De pais para filhos: na preparação do Natal, a transmissão da fé que atravessa gerações

Montar o presépio e a árvore de Natal são tradições mantidas em muitas famílias brasileiras e que proporcionam momentos de encontro e catequese entre pais e filhos, avós e netos

Felipe Rodrigues

Jair Militão da Silva, 72, professor universitário, e Maria Tereza, 67, psicóloga clínica, são pais de Daniel, Maria e Marta e avós de cinco netos. O casal herdou dos pais o costume de celebrar o Natal em família e faz questão de manter viva essa tradição.

Reunir a família todos os anos para a montagem do presépio e da árvore de Natal é “um costume que atravessa gerações e, hoje, vejo esse gesto se repetir no lar dos meus filhos, que replicam o aprendizado com seus filhos”, afirmou Silva.

Convicto na ideia de manter vivo o legado da fé herdada no ambiente familiar, o casal decidiu, então, usar a criatividade para vivenciar com a família o período de preparação. “Por exemplo, ao montar o presépio, a cada peça colocada, há um pequeno diálogo sobre a fé e o significado de cada personagem”, disse.

Silva recordou que tanto com os filhos quanto com os netos, o ato de criar, desenhar e explicar sobre os símbolos do Natal reporta a uma dimensão “pedagógica e catequética, sobretudo, para inserir as crianças no mistério do Natal cristão”.

“O ato de preparar juntos a casa, o cenário para os símbolos do Natal gera um ambiente de espera, de expectativa. Este ano, os netos, juntamente com os primos, criaram os personagens, o curral e a manjedoura. São momentos que significam muito”, ressaltou.

O professor recordou que as crianças aprendem e ressignificam a partir do exemplo e do testemunho dos pais. “No dia do seu casamento, o Daniel nos agradeceu por termos transmitido a fé para ele”, contou.

A FÉ EM FAMÍLIA

Arquivo Pessoal

Uma das filhas do casal, Maria Pereira Militão Moreira, 42, também é professora. Em entrevista ao O SÃO PAULO, ela falou da importância da dinâmica dos pais na transmissão da fé no ambiente familiar.

“Recebi a fé dos meus pais e tenho a possibilidade de transmiti-la para meus filhos”, disse, contando que mantém a tradição de, anualmente, reviver a preparação natalina em família.

“Tenho registrado na memória os momentos, ainda criança, com minha avó e ao lado dos meus pais, montando o cenário do presépio. Com carinho e amor, cada personagem era introduzido, seguido de explicações sobre a passagem bíblica e a simbologia do que estávamos fazendo”, contou.

Maria Pereira recordou ainda, que, no ano passado, ela e os filhos fizeram a peregrinação dos reis magos pelos ambientes da casa. A cada semana, eles estavam em um cômodo se aproximando da manjedoura.

“O presépio para as crianças remete a uma questão muito lúdica. Eles entendem esse colorido que o Natal traz como algo novo, cheio de significado, de partilha e união da família”, afirmou a professora.

A experiência, segundo ela, tem sido, a cada ano, de momentos de aprendizagem sobre o real sentido do espírito natalino e uma oportunidade de dialogar com os filhos sobre valores implícitos na história do Natal.

“Buscamos elucidar o verdadeiro sentido e a espiritualidade do Natal, para que este seja sinônimo de encontro, de esperança, de fé e família unida e reunida”, ponderou, recordando ainda que o jogral é um momento esperado pelos filhos e, que, além das celebrações na comunidade, aos domingos a família reza a oração das laudes.

“A única herança que podemos deixar para os filhos é a fé, uma vez que os bens materiais são passageiros, enquanto a fé é um legado que permanece e atravessa gerações. A oração e a espiritualidade são bases que nos fortalecem em todos os momentos, como esse que atravessamos de pandemia”, concluiu.

TODOS JUNTOS, UNIDOS

Lucas Militão Moreira, 14, é filho da Maria e neto do Jair. Recentemente, recebeu o sacramento da Crisma. O adolescente recordou que, desde pequeno, sempre acompanhou os pais à Igreja.

“Participar em família fortaleceu a minha fé e me aproximou de Deus. Além disso, montar o presépio e a árvore de Natal em casa são momentos de constante aprendizagem”, destacou, ressaltando a criatividade dos pais e avós para elucidar o sentido do Natal. “Todo ano, a cena se repete, de um jeito totalmente diferente”, disse.

O PRESÉPIO EM CASA

Arquivo Pessoal

 Na carta apostólica Admirabile signum, Admirável sinal (AS), sobre o significado e valor do presépio, de 2019, o Papa Francisco destacou que montar o presépio em casa “estimula os afetos, convida a sentir-nos envolvidos na história da salvação, contemporâneos daquele evento que se torna vivo e atual nos mais variados contextos históricos e culturais”, escreveu o Pontífice, apontando ainda, que “o presépio faz parte do suave e exigente processo de transmissão da fé. A partir da infância e, depois, em cada idade da vida, educa-nos para contemplar Jesus, sentir o amor de Deus por nós, sentir e acreditar que Deus está conosco e nós estamos com Ele, todos filhos e irmãos graças àquele Menino, Filho de Deus e da Virgem Maria” (AS,10).

“Armar o presépio em nossas casas ajuda-nos a reviver a história sucedida em Belém”, destacou Francisco, evidenciando que, “de modo particular, o presépio é um convite a ‘sentir’, a ‘tocar’ a pobreza que escolheu, para Si mesmo, o Filho de Deus na sua encarnação, tornando-se, assim, implicitamente, um apelo para O seguirmos pelo caminho da humildade, da pobreza, do despojamento, que parte da manjedoura de Belém e leva até a Cruz, e um apelo ainda a encontrá-Lo e servi-Lo, com misericórdia, nos irmãos mais necessitados (cf. Mt 25,31-46).

ORIGEM DO PRESÉPIO

 O presépio é um dos símbolos que alcançam de forma especial os lares católicos no tempo litúrgico do Advento e do Natal.

O termo vem do latim Praesepe, que significa “estrebaria” ou “curral”. E, geralmente, contém as imagens da Sagrada Família, cercada de animais, pastores, anjos e os reis magos. Contudo, o presépio pode ser representado apenas com as imagens da Virgem Maria, São José e o Menino Jesus.

O primeiro presépio de que se tem registro foi feito por São Francisco de Assis, em 1223, em uma gruta na cidade de Greccio, com o objetivo de facilitar a compreensão popular sobre o sentido do Natal.

O Santo de Assis queria que as pessoas compreendessem melhor o nascimento de Jesus. Assim, celebrou o Natal do Senhor rodeado de animais, para demonstrar a simplicidade do nascimento de Jesus.

As tradições bizantinas do Oriente cristão já retratavam a cena da Natividade do Senhor na gruta de Belém.

O presépio é montado no início do Advento e, geralmente, é desmontado no dia 6 de janeiro, data em que a Igreja celebra a solenidade da Epifania do Senhor.

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