Mudanças sobre a forma antiga da missa visam ‘salvaguardar a unidade da Igreja’

Afirma o Cardeal Scherer, ao comentar a publicação do motu proprio do Papa Francisco Traditionis custodes

Cardeal Odilo Scherer, Arcebispo de São Paulo (foto: Luciney Martins/O SÃO PAULO)

Em entrevista ao O SÃO PAULO, o Cardeal Odilo Pedro Scherer falou das novas decisões do Papa Francisco sobre o uso da forma antiga do Rito Romano, publicadas na sexta-feira, 16.  

O Arcebispo de São Paulo ressaltou que “a Liturgia é a mais alta forma de oração da Igreja, sob a competência do Magistério da Igreja, e suas prescrições devem ser inteiramente respeitadas por todos, como sinal de comunhão de fé na mesma Igreja de Cristo”. Confira: 

O SÃO PAULO – O que significam, na prática, as novas determinações do Papa Francisco sobre o uso da forma extraordinária do Rito Romano?

Cardeal Odilo Pedro Scherer – O Papa é o legislador supremo da Igreja e, mediante o recente motu proprio Traditionis custodes, ele fez mudanças na legislação sobre a Liturgia, especificamente sobre o uso da forma pré-conciliar do Rito Romano. Desde 2007, por uma concessão do Papa Bento XVI, a forma pré-conciliar esteve liberada para qualquer padre, dentro de determinados requisitos. Agora, esse uso ficou bem mais restrito e, sobretudo, a vigilância sobre o seu uso voltou novamente para a responsabilidade direta dos bispos diocesanos.

O que motivou essa decisão do Pontífice?

Foi a constatação, após consulta ao episcopado da Igreja, que a concessão dada a alguns grupos de usarem “de maneira extraordinária” a forma da Liturgia pré-conciliar estava sendo motivo de discórdia e divisão na Igreja. De fato, a questão se tornou um problema sério para a unidade da Igreja e passou a ser, para certos grupos, uma expressão da sua não aceitação do Concílio e da autoridade da própria Igreja. As mudanças agora introduzidas têm a finalidade de promover a reforma litúrgica querida pelo Concílio Vaticano II e de salvaguardar a unidade da Igreja.

Há grupos que afirmam que a reforma litúrgica implementada após o Concílio Vaticano II ‘rompeu com a Tradição’. Como a reforma pode ser o motivo de discórdia e divisão na Igreja e objeto de rejeição de um concílio inteiro?

Seria bom perguntar: Qual “tradição”? É questão do uso da língua latina? Ou de certo jeito de celebrar o rito? Das vestes litúrgicas? A afirmação de “ruptura com a Tradição” não se sustenta. O rito e a forma da celebração evoluíram ao longo da história da Igreja e foram inculturados em diversos ambientes culturais. E isso não rompeu a verdadeira Tradição da Igreja em relação à celebração dos sacramentos que, em formas rituais diversas, manteve-se fiel à expressão da fé recebida dos apóstolos. O apego a formas passadas do rito ou a aspectos particulares como a língua, as vestes e certas tradições culturais pode ser motivo de divisão e cisma, quando se nega à Igreja a autoridade legítima de estabelecer a forma da celebração e se pretende que um grupo particular tenha maior autoridade e competência para estabelecer o certo e o errado na Igreja do que um inteiro episcopado num Concílio ecumênico, por exemplo. O problema, de fato, é mais profundo e se refere à falta de reconhecimento da autoridade da Igreja e da legitimidade e competência do Concílio Vaticano II.

Na carta enviada aos bispos para apresentar o motu proprio, o Papa lamentou que sejam cometidos abusos litúrgicos tanto na ‘missa nova’ quanto em relação à forma antiga. Como enfrentar esses desafios?

É preciso distinguir e entender bem o que são esses “abusos” e circunscrevê-los com objetividade. Nem tudo o que se divulga como “abuso” é, de fato, abuso litúrgico. Abusos devem ser sempre evitados e corrigidos, e a formação litúrgica do povo, dos clérigos e demais encarregados do serviço litúrgico nas comunidades precisa ser uma ação constante na Igreja, sob a autoridade dos bispos diocesanos, que são os autênticos “guardiões da Tradição da Igreja”, como recorda o Papa no motu proprio; eles são os “moderadores, promotores e cuidadores de toda a vida litúrgica em suas dioceses”. Algum abuso litúrgico, contudo, não pode ser pretexto para rejeitar a inteira reforma litúrgica do Vaticano II.

