Após críticas de entidades médicas, jurídicas e de defesa da família, bem como da Igreja, o Senado adiou a votação do projeto de lei 2234/2022, originalmente aprovado na Câmara como PL 442/91, que prevê regulamentar a instalação e operação de cassinos, bingos, caça-níqueis e a exploração de jogos e apostas em todo o Brasil.
A matéria ia ser votada no dia 4 deste mês, mas sem ter havido um consenso entre os senadores, foi, por ora, retirada de pauta. A maioria dos parlamentares defendeu que se amplie o debate sobre o projeto de lei em comissões do Senado. “Fatalmente, incumbirá à próxima Mesa Diretora a definição sobre os desdobramentos desse projeto”, declarou o senador Rodrigo Pacheco, que deixará a presidência do Senado em 2025.
Em nota publicada no dia anterior, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), por meio de sua presidência, expressou “perplexidade” com o fato de o PL ter sido pautado para votação e apontou que a legalização dos jogos de azar pode “contribuir ainda mais para o aumento da criminalidade, associada com destaque para as fraudes, a manipulação de resultados, a corrupção e a lavagem de dinheiro”.
Esse alerta já havia sido feito em 2022 pelo Grupo Nacional de Combate às Organizações Criminosas, do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais do Ministério Público dos Estados e da União: “Da forma como foi aprovado o projeto de lei na Câmara dos Deputados, a exploração dos jogos de azar no País ficará em uma espécie de limbo fiscalizatório, com conse-quências gravíssimas nos combates à corrupção e à lavagem de dinheiro, tornando atrativa a instalação das máfias estrangeiras em território brasileiro”.
A volta à pauta desse projeto ganhou força em razão dos supostos benefícios financeiros que ele traria ao País, a partir do pagamento de dois tributos pelas operadoras de jogos: a Taxa de Fiscalização de Jogos e Apostas (Tafija) – com cobranças trimestrais entre R$ 20 mil e R$ 600 mil, a depender da área de operação – e a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico sobre a comercialização de jogos e apostas (Cide-Jogos), com uma alíquota de até 17% sobre a receita bruta. Segundo defensores da medida, a arrecadação poderia chegar a R$ 22 bilhões ao ano. O próprio Fernando Haddad, ministro da Fazenda, declarou, em julho, ser favorável à legalização dos jogos de azar: “Desde que seja bem disciplinado, bem-feito, moralizado, com a supervisão do Estado brasileiro e proteção ao cidadão, é uma coisa que pode gerar emprego e renda no nosso País”.
Esta lógica do “topa tudo por dinheiro”, porém, desconsidera que a regulamentação poderá aumentar a quantidade de pessoas viciadas em jogos, o chamado transtorno do jogo compulsivo, que se caracteriza pela perda de controle das ações. Há, ainda, maiores riscos de depressão e outros comportamentos que afetam diretamente as emoções e criam condição de dependência. Conforme dados divulgados em 2022 pela Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas, a taxa de suicídio entre pessoas com transtornos causados por jogos chega a 15%. No “fim das contas”, o que se “ganhará” em receitas acabará sendo gasto com mais custos em saúde mental no SUS e em coberturas no sistema de seguridade social aos afastamentos no trabalho por razões de saúde.
Como bem aponta a já referida nota da CNBB, há também “razões éticas e morais para não permitir o avanço deste Projeto de Lei, sem contar os muitos impactos nas famílias e os desequilíbrios socioeconômicos que eles geram”. Que tenhamos, portanto, um olhar atento à sua tramitação no Congresso em 2025, tendo em mente o alerta feito por Jesus: “Uma árvore má não pode dar frutos bons” (cf. Mt 7,18). O equilíbrio das contas públicas, valendo-se de recursos provenientes de algo que causa tantos malefícios, poderá, verdadeiramente, ter saldo positivo para a sociedade?