Teólogo italiano destaca caminhos para a prevenção de abusos na Igreja e na sociedade

O Instituto Santo Tomás de Aquino, de Belo Horizonte (MG), em parceria com o Serviço de Espiritualidade e Teologia Pastoral, da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, realizou, no dia 8, uma conferência on-line sobre o tema “Abusos: não apenas prevenção, mas cultura do respeito pelo mistério da pessoa humana”. 

Para abordar a temática, foi convidado o Padre Amedeo Cencini, sacerdote italiano, professor de Teologia na Pontifícia Universidade Salesiana, em Roma, do Centro Teológico San Zeno, de Verona, e que também leciona Pastoral Vocacional, Direção Espiritual e formação para maturidade afetiva, no curso para formadores de seminários da Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma. 

Desde 1995, ele é consultor do Dicastério para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica e membro do Serviço Nacional para a Proteção de Menores da Conferência Episcopal Italiana. É, ainda, autor de diversos livros sobre a vida consagrada e formação religiosa. 

Ao iniciar sua conferência, o professor classificou o fenômeno dos abusos como um drama que envolve a Igreja e a sociedade, que causa “grande angústia e desconcerto”, mas que deve ser enfrentado com realismo, conscientes de que “qualquer abuso é sempre responsabilidade de toda a comunidade”. 

O Sacerdote recordou que, nas últimas décadas, especialmente desde o pontificado do Papa Bento XVI, cresceu fortemente a sensibilidade pela questão dos abusos perpetrados contra menores e contra pessoas vulneráveis por membros da Igreja. “Os gestos proféticos feitos a esse respeito pelo saudoso Pontífice marcaram uma mudança de ritmo na reflexão eclesial e na discussão sobre o problema”, afirmou. 

Esse “processo de purificação e sensibilização” já em curso, destacou Cencini, foi continuado pelo Papa Francisco, sobretudo, com a criação da Pontifícia Comissão para a Proteção dos Menores e atualização das normas sobre os procedimentos canônicos para esses casos. “Dessa maneira, o Santo Padre [Francisco] fez com que o tema dos abusos se tornasse assunto em pauta de toda reflexão eclesial, em todos os níveis e, antes de tudo, que a ação corretiva sobre esse ‘câncer’ que corroeu a Igreja por dentro fosse real, determinada e eficaz”, completou. 

DADOS 

Ao apresentar alguns dados sobre a situação dos abusos, o professor enfatizou que, embora os levantamentos mostrem que dois terços de todos os abusos aconteçam no ambiente familiar, sempre causará tristeza e preocupação que também ocorram, mesmo que em menor proporção, no ambiente eclesiástico. 

As pesquisas também mostram que cerca de 60% das vítimas sofrem de transtornos psicofísicos ao longo da vida. “É preciso deixar claro que, quando os abusos são perpetrados por pessoas eclesiásticas, há uma consequência muito grande também no âmbito espiritual”, observou o especialista, acrescentando que, embora nem todos os abusos sexuais tenham relevância penal, todos sempre trazem consequências para a pessoa que o sofreu. “As feridas dos abusos não têm prazo legal e vencimento, não prescrevem”, completou. 

Sublinhando que o número de casos de abusos reportados ainda é inferior aos que, de fato, ocorrem, em todos os âmbitos o Sacerdote italiano reforçou a importância de que sejam denunciados e haja colaboração com as investigações. 

CULTURA DO RESPEITO 

Ao tratar da chamada “cultura do respeito pelo ministério da pessoa”, Padre Amedeo Cencini explicou que ela se baseia em três elementos fundamentais: “a mentalidade, a sensibilidade e a práxis existencial”. Nesse sentido, o professor enfatizou que o verdadeiro desafio é que as mudanças da política eclesial na gestão dos abusos se tornem realmente uma cultura, um modo habitual de enfrentar o problema. “Para isso, devemos passar das recomendações teóricas dadas pelas autoridades, a uma verdadeira e própria cultura que torne todos conscientes de sua responsabilidade”, frisou. 

Sobre os procedimentos preventivos das dioceses e ordens religiosas em relação aos abusos, o Teólogo indicou essencialmente dois. O primeiro é uma revisão dos conteúdos da formação inicial. “Devemos inserir no caminho formativo dos sacerdotes e consagrados novos temas e conteúdos que enfrentem explicitamente o problema dos abusos.” 

A segunda proposta se refere à qualidade do acompanhamento dos agentes eclesiásticos. Padre Amedeo observou o risco de que jovens se tornem sacerdotes ou religiosos sem haverem percorrido um verdadeiro caminho de acompanhamento pessoal nas dimensões humana e espiritual. “Essas pessoas acabam se tornando consagradas sem conhecerem profundamente a si mesmas, seus limites, assim como suas potencialidades”, disse. Sobre esse aspecto, o professor acrescentou que, além da formação inicial, é fundamental que se valorize a formação permanente como “uma dimensão concreta, operativa, essencial na vivência da vida cristã”, que, portanto, não diz respeito apenas aos clérigos e consagrados, mas a todos os batizados, corresponsáveis na missão da Igreja de cuidar dos menores e vulneráveis.

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