Países ricos prometem cortar emissões e aumentam pressão sobre o Brasil

Entenda de onde vêm as preocupações com o desmatamento no País e qual é a responsabilidade dos grandes emissores de gases que ocasionam o efeito estufa

Ralf Vetterle/Pixabay

O Brasil está entre os dez maiores emissores de gases causadores do efeito estufa no mundo. Mas está longe de ser o primeiro. China, Estados Unidos e Europa, juntos, emitem praticamente metade de todo o carbono jogado na atmosfera. O Brasil aparece apenas em sétimo lugar, com cerca de 3% do total.

Por que, então, estamos no centro das atenções no cenário global? “O Brasil se insere nesse contexto principalmente por causa das florestas”, explica ao O SÃO PAULO o diretor de economia verde do WWF-Brasil, Alexandre Prado. “Num planeta que tem o problema do aquecimento, as florestas são os resfriadores e mantenedores de carbono, um estoque de carbono.”

Principalmente a Amazônia, que é a maior floresta tropical do mundo, ajuda a reter parte do calor emitido em outras regiões. Não é verdade que ela seja o “pulmão do mundo”, como se dizia, mas sem as florestas há mais seca e, consequentemente, um efeito catalisador de aquecimento.

Em novembro deste ano, haverá uma nova cúpula do Clima, em Glasgow, na Escócia, a COP26. Líderes de todo o mundo têm prometido ser mais ambiciosos no combate ao aquecimento global.

O problema do aquecimento

Desde a segunda metade do século XX, o mundo percebeu que o clima estava mudando. Nos anos 1980 e 1990, climatologistas, físicos, geólogos e meteorologistas concluíram que a elevação das temperaturas do planeta vinha da ação humana, principalmente da emissão de gases de efeito estufa, como o dióxido de carbono (CO2), o metano e os hidrofluorcarbonetos (HFC). Eles retêm o calor na Terra.

São gerados, principalmente, em atividades que necessitam da queima de óleo, gás e carvão. “Alguns países como China, Estados Unidos ou a Europa, usam essas fontes para gerar energia elétrica”, explica Prado. Além da produção industrial, há a calefação das casas, pois os invernos são rigorosos. Enquanto no Brasil a principal fonte de eletricidade é hidrelétrica – o movimento da água em turbinas –, nos maiores poluentes a matriz é “suja”.

Isso não quer dizer que todos os lugares do mundo estão mais quentes, mas que, por causa da elevação da temperatura média do planeta, variações drásticas do clima podem ocorrer. Alguns lugares terão chuvas excessivas, outros ficarão mais secos, outros com oscilações bruscas de temperatura.

Compromissos assumidos

Hoje, de acordo com a agência espacial dos Estados Unidos, a Nasa, 97% de todos os cientistas do clima que publicam artigos nas revistas científicas concordam que “o mundo está mais quente e é extremamente provável que isso ocorra por causa da ação humana”.

Um dos principais organismos que propõem políticas globais é o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC). Em relatório de 2018, esse organismo diz que as atividades humanas já causaram cerca de 1°C de aquecimento global acima dos níveis pré-industriais (ou antes da industrialização, a partir de 1750).

“É provável que o aquecimento global atinja 1,5°C entre 2030 e 2052, caso continue a aumentar no ritmo atual”, afirma o documento. O compromisso assumido por 195 países no Acordo de Paris, de 2015, é de não deixar a temperatura subir mais do que esse 1,5°C. De preferência, a ideia é que não se chegue a 2°C.

Para isso, a única alternativa é reduzir as emissões. Cada país é responsável por estabelecer as próprias metas e prazos. Essas emissões podem ser compensadas com medidas de neutralização, como replantar florestas, por exemplo.

Cerca de 70% da produção global terá que vir de energia solar ou eólica, e a indústria terá que criar formas para emitir menos poluentes, segundo a Agência Internacional de Energia (AIE). É uma virada radical: em 2020, os combustíveis fósseis ainda forneciam 80% da produção energética global. Para isso mudar, é preciso investir cerca de US$ 3,5 trilhões em novas fontes de energia, diz a AIE.

Se nada for feito, esperam-se riscos “para a saúde, os meios de subsistência, a segurança alimentar, o abastecimento de água, a segurança humana e o crescimento econômico”, diz o IPCC. Reverter a trajetória seria chegar a “zero emissão” de carbono até 2050.

O que prometem os maiores emissores

Embora os países industrializados sejam os maiores emissores, os mais pobres sofrem mais com os impactos. Após um congresso, em 2017, os membros da Pontifícia Academia de Ciências emitiram uma declaração, dizendo que “os mais pobres do planeta, que ainda confiam em tecnologias do século 19 para atender às necessidades como cozinhar e esquentar [comida], estão sofrendo uma pesada carga pelos danos causados pelas atividades econômicas dos ricos”. Entre esses danos, “inundações, megatempestades, temperaturas extremas, secas e incêndios florestais”.

No encontro de líderes mais recente, organizado pelo presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, em abril deste ano, alguns dos maiores emissores atualizaram suas metas. Os Estados Unidos prometem reduzir suas emissões à metade até 2030. A China diz que chegará ao “carbono zero” antes de 2060. A Alemanha quer chegar lá em 2045. O Reino Unido quer diminuir as emissões em 78% até 2035.

A pergunta que se faz é: essas são metas realistas?

Segundo Alexandre Prado, do WWF-Brasil, são realizáveis, porém mais poderia ser feito. “Esses compromissos são informais. Podem ser atingidos, mas não são o ideal em termos de necessidade para evitar mudanças climáticas no planeta”, diz. “Quanto menos ambicioso a gente for, maior o risco de ver catástrofes ambientais.”

Brasil tem eletricidade limpa, mas destrói florestas

O Brasil diz que acabará com as emissões até 2050. Como sua principal fonte de energia elétrica não tem origem na queima de óleo, gás e carvão, e sim no movimento d’água, a maior parte do problema está nos transportes e no desmatamento. O Governo federal afirma ser possível acabar com o desmatamento ilegal até 2030 e promete reverter a atual tendência de aumento.

Na Amazônia, o desmatamento vinha caindo desde 2004, atingindo um nível mínimo em 2010, de acordo com o sistema Prodes do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Em 2020, alcançou o nível mais alto desde então, com 11 mil km² de área desmatada.

“Dada a nossa riqueza de biodiversidade, o Brasil tem tudo para ser uma referência de desenvolvimento econômico, com manutenção e uso efetivo dessa biodiversidade”, afirma Prado, em defesa da conservação das florestas.

Refere-se às tecnologias para aumentar a produtividade do agronegócio sem desmatar mais, ao manejo de florestas e à expansão da biotecnologia e das ciências médicas com recursos naturais. Isso poderia ser feito, por exemplo, criando “grandes centros de conhecimento e gerando patentes [de medicamentos].”

De acordo com Prado, “se o Brasil desflorestar toda a Amazônia, é impossível a gente chegar a 1,5-2°C. O planeta vai sofrer impactos socioambientais significativos”, e é daí que vem toda a pressão internacional. “Os países industrializados emitem mais. Mas os erros deles não justificam os nossos”, avalia.

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