Ele veio para todos

Nesta semana, celebramos a Solenidade da Epifania do Senhor, palavra grega que significa “manifestação”. Embora o Evangelho dessa Solenidade seja referente à visita dos reis magos ao Menino Jesus (cf. Mt 2,1-12), a tradição da Igreja costuma agrupar no mesmo mistério da Epifania também os episódios do Batismo de Cristo (cf. Mt 3,13-17) e da conversão da água em vinho, em Caná (cf. Jo 2,1-12), pois, em cada um desses três casos, Nosso Senhor torna manifesto pela primeira vez um aspecto relevante de sua identidade e missão.

Gostaríamos aqui de enfocar a visita dos reis magos e a revelação que ela contém: uma mensagem tão impressionante que São Paulo a introduz dizendo: “Irmãos, se ao menos soubésseis da graça que Deus me concedeu para realizar o seu plano a vosso respeito, e como, por revelação, tive conhecimento do mistério”. E que graça é essa? “Os pagãos são admitidos à mesma herança, são membros do mesmo corpo, são associados à mesma promessa em Jesus Cristo, por meio do Evangelho” (cf. Ef 3,2-3.6). 

A rigor, um leitor atento poderia encontrar, já desde o início do Antigo Testamento, certos indícios de que o desígnio salvífico de Deus superava os limites de nação e cultura e se estendia ao mundo inteiro. Toda a humanidade, afinal, remonta ao único tronco de Adão e Eva; e mesmo quando chamou Abraão, o pai na fé do qual descende o povo hebreu, Deus já deixara claro que ele e sua posteridade seriam uma “fonte de bênçãos” para “todas as nações da terra” (Gn. 12,2; 22,18). Depois da fuga do Egito, a aliança do Sinai previa que, embora os judeus fossem para Deus um “povo particular entre todos os povos”, como “reino de sacerdotes e nação consagrada”, eles exerceriam esta eleição como um “filho primogênito”, em benefício das demais nações, pois “toda a terra pertence a Deus” (cf. Ex 4,22; 19,5-6). E não faltaram ocasiões em que pessoas não judias foram incorporadas, por sua piedade e justiça, à aliança de Deus com Israel: a caananita Raab, a moabita Rute… 

Apesar disso tudo, era relativamente comum entre os judeus da época de Cristo distorcer a compreensão da eleição divina do povo de Israel, como se ser “filho de Abraão” tornasse desnecessária a conversão interior (Mt 3,7-9; Jo 8,33-34) ou como se esta eleição excluísse as demais nações: algo como “só nós somos filhos de Deus”.

Com isso em mente, conseguimos entender toda a força da revelação da Epifania: os magos do Oriente, acolhidos por Maria e José para venerar o Menino (e tomá-lo nos braços, por que não?), simbolizam todos os povos da terra, convidados à intimidade com Deus, por meio de Jesus Cristo.

Mas o que era verdade há dois mil anos continua sendo verdade hoje: a Boa-Nova de Jesus Cristo é universal, se dirige a todos os homens, independentemente de sua época e cultura, de sua condição social e convicções políticas. Que possamos também nós imitar esses magos, que souberam transcender limites culturais e diferenças políticas e ideológicas, e enxergar a resposta definitiva para seus anseios mais profundos naquele Menino, fora do qual não há salvação, “porque debaixo do céu nenhum outro nome foi dado aos homens, pelo qual devamos ser salvos” (At 4,12).

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