Como a formação acadêmica pode melhor atender às demandas das empresas e da sociedade?

Assunto foi refletido em evento on-line realizado pela Associação de Dirigentes Cristãos de Empresa de São Paulo

Centro Universitario FEI

“Desafios sob uma perspectiva de futuro. A academia está preparando os jovens para as demandas das empresas?” foi o tema de um café da manhã virtual promovido, na quinta-feira, 19, pela Associação de Dirigentes Cristãos de Empresa de São Paulo (ADCE-SP), com uma palestra do Prof. Dr. Gustavo Henrique Bolognesi Donato, reitor e presidente do Conselho do Centro Universitário FEI, mantido pela Fundação Educacional Inaciana. 

Inicialmente, Donato destacou que, perante o crescimento das novas tecnologias e de inovações como a robótica e a inteligência artificial (IA), as pessoas e organizações têm vivenciado um permanente processo de reaprendizado. 

“Estamos saindo de um mundo linear e experimentando um mundo exponencial, de intensa transformação, o que nos faz aprender a conviver com disrupções severas e o crescimento de tecnologias. Os mercados são novos, os problemas também e as soluções precisam ser novas. Há estimativas de que os problemas a resolver em 2030, bem como as oportunidades profissionais, serão em mais de 75% diferentes das que temos hoje. Assim, os modelos de negócio precisam ser questionados e se reinventar, as pessoas e as maneiras de desenvolvê-las igualmente, e o modo como lidamos com pesquisas, desenvolvimento e inovação também”, destacou. 

PANORAMA PREOCUPANTE 

Donato apontou que tanto as empresas quanto as instituições de ensino superior precisam entender melhor este momento de transformação e trabalhar em conjunto para a formação de pessoas bem preparadas tanto no domínio das tecnologias quanto nas questões de humanidades. 

Engenheiro mecânico de formação, docente do Centro Universitário FEI há 14 anos e autor de mais de 140 artigos, capítulos de livros e patentes, Donato alertou para as defasagens no “capital humano” no Brasil. “Vejam as dicotomias: somos o 11º país em investimento per capita em Educação, mas se olharmos a escala do Pisa [Programa Internacional de Avaliação de Estudantes], referente à formação em leitura, matemática, ciências, estamos na posição 68. É péssimo!”, enfatizou, destacando que isso também reverbera no ensino superior e, por consequência, na formação de pessoas que irão lidar com inovação e tecnologia. 

MUDANÇA DE MENTALIDADE 

Donato indicou que as instituições de ensino e as empresas devem ter nova mentalidade quanto à formação dos futuros profissionais. 

“Educadores, gestores e empresários precisam mudar a cabeça do forescasting para o foresight. O forescasting é uma visão que se pauta no uso dos dados passados e do hoje para prever o amanhã, só que isso representa um planejamento muito curto. Já se nós invertermos a lógica, vamos para um campo de visões de futuro, que é o foresight, a capacidade de ver aquilo que gostaríamos de atuar do ponto de vista empresarial, construindo um protagonismo, seja como profissional, seja como negócio”, explicou. 

Para tal, as instituições devem estar atentas às megatendências – grandes eixos de transformação social, econômica e tecnológica –, já bem definidas para as próximas décadas. “É preciso estudar bem estas megatendências e, depois, descer a um nível médio para identificar áreas estratégicas para cada profissão, negócio e a universidade. Por fim, ir ao nível micro, pensando em quais são as tecnologias habilitadoras. É aqui que entra a inteligência artificial e a robótica autônoma, por exemplo, com as quais nós vamos desenvolver a competência nas pessoas e nas nossas organizações”, detalhou. 

A FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA E A CARREIRA 

A formação do futuro profissional capaz de dar resposta às novas demandas envolve a mudança de algumas estratégias na Educação. Segundo Donato, a simples transmissão de conteúdo aos estudantes precisa dar lugar ao desenvolvimento de competências; as aulas expositivas e com os alunos em postura passiva de recepção de saberes deve dar espaço a uma metodologia ativa, envolvendo o criar, o pensar criticamente e o estímulo à resolução de problemas complexos. 

Todo esse reformulado processo desencadeará uma nova perspectiva de vida. “Não existe mais aquele planejamento de estudar até os 25 anos, trabalhar a partir disso e depois se aposentar. A vida passa a ser um contínuo, uma simbiose entre estes três elementos, incluindo o lazer, e há o lifelong learning [aprendizado contínuo ao longo da vida] tanto das corporações quanto das pessoas que as compõem”, destacou, indicando ainda que as corporações devem saber valorizar as diferentes competências das pessoas de acordo com os seus níveis de formação. 

Donato concluiu a palestra com uma provocação aos empresários participantes: “Será que nas corporações se está respeitando os perfis profissionais, valorizando quem merece ser valorizado e se construindo um bom portfólio, com visão de futuro?”, indagou, defendendo, ainda que governos, universidades e empresas atuem em harmonia em vista de objetivos comuns, alinhados às demandas da sociedade civil e às questões ambientais. 

FOCO NO BEM COMUM 

Gigi Cavalieri, presidente latino-americana da União Cristã Internacional de Dirigentes de Empresas (Uniapac), recordou que a organização, fundada há 90 anos, tem dialogado com as universidades para que os mais jovens já iniciem suas atividades voltados ao bem comum acima dos interesses individuais. 

“Já em 2018, a ADCE Brasil promoveu, junto com a FEI, um encontro internacional, o seminário O Futuro do Trabalho depois da Laudato si’, com o propósito de aproximar a academia, setor público, empresarial e sociedade civil, e desenvolver políticas que atendam às transformações tecnológicas, como IA. Precisamos de mãos e mentes com valores e princípios éticos cristãos, para acompanhar a velocidade com que a sociedade vem se transformando, bem como o trabalho integrado e cooperativo de vários atores e setores, e ter foco, como disse o professor Gustavo Donato, para utilizar as ferramentas, que hoje são inúmeras, e distinguir onde convergimos, para atuar e incluir a todos, de maneira sustentável”, disse ao O SÃO PAULO

Gigi, que também é presidente da ADCE-SP, recordou que no fim de abril a Uniapac realizou no Uruguai seu XIV Congresso Latino-Americano, com reflexões sobre institucionalidade, salário digno e economia humana sustentável. 

“Verificamos que estamos caminhando, talvez não na velocidade desejada, para a transformação cultural, tanto empresarial quanto da academia. Somos mais inclusivos e atentos às necessidades dos colaboradores e da comunidade onde as empresas estão sediadas. Por outro lado, identificamos a necessidade de estar mais envolvidos na política, colaborar com o governo na busca de soluções que priorizem o bem comum”, comentou Gigi Cavalieri, ressaltando ainda que a Uniapac, presente em 40 países, trabalha com valores e princípios éticos, os quais precisam ter ainda mais visibilidade “para animar e dar esperança aos jovens, para que saibam que têm onde aplicar e desenvolver a formação que receberam nas suas famílias e nas boas escolas”. 

De 20 a 22 de outubro, em Roma, acontecerá o Congresso Mundial da Uniapac, com o tema “Coragem para mudar”. Saiba mais detalhes em www.adcesp.org.br

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