‘Eu também não te condeno’

O cartaz da Campanha da Fraternidade deste ano reproduz o relato da mulher que estava para ser apedrejada. Tudo começa na noite anterior ao fato quando Jesus havia discutido com um grupo de pessoas. Estas se dispersaram e foram para suas casas, enquanto Jesus, não tendo casa em Jerusalém, foi para o Monte das Oliveiras, onde existia um horto, lugar que costumava passar longo tempo em oração. No dia seguinte, antes do nascer do sol, Jesus já estava novamente no templo. O povo também veio bem cedo para poder escutá-lo. É nesse momento que chegam os escribas e fariseus trazendo uma mulher pega em flagrante adultério ser apedrejada, e, armando uma cilada, querem a opinião de Jesus. Se Ele dissesse “apliquem a lei”, eles diriam que Jesus não é tão bom como parece, porque mandou matar a pobre mulher; e, se falasse para não a matar, também diriam que Ele não é tão bom quanto parece porque nem sequer observa a lei. Sob a aparência de fidelidade a Deus manipulam a lei e usam da mulher para poder acusar Jesus. Como é terrível ver pessoas que vivem farejando os pecados dos outros e são incapazes de olhar para si próprias e perceberem que estão atoladas em pecados ainda maiores.

A lei previa que um homem e uma mulher flagrados em adultério deviam ser apedrejados, mas os legalistas que- rem aplicar a “lei da pedra” somente contra a mulher. Então Jesus se encurva, como encurvada estava a mulher, passa a escrever no chão e logo diz: “Quem entre vós não tiver pecado, seja o primeiro a atirar-lhe uma pedra”. A debandada começa pelos mais velhos até que ficam Jesus e a mulher. Nesse momento, a mulher tem a oportunidade de ser ouvida: “Mulher, onde estão eles? Ninguém te condenou?”. Ela respondeu: “Ninguém, Senhor”. Então, Jesus lhe disse: “Eu também não te condeno. Podes ir, e de agora em diante, não peques mais”.

Mais uma vez, uma mulher é coloca- da na mira do julgamento dos homens. Vimos recentemente que alguns governantes trataram com desprezo, ironia e deboche um projeto de lei que previa a distribuição de absorventes para estudantes do ensino médio e fundamental da rede pública, bem como para mulheres em situação de vulnerabilidade ou detidas. Persiste o assédio sexual, a sedução enganosa, o estupro, o aborto, o abandono, a violência e até a morte. Além dessas, há mais pedras sendo joga- das por aí, e, de forma escandalosa, estão sendo “abençoadas” por pessoas ditas “religiosas” que usam o nome de Jesus para jogar água benta ou ungir armas de fogo. Será que não leram aquele texto em que Pedro é repreendido por Jesus logo que corta a orelha de um guarda – “Pedro, guarda a espada na bainha, pois todos os que pegam da espada, pela espada morrerão”.

Brilhante é o desfecho, a “sentença de Jesus”. Primeiro, escuta a mulher, deixa-a falar e depois diz: “Vai e não voltes a pecar”. Não ficou bisbilhotando os peca- dos, mas a encorajou a ir e reconstruir a vida de um modo diferente e melhor. “É como o céu: Nós olhamos para o céu e vemos tantas estrelas, mas quando chega o sol, pela manhã, com muita luz, não vemos as estrelas. E assim é a misericórdia de Deus: uma grande luz de amor, de ternura. Deus perdoa não com um decreto, mas com um carinho, acariciando as nossas feridas de pecado” (Papa Francisco).

Por fim, neste tempo quaresmal, façamos também o caminho do profeta Isaías, que disse: “Não relembreis coisas passadas, não olheis para fatos antigos. Eis que faço novas todas as coisas”; e um outro caminho, aquele feito pelo apóstolo Paulo escrito na Carta aos Filipenses, em que afirma que a vida sem Cristo pode ser comparada a lixo ou estrume e que, depois de conhecê-lo, “esqueço o que fica para trás e me lanço para o que está na frente. Corro direto para a meta, rumo ao prêmio, que do alto Deus me chama a receber em Cristo Jesus”. E, ao avançar o tempo quaresmal, um belo gesto concreto pode ser nossa generosa oferta no Domingo de Ramos, para manter ou iniciar projetos ligados à proposta da nossa Igreja no Brasil, a qual traz o tema Fraternidade e Educação.

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