Qual é o papel da liturgia como expressão da unidade da Igreja?

Temos um trocadilho consagrado na Teologia e na Tradição da Igreja: “lex orandi, lex credendi; lex credendi, lex orandi”. Ou seja: nossa oração segue a fé; nossa fé se expressa pela oração. Portanto, a oração nunca deve ser dissociada da autenticidade da fé; e a fé verdadeira deve ser manifestada na oração. A Liturgia é a mais alta forma de oração da Igreja e, por isso mesmo, está sob a competência do Magistério da Igreja e suas prescrições devem ser inteiramente respeitadas por todos, como sinal de comunhão de fé na mesma Igreja de Cristo.

Como serão implementadas essas novas determinações na Arquidiocese de São Paulo?

Elas já passaram a valer imediatamente após a publicação do motu proprio nos órgãos oficiais de divulgação da Santa Sé. Na Arquidiocese de São Paulo, vamos divulgar as novas disposições do motu proprio – Traditionis custodes – para que sejam conhecidas e acolhidas por todos. Além disso, teremos de retomar a formação litúrgica, conforme é desejado pelo Concílio Vaticano II. Uma das recomendações mais insistentes da reforma litúrgica é a boa formação litúrgica, para que o povo de Deus participe ativa, consciente e piedosamente das ações litúrgicas e tirem o máximo proveito delas.

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Claudio tanaka
Claudio tanaka
2 anos atrás

Bergoglio é o legislador, executor e juiz. Enfim, um verdadeiro imperador, ou ditador, como queiram.
A missa é um escárnio, nada tendo a ver com o cristianismo apostólico, que era a leitura dos escritos da Torah e dos profetas. Ora, o novo testamento só foi escrito entre 40 e 90, e alguns anos depois seria reunido em canon. A missa católica precisa de uma sepultura, ou corpo, e um sacrifício. Por isso representar a morte de Jesus diuturnamente. Isso é paganismo, como diziam os seguidores de São Thomas Cristian, que evangelizou a Asia ate a India e china. Mas os ihs reescreveram a história, e continuam, para o mal da sinagoga de satanás.

Mario
Mario
2 anos atrás

Tanaca, a Santa Missa é a ‘Memória’ do sacrifício de Cristo na Cruz! “Fazei isso em MEMÓRIA de Mim” Em 1Coríntios cap. 11 vers 23,24,25 e 26: e em Lucas 22:19 = “Isto é Meu Corpo que é dado em favor de vocês, fazei isso em memoria de mim” “Este Cálice é a Nova Aliança no Meu Sangue; façam isso sempre que O beberem em Memória de Mim”. MATEUS 26:26-29: Quem NÃO comer do Meu Corpo e NÃO beber do Meu Sangue NÃO é digno de MIM! A Santa Missa é portanto continuação do que nos deixou Jesus em favor de Toda a Igreja e na continuação dos Apóstolos. Quem Crê SALVARÁ mas quem NÃO crê se perderá para sempre. Deo Gratias…

Peterson
Peterson
2 anos atrás

É necessário eliminar e extirpar a maligna ideologia cismática lefebvrista da Igreja Católica Romana. É isso que o Papa Francisco está fazendo através desse novo Motu Próprio. Os lefebvristas são hereges e cismáticos e estão fora da Igreja Católica. Infelizmete eles se aproveitaram dos Motu Próprio de 2007 e começaram a introduzir sua ideologia herética cismática entre os fiéis que promovem esses grupos de Missa Tridentina. Quem já frequentou esses grupos sabe que eles estão contaminados com a ideologia lefebvrista e cripto-lefebvrista usando a Missa Tridentina não por piedade, mas de forma ideologizada e instrumentalizada para atacar o Papa, o Concílio Vaticano II e a Missa de Paulo VI. É preciso dar um basta nisso , e é isso que o Papa Francisco está fazendo. Parabéns Papa Francisco!

ExtraEcclesiamNulamSalus
ExtraEcclesiamNulamSalus
2 anos atrás

Pregam o ecumenismo e o diálogo com todas as crenças, mas quando se refere aos tradicionalistas (ou seja, católicos), que rejeitam essa heresia e os abusos que tomaram todas as paróquias, se transformam em verdadeiros tiranos, e pretendem extinguir o venerável Rito Romano de 1500 anos.
«Os verdadeiros amigos do povo não são nem revolucionários, nem inovadores, mas tradicionalistas» -São Pio X.