São Leão Magno: testemunho de vida em favor da unidade da Igreja

Memória litúrgica do Santo, que foi papa no século V, é celebrada nesta terça-feira, 10 de novembro

O Papado de São Leão Magno foi, certamente, um dos mais importantes da história da Igreja. Essencial para consolidar a primazia da Sé de Pedro, o Papa São Leão Magno é um figura histórica central num momento difícil do Ocidente que soube salientar o papel da Igreja em trazer unidade a um mundo fragmentado e em decadência.

Leão nasceu em Toscana, na Itália, em 395, e cedo se mudou para Roma, a Cidade Eterna, a que chamava de “minha pátria”. Ainda jovem, foi incorporado ao clero romano pela ordenação diaconal. Mesmo antes de sua ordenação, pela sua inteligência, caráter e prudência, havia já recebido do Papa Sisto III uma missão diplomática junto de Santo Agostinho.

Sua fama cresceu rápido na Cidade Eterna e, em 430, quando era arquidiácono de Roma, Cassiano, bispo de Marselha, o chamou de o “ornamento da Igreja romana e do ministério divino”. Leão, nessa época, já lutava contra a heresia pelagiana, segundo a qual o homem poderia obter a salvação por seus próprios esforços.

Durante uma de suas viagens diplomáticas e religiosas, no ano de 440, o Papa Sisto III faleceu e, apesar de não estar em Roma, Leão foi aclamado papa pelo povo romano. Foi sagrado em 29 de setembro de 440, com 45 anos.

A figura do Papado

O primado da Sé romana é uma verdade de fé que sempre foi reconhecida desde os tempos de São Pedro. Santo Inácio de Antioquia, em 106, já atestava a primazia do Papa em relação a toda a Igreja. Entretanto, os papas foram, ao longo da História, tomando cada vez mais consciência de seu papel de confirmar os irmãos na fé e de ser sinal de unidade na Igreja.

Os papas imediatamente anteriores a São Leão Magno haviam dado passos importantes para frisar o primado da Sé romana sobre as outras dioceses e sobre o poder temporal do Império. Por exemplo, Santo Inocêncio I (401-417) defendera São João Crisóstomo contra os imperadores do Império Romano do Oriente, e São Celestino (422-432) havia confirmado o direito de qualquer fiel de recorrer a Roma contra as decisões de tribunais diocesanos.

São Leão Magno levou a cabo muitas iniciativas para ressaltar a centralidade da Sé de Pedro. Lutou contra o Império que tentava usar a Igreja para seus próprios interesses, entretanto, sem deixar de influenciar positivamente os líderes políticos da época, consciente de que o papel da Igreja não é se afastar completamente da política, mas iluminá-la com a luz de Cristo.

Dentro da Igreja, São Leão Magno deixou uma marca indelével. Saía sempre de seu palácio em Latrão para praticar pessoalmente a caridade aos mais pobres. Em relação ao governo da Igreja, estabeleceu regras para os candidatos ao episcopado, além de regras sobre a administração dos bens eclesiásticos.

Examinava com esmero qualquer questão relacionada à Igreja e, por isso, o historiador Batiffol o chamou de o “organizador do Papado histórico”, pois Roma, nesse período, não apenas apresentava sentenças para diversos casos, mas passou a decretar sanções àqueles que as desobedeciam.

Foi o primeiro Papa a redigir um missal, que, no século seguinte, passou a ser chamado de sacramentário leonino. Seu papel também foi fundamental na confirmação de verdades de fé, principalmente por meio de obras e cartas escritas por ele. No “Tomo de Leão”, tratou da natureza de Cristo, texto fundamental para o Concílio de Calcedônia, de 451. Por esse motivo, São Leão Magno é considerado Doutor da Igreja.

São Leão era tido pelos seus contemporâneos como um verdadeiro líder, pois sabia, com doçura e inteligência, solucionar problemas complexos e incentivar os homens, mesmo os piores, a mudarem de vida. Passou por períodos turbulentos e, com grande confiança em Deus, não esmoreceu e permaneceu firme. Um desses momentos, certamente o mais famoso de sua vida, foi o encontro com Átila, o Huno, um conquistador que havia saído da Ásia com seu exército e dominado grande parte da Europa e, que, às portas da Cidade Eterna, ameaçava tomá-la também.

O encontro com Átila

No século V, a Europa ocidental sofria com as invasões bárbaras. Entretanto, uma nova ameaça, vinda da região da Mongólia, fez com que romanos e bárbaros se unissem para lutar contra o inimigo em comum. Os hunos, povo seminômade, advindos da Ásia Central, não se sabe ao certo por qual motivo, passaram a deslocar suas forças em direção à Europa.

Eram liderados por Átila, que recebeu a alcunha de “flagelo de Deus”, pois era conhecido pela brutalidade com que empreendia as suas conquistas. Suas maiores vitórias ocorreram nas cidades da Gália, atual França, que foram destruídas e saqueadas pelas forças hunas. Paris foi poupada, segundo a tradição, devido ao trabalho de Santa Genoveva, que conclamou o povo à oração e à penitência. Por esse motivo, Genoveva é a santa padroeira da capital francesa.

Em 451, o exército de Átila foi derrotado na Batalha dos Campos Cataláunicos pelas tropas lideradas por Flávio Aécio, considerado “o último dos Romanos”. Em 452, Átila chegou às portas de Roma. Dessa vez, o exército romano era insuficiente para enfrentar o invasor huno. Sem esperanças de vitória militar, o Papa São Leão Magno decide organizar uma comitiva eclesiástica, em forma de procissão, para conversar com Átila e evitar que ele atacasse a Cidade Eterna.

A procissão se dirigiu ao inimigo cantando salmos e hinos. Quando o exército huno tomou conhecimento da estranha comitiva, Átila se dirige a ela e pergunta a São Leão: “Como te chamas?”; e o Papa responde: “Leão, papa”.  Os dois se encontram e conversam reservadamente. Até hoje, não se sabe ao certo o que ambos falaram um ao outro. Entretanto, depois da conversa, Átila decidiu retirar suas tropas e não invadir Roma, diante da promessa de que um tributo seria pago pela cidade. Alguns relatos de séculos depois afirmam que houve uma intervenção sobrenatural durante a conversa.

São Leão Magno faleceu em 461 e foi sepultado na Basílica de São Pedro. Em 688, o Papa Sérgio I mandou esculpir o seguinte epitáfio em sua tumba, que diz que São Leão continua “a velar para que o lobo, sempre à espreita, não dizime o rebanho”.

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