Lucas Carvalhal: um talento do tênis de mesa, um campeão na vida

Aos 16 anos, revelação do esporte paralímpico conquistou a medalha de bronze no campeonato mundial da modalidade; sua grande vitória, porém, foi a de sobreviver a um tumor na infância

Arquivo pessoal

“Tenho que treinar bastante e disputar torneios para ganhar mais experiência e melhorar meu jogo para, um dia, ser o melhor do Brasil.”

Há quase quatro anos, em abril de 2019, ao encerrar a participação em um torneio para jovens talentos do tênis de mesa paralímpico, no Centro Paralímpico Brasileiro, na capital paulista, o adolescente Lucas Carvalhal Arabian já mostrava ter foco na carreira. De três anos para cá, em todas as competições nacionais que disputou, ele não foi derrotado e o saldo da temporada 2022 foi fantástico, incluindo uma medalha de bronze no campeonato mundial da modalidade, que ocorreu em novembro, na Espanha. Na ocasião, a seleção brasileira de tênis de mesa paralímpico obteve a sua melhor participação na história, chegando a sete pódios. 

“Eu sempre estabeleço metas. Em 2019, era a de ser o melhor do Brasil. Em 2021, busquei atingir uma boa posição no ranking mundial, estar entre os 20 melhores, e encerro 2022 como o 18o do ranking. Outra meta deste ano era a de participar do Mundial e consegui”, comenta Lucas, 16, que compete na classe 5 (para cadeirantes) no tênis de mesa paralímpico. 

Um ‘jogo acirrado’ pela vida

Tão rápido, quanto seus saques e rebates com a bolinha do tênis de mesa, foi a velocidade com que os desafios apareceram em sua vida. Quando tinha 1 ano de idade, Lucas foi diagnosticado com um tumor na medula torácica. Na mais tenra idade, precisou fazer duas cirurgias para a retirada do tumor, e perdeu boa parte dos movimentos da cintura para baixo. Em 2008, o tumor reapareceu e uma nova cirurgia precisou ser feita, com a posterior necessidade de quimioterapia e dos procedimentos de fisioterapia. 

Quando parecia que o “placar do jogo” ficaria a seu favor, novas dificuldades: em 2011, Lucas descobriu que uma fibrose estava estrangulando sua medula. Foi necessária, então, uma quarta cirurgia, após a qual ele começou a usar cadeira de rodas, e mais outro procedimento cirúrgico em 2012. 

“Imagino o quanto tenha sido difícil para a minha família tudo isso. Passei por cinco cirurgias quando era criança. As poucas coisas que me lembro é de alguns momentos no hospital, da minha família indo me visitar. Eu corri risco de vida, foi difícil, mas meus pais sempre fizeram de tudo para me ajudar e para que eu tivesse a melhor vida possível”, recorda Lucas ao O SÃO PAULO

De família católica, o que nunca faltou a Lucas foi amor e oração. Sua mãe, Cristine Carvalhal, devota de Nossa Senhora Aparecida, por incontáveis vezes, em especial nos momentos das cirurgias, entregava o filho aos cuidados da “Mãe do Céu”, uma atitude de fé que hoje inspira o jovem mesa-tenista. 

“Toda a minha família é muito católica, eles estão sempre rezando e orando por mim. Sempre que eu posso, vou à missa aos domingos. Além disso, nos torneios e jogos, faço minhas orações, pedindo a Deus para ir bem nas partidas”, recorda. 

De ponto em ponto

O primeiro contato de Lucas com o esporte foi jogando basquete. Depois, tentou o tênis de quadra. Em 2016, ele começou a treinar na Associação Desportiva para Deficientes (ADD): realizava aulas de natação três vezes por semana, e de tênis de mesa uma vez. A partir do segundo semestre de 2017, passou a se dedicar exclusivamente ao esporte das raquetes e das bolinhas. Voluntário nessa associação, Raphael Moreira, técnico da seleção brasileira paralímpica de tênis de mesa, percebeu o talento de Lucas para a modalidade e o convidou para treinar no Centro Paralímpico Brasileiro.

Em 2018, o adolescente participou do Campeonato Brasileiro pela primeira vez. Daí em diante, não parou mais de competir e treinar, intensamente, de segunda a sexta-feira, para progredir na carreira. Atualmente, Lucas recebe o Bolsa Atleta, benefício mensal pago pelo Governo Federal a esportistas, e é patrocinado pela empresa Oswaldo Cruz Química. 

O jovem talentoso não descuida dos estudos. Cursando o Ensino Médio, ele está matriculado em uma escola que lhe permite estudar de maneira remota, adequando horários à sua rotina de treinos e competições. “Eu recebo cinco vídeo-aulas por dia, assim as assisto nos melhores horários. As provas chegam em casa, e tenho tempo para fazê-las. Esse modelo me ajudou muito neste semestre”, detalhou. 

Com a mão de Deus

Apesar dos bons resultados em competições nacionais e internacionais, Lucas Carvalhal não obteve a classificação direta para o Mundial da modalidade, mas foi convidado para participar do torneio. “Para essa vaga, eu concorria com mais 30 atletas, e acabei sendo o escolhido. Com certeza, teve a mão de Deus nisso”, comentou.

Lucas comenta que ele e seu treinador não esperavam que alcançasse uma medalha nesta primeira participação em mundiais. O objetivo era de participar, conhecer o ambiente de um torneio desta magnitude e depois pensar em outras metas, como a classificação para os Jogos Parapan-Americanos, de Santiago 2023, e à Paralimpíada de Paris 2024. 

“No Mundial, meu desempenho foi além do esperado e consegui conquistar esta medalha de bronze no individual”, comemora. “Estar no Mundial foi uma coisa muito incrível, por tudo que vivi. Não esperava que isso iria chegar tão rápido na minha vida”, confidencia.

Passada a competição, Lucas realizou, neste mês, uma cirurgia para a correção de uma escoliose, que vinha se agravando. “Agora, o meu principal objetivo é me recuperar bem desta cirurgia. Depois, quero ter a certeza de que como estarei esportivamente, para pensar em como subir no ranking mundial, disputar o Parapan-Americano, buscando ser o campeão para a ter a vaga para a Paralimpíada de Paris 2024”, detalha.

Felicidade e gratidão à vida

Das batalhas vencidas longe dos ginásios esportivos e das conquistas alcançadas nos jogos de tênis de mesa, Lucas já tirou algumas certezas, a principal delas é que em todos os dias sempre há espaço para a felicidade. “Procuro, ao máximo, estar feliz, e passar esta felicidade para as outras pessoas. Sempre tento não reclamar de coisas idiotas, aquelas que cada um de nós consegue resolver. Por isso, mesmo quando as coisas não estão muito boas, busco sempre achar um ponto de vista positivo. Afinal, eu não tenho muito do que reclamar: recebo um apoio muito grande da minha família, tenho muitos amigos e ao redor da minha vida sempre entraram pessoas muito boas”, comenta. “Só espero coisas boas para 2023. E se o ano não estiver bom, acharemos um jeito de que fique bom”, projeta.

Conheça mais sobre Lucas Carvalhal Arabian

Redes sociais: @lucascarvalhaloficial

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