visitara, mas ainda por todos os Bem-aventurados habitantes do Céu…”.

Pode ser que não tenhamos um tal sonho, que não venhamos a enxergar com tanta clareza estas amizades celestes: mas há também outras formas de fomentar esta relação. O “santo do dia” em que nascemos, ou em que aconteceram outras coisas importantes em nossa vida (Batismo, experiência de conversão…); ou santos que passaram por experiências semelhantes às nossas, ou que ensinaram verdades que nos tocam particularmente: tudo isso pode ser ocasião de estreitar a devoção a um santo em particular.

É isto a comunhão dos santos: uma multidão de almas que já contemplam a glória de Deus, e que nos amam como amigos queridos! Façamos nossas aquelas palavras com que o Papa Emérito Bento XVI se reconfortava, diante do fardo do ministério petrino, recém-assumido: “Quem crê nunca está sozinho nem na vida nem na morte. (…) Não estou sozinho. Não devo carregar sozinho o que na realidade nunca poderia carregar sozinho. Os numerosos santos de Deus protegem-me, amparam-me e guiam-me” (Santa Missa de entrega do Anel do Pescador, 24/05/2005).

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