O silêncio: calar para ouvir, ouvir para falar

“O silêncio é parte integrante da comunicação e, sem ele, não há palavras densas de conteúdo”

Por Juliana Fontanari e Benigno Naveira

Luciney Martins/O SÃO PAULO

Esta linda catequese do Papa Bento XVI na mensagem para o 46º Dia Mundial das Comunicações Sociais, em 2012, nos orienta que a comunicação verdadeira só existe se nascer do silêncio. Quando não há silêncio, as palavras ficam pobres em conteúdo. O silêncio nos permite reconhecer a verdade presente em nosso interior, nos arrancando do perigo da alienação.

Mas nós temos a boca para falar, e como é bom falar! A sabedoria popular nos diz, porém, que “o falar é de prata e o ouvir é de ouro”; e outro dito nos lembra que “temos dois ouvidos e uma boca. Isso significa que devemos ouvir muito mais do que falamos”. E como é preciso saber controlar o poder da língua, ou seja, saber falar e saber o momento certo de calar. O exercício do silêncio e a prática da palavra são aspectos inseparáveis na vida do ser humano.

A Sagrada Escritura relata a passagem da torre de Babel (cf. Gn 11), uma confusão das línguas que, na verdade, é uma ilustração do que há de mais pernicioso nas relações humanas: a autossuficiência que deturpa os valores das relações do bom convívio.

O TEMPO CERTO PARA CADA ATITITUDE

Dom Edilson de Souza Silva, Bispo Auxiliar da Arquidiocese na Região Episcopal Lapa, recorda que a Sagrada Escritura nos diz que há um tempo para tudo debaixo do sol, há um tempo para falar, há um tempo para calar (cf. Ecl 3,1.7).

Como saber, porém, qual o momento certo para falar e a hora ideal para simplesmente calar? Dom Edilson lembra que o essencial não reside no calar ou falar, mas em saber ouvir: “Na medida em que sou capaz de colocar minha atenção no outro, reconhecendo-o como alguém que tem dignidade e que merece ser ouvido e compreendido, começam a se estabelecer as bases de uma comunicação sincera e verdadeira. Isso não significa, porém, que eu tenha que concordar com tudo o que o outro diz, mas devo colocar-me no lugar dessa pessoa para entender as suas razões a partir do seu ponto de vista e só depois disso serei capaz de confrontar o que ouvi para, assim, compartilhar o meu ponto de vista”.

O Bispo Auxiliar da Arquidiocese também destaca ser fundamental calar para poder ouvir bem o outro, sem interrompê-lo, “uma atitude educada e de respeito para com o que o outro tem a dizer, como diz a Palavra de Deus: ‘Quem despreza seu próximo demonstra falta de senso, o homem sábio guarda silêncio’ (cf. Pv 11,12)”.

Dom Edilson afirma, porém, que há momentos em que nos calamos por não haver meios de se estabelecer o diálogo com quem só deseja o monólogo, “ou seja, quer se impor não pelo bom senso e a razão, mas pela violência verbal e a agressividade. Além disso, há situações em que o outro pode ter razão, mas a ira, a raiva ou a dor faz com que ele se torne agressivo e violento, e nesses casos, a Escritura tem uma recomendação valiosa: ‘Uma resposta branda aplaca a ira, uma palavra ferina atiça a cólera’ (cf. Pv 15,1)”.

AS PESSOAS SABEM, DE FATO, SILENCIAR?

Autor de obras como “Pedagogia do Silêncio: um caminho para a interioridade”, publicado pela Paulinas Editora, o Irmão Eder Vasconcelos, franciscano, recorda que muitas pessoas têm buscado o caminho do silêncio, do repouso e da serenidade, mas outras fogem do silêncio, temem silenciar, pois “o silêncio leva ao confronto consigo mesmo, e no silêncio descobrimos quem somos de verdade, ou seja, caem todas as máscaras e fantasias que criamos sobre nós mesmos e sobre os outros. Por isso, muitas pessoas preferem permanecer na distração e na superficialidade, fugindo delas mesmas”.

RECUPERANDO A MÍSTICA DO SILÊNCIO

Dom Edilson comenta que o silêncio “pode ser uma atitude de escuta, e, também, expressão de espanto e admiração”. O Bispo menciona passagens bíblicas sobre o silêncio, como no livro de Habacuc – “Mas o Senhor reside em sua santa morada, silêncio diante dele, ó terra inteira!” (Hab 2,20) – ou no de Zacarias – “Toda criatura esteja em silêncio diante do Senhor: ei-Lo que surge de sua santa morada” (Zc 2,17).

Irmão Eder destaca que os cristãos podem oferecer ao mundo a mística do silêncio, de maneira a “recuperar o valor do silêncio, pois o barulho adoece, o silêncio cura. Com o meu silêncio, eu toco o outro; com o meu silêncio, eu crio uma atmosfera de paz e quietude”.

“Saber escutar é um exercício de empatia e acolhimento compassivo. Silenciar é uma arte, e toda arte leva tempo e dedicação para ficar bela. Portanto, uma escuta ativa, uma escuta do coração só é possível se passar pelas margens do silêncio. Uma pessoa que sabe escutar e silenciar é serena, tranquila, humilde e está sempre em paz consigo mesma. É uma pessoa cheia de leveza”, conclui Irmão Eder. 

É chegado o tempo de resgatar a relação entre o silêncio e a palavra, que são dois momentos de comunicação que devem se equilibrar e se integrar para levar a um diálogo autêntico e uma união profunda entre as pessoas.

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