Quando alguma coisa não dá certo nos planos que fizemos, uma história se encerra na metade e outra história nova precisa começar. Os planos não dependem de uma só pessoa. Dependem de circunstâncias alheias à nossa vontade e capacidade. Por mais poder que uma pessoa tenha, mais dia menos dia, algum obstáculo intransponível aparecerá. Então, a cada plano que fazemos, é preciso que haja uma reserva também para os fracassos e as falências.
Pode-se dizer que o inesperado deveria fazer parte de nossos planos. Mesmo o planejamento que não depende dos outros, o que toca nas decisões pessoais, também esse não é absoluto. Até aí devemos lembrar que não somos autores da nossa própria vida. Nem sabemos quanto tempo temos nesta vida e neste mundo. No entanto, vale a pena investir na direção pessoal e na vida interior. Mas, não há como blindar a nossa vida das frustrações.
Na realidade, o inesperado faz parte da história e deveria fazer parte também dos planos. Nada mais realista! A consciência de que os planos mais promissores são também provisórios poderá nos ajudar a recomeçar sempre. E, mais do que corrigir a história, estaremos prontos para recomeçar. É assim que nos renovamos diariamente. Os erros e obstáculos acabam nos impulsionando a dar passos que não tínhamos pensado. Às vezes, esses passos podem ser os mais acertados e inovadores que alguém possa dar.
Nossa vida está em nossas mãos, mas não somente nas nossas. Está também nas mãos dos outros. E, sobretudo, está nas mãos de Deus. Mas, a cada recomeço, podemos tomá-la nas mãos novamente, com muito cuidado e respeito. E podemos, inclusive, entregá-la como oferta diária, como sinal de gratidão. Enfim, como o reconhecimento de que, na vida, estamos sempre administrando e cultivando os dons que recebemos, porque alguém nos ofertou tudo, absolutamente tudo o que temos.
Lembro-me do Evangelho e do confronto pessoal havido entre Jesus e Judas Iscariotes (cf. Mt 26,14- 25). Judas foi ter com os sumos sacerdotes e disse: “O que me dareis se vos entregar Jesus?” Combinaram, então, 30 moedas de prata. E daí em diante, Judas procurava uma oportunidade para entregar Jesus. A partir daí, a traição estava em curso. Judas permanecia ao lado de Jesus para executar o seu plano. Mas, a história da traição a Jesus trouxe um elemento novo: Ele sabia que seria traído e sabia até por quem. Ao cair da tarde, Jesus pôs-se à mesa com os doze apóstolos. Enquanto comiam, disse: “Em verdade, eu vos digo, um de vós vai me trair”. Eles ficaram muito tristes e, um por um, começaram a lhe perguntar: “Senhor, será que sou eu?” Então Judas, o traidor, perguntou: “Mestre, serei eu?” Jesus lhe respondeu: “Tu o dizes”. A traição, portanto, estava descoberta. O que significava que, tanto para Jesus quanto para Judas, as coisas poderiam tomar caminhos diferentes a partir daquele confronto. Judas sabia que tinha sido descoberto, e podia ter voltado atrás. A resposta de Jesus “Tu o dizes” podia ser entendida como “depende de você”. Por outro lado, o fato de Jesus saber que estava sendo traído podia ter provocado Nele uma mudança de planos: Ele podia ter fugido. Mas, não o fez! E Judas também não desistiu de seu plano. Cada um deles assumiu o risco e as consequências do que tinha decidido interiormente. Da parte de Judas, isso fez dele um traidor. Da parte de Jesus, consumou sua definitiva decisão de obedecer à vontade do Pai e entregar sua vida pela salvação do mundo. Cada um deles tomou o próprio destino nas mãos.