Com avanços nos testes, CoronaVac pode ser a primeira vacina contra a COVID-19 no Brasil

Conheça os detalhes do imunizante que está sendo desenvolvido pelo laboratório chinês Sinovac em parceria com o Instituto Butantan e qual será a prioridade de vacinação assim que houver a aprovação da Anvisa

Foto: Agência Brasil

O Instituto Butantan, mantido pelo governo do Estado de São Paulo, recebeu, na quarta-feira, 28, autorização da Agência Nacional de Vigilância Sanitária para importar a matéria-prima necessária para a fabricação das primeiras doses da CoronaVac, a vacina contra a COVID-19 desenvolvida pelo laboratório chinês Sinovac, em parceria com o Instituto.

No dia 23, a Anvisa já havia permitido a importação de 6 milhões de doses prontas desse imunizante.

Entre as quatro vacinas contra a COVID-19 em fase de testes no Brasil, a CoronaVac é a que está em estágio mais avançado de estudos clínicos de segurança e eficácia.

Ainda no dia 23, o governo paulista informou que serão criados mais seis centros de pesquisa científica para testagem e desenvolvimento desta vacina, totalizando 22 locais em São Paulo, Minas Gerais, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Distrito Federal.

A evolução dos testes, porém, não significa que em breve a CoronaVac estará disponível para a população, uma vez que um detalhado protocolo precisa ser seguido.

Etapas

A CoronaVac, que é produzida com vírus inativados do novo coronavírus (Sars-CoV-2), já está na fase 3 dos estudos clínicos, tendo sido aplicadas mais de 12 mil doses em um grupo de 9 mil voluntários no Brasil, entre 18 e 59 anos, todos profissionais da área da saúde. As duas primeiras fases ocorreram na China, com mais de 700 pessoas (leia detalhes sobre as fases na parte final da reportagem).

“O estudo como um todo dura 12 meses. Neste momento, estamos procurando a eficácia da vacina. Segurança nós já temos. Agora precisamos dos dados de eficácia e para isso dependemos que haja 61 casos confirmados [entre os que efetivamente receberam a vacina, pois parte recebeu placebo]. Cumprida esta etapa, completa-se o primeiro dossiê e é ele que permite à Anvisa fazer o registro da vacina”, explicou o diretor do Instituto Butantan, Dimas Tadeu Covas, em coletiva de imprensa no dia 19.

Neste mês, os testes com o imunizante passaram a ser feitos também com idosos, que tiveram ou não exposição ao vírus. Em novembro, maiores de 18 anos com comorbidades também farão parte dos estudos e ainda se prevê para meses posteriores a inclusão de gestantes (no terceiro trimestre de gestação) e crianças.

Com menor índice de efeitos adversos

O diretor do Instituto Butantan informou que a CoronaVac apresentou o menor índice de reações adversas leves após a aplicação na fase 3 em um comparativo com outras quatro vacinas, e que não houve registro de efeitos colaterais.

Após receberem a primeira dose, 19% dos participantes tiveram dor no local da aplicação e 15% relataram dores de cabeça. Na segunda dose, as reações adversas mais comuns foram dores no local da aplicação (19%) e de cabeça (10%), além de fadiga (4%). Febre baixa foi registrada em apenas 0,1% dos casos.

Qual o resultado desejado na fase 3?

Segundo o secretário estadual da Saúde, Jean Gorinchteyn, a segurança da vacina foi comprovada pelos efeitos colaterais mínimos já atestados e pelo alto índice na produção de anticorpos para neutralizar o vírus – 94,3% dos que receberam a primeira dose desenvolveram tais anticorpos e na segunda dose esse percentual subiu para 98%.

“Agora, nessa fase 3, a fase clínica, se espera comprovar a eficácia, ou seja, oquanto uma vacina é capaz de proteger para aquilo que ela se propôs. Se tivermos em uma pandemia, como a que estamos vivendo hoje, com uma vacina que proteja 50% da população, haverá diminuição da gravidade de doenças para muitos, bem como redução da mortalidade”, explicou o secretário.

Dado o contexto de pandemia, esse percentual de 50% de eficácia é o índice considerado aceitável pela Food and Drug Administration (FDA) – agência federal regulatória dos Estados Unidos –, pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e também pela Anvisa.

Passos seguintes

Se a CoronaVac atingir os índices necessários de eficácia e segurança, terá seu registro avaliado pela Anvisa e, se aprovado, poderá ser incluída no Plano Nacional de Imunizações, para ser distribuída à população, em campanhas de vacinação feitas por meio do Sistema Único de Saúde (SUS).

Quem terá prioridade na vacinação?

De acordo com Dimas Covas, a vacinação no meio da pandemia deverá proteger primeiramente aqueles que têm o maior risco de contágio, como os profissionais da saúde, idosos, pessoas com comorbidades e profissionais da educação e segurança pública.

O diretor do Instituto Butantan explicou, ainda, que não será necessário vacinar toda a população. “Na medida em que a imunidade coletiva progride, a pandemia vai naturalmente sendo controlada; assim, não é 100% da população que precisa ser vacinada”. A vacina também não será necessária para aqueles que já se infectaram com o vírus e desenvolveram imunidade.

AS ETAPAS DO DESENVOLVIMENTO DE UMA VACINA

O Instituto Questão de Ciência apresenta em seu site (https://iqc.org.br) um material explicativo sobre o desenvolvimento das vacinas contra a COVID-19. Um dos conteúdos, de autoria de Natalia Pasternak, presidente do IQC, e de Gustavo Cabral de Miranda, doutor em Imunologia, que assim como Natalia é pesquisador do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP, trata das fases do desenvolvimento das vacinas.

Pré-clinica: Antes dos testes clínicos em humanos, a vacina é aplicada em animais, geralmente roedores e macacos, para verificar se causa algum efeito colateral grave e se gera resposta imune;

Fase 1: É aplicada em dezenas de voluntários jovens e saudáveis para testar a toxicidade e os efeitos colaterais. Busca-se saber se a vacina não faz mal a ninguém;

Fase 2: Feita com centenas de voluntários, divididos por faixa etária. A meta é saber se a vacina é capaz de provocar uma resposta no organismo; assim, espera-se pela produção de anticorpos, porém ainda não é possível mensurar sua eficácia;

Fase 3: É a fase mais longa dos testes, pois se buscará comprovar a eficácia da vacina. Por isso, ela é aplicada em milhares de voluntários, de uma população diversa. Parte dela recebe a vacina de verdade; a outra, placebo. O resultado esperado é que o número de infectados pela doença entre aqueles que receberam o imunizante seja significativamente menor do que o do outro grupo. Cada vez que um membro de um dos grupos adoece, registra-se um “evento”. A fase 3 só é concluída após se chegar a um número de eventos que permita fazer uma comparação estatística entre os grupos envolvidos no teste. Por isso essa fase é a mais demorada e só termina quando a quantidade de eventos permita calcular a efetiva eficácia da vacina. Se assim for comprovado, a vacina é liberada para a aplicação na população.

Por quanto tempo se estará protegido?

De acordo com a OMS, uma vacina precisa proteger por pelo menos um ano. No entanto, frente à crise da pandemia, já se considera aceitável uma vacina que possa proteger por, no mínimo, seis meses. Ainda não é possível saber com qual periodicidade será preciso tomar a vacina contra a COVID-19.

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