Projeção está no atlas mundial da obesidade 2024. Entenda os principais fatores que levam à obesidade infantil e como os pais, a comunidade escolar e toda a sociedade podem agir diante deste problema

Sophia tinha apenas 7 anos quando apresentou um aumento rápido e significativo de peso. Preocupada com a saúde da filha, a empresária Wilcar Rodrigues, 33, levou a menina a uma consulta de rotina. Após uma série de exames, veio o diagnóstico: colesterol e triglicérides elevados, tipos de gordura presentes no sangue.
“A pediatra que acompanha a Sophia desde pequena foi muito sincera: explicou que tudo aquilo era consequência de uma alimentação inadequada e da falta de atividade física. Saí do consultório arrasada, me sentindo a pior mãe do mundo. Percebi que havia colocado minha filha em uma situação delicada e que era minha responsabilidade agir para garantir o bem-estar dela”, relembra Wilcar ao O SÃO PAULO.
MUDANÇA DE HÁBITOS
O diagnóstico provocou uma reviravolta na rotina da família, que decidiu implementar mudanças graduais no estilo de vida. Atualmente, todos seguem orientação nutricional profissional.
“Comecei testando receitas. Chamava a Sophia para ajudar, pedia que experimentasse os pratos – o paladar dela era essencial nesse processo. Levava-a ao mercado, criava nomes criativos para pratos com legumes e frutas de que ela não gostava. Sem dúvida, o maior desafio foi reduzir o consumo de alimentos industrializados e incluir vegetais nas refeições de forma que ela aceitasse”, contou.
Atualmente com 9 anos, Sophia atingiu o peso ideal para sua idade. Ela segue uma alimentação equilibrada, assim como toda a família. “Fizemos questão de que a mudança fosse coletiva, para que ela não se sentisse culpada ou punida por precisar substituir determinados alimentos”, ponderou Wilcar.
“Hoje, colhemos os frutos do que plantamos há mais de um ano, quando decidimos trilhar esse caminho. Ela ganhou autoestima, confiança e melhorou muito sua coordenação motora”, comemora a empresária, orgulhosa dos avanços da filha.
DESTAQUE EM PESQUISAS MUNDIAIS
Divulgado em março de 2024, o Atlas Mundial da Obesidade revelou que, com base nas tendências atuais, até 2035 mais de 750 milhões de crianças e adolescentes entre 5 e 19 anos devem apresentar sobrepeso ou obesidade. Isso equivale a dois em cada cinco no mundo. No Brasil, atualmente, um em cada três já apresenta sobrepeso.
A pesquisa estima que, até 2035, metade das crianças brasileiras estarão acima do peso. O País foi citado na edição mais recente do estudo por apresentar um crescimento expressivo no Índice de Massa Corporal (IMC) da população infantil.
Entre 2020 e 2035, a projeção de aumento anual de crianças com IMC elevado é de 1,8%. Entre os principais problemas de saúde associados a isso estão pressão alta, hiperglicemia e baixos níveis de colesterol HDL (o chamado colesterol bom).
QUANDO UMA CRIANÇA É CONSIDERADA OBESA?
A obesidade infantil é caracterizada pelo acúmulo excessivo de gordura corporal, avaliado por meio do IMC ajustado para idade e sexo. No Brasil, utilizam-se como referência as curvas de crescimento da Organização Mundial da Saúde (OMS). Crianças com IMC acima do percentil 97 são consideradas obesas.
A avaliação deve ser feita por profissionais de saúde, que também consideram fatores clínicos, comportamentais e individuais.
“A obesidade infantil é um problema multifatorial, e enfrentá-la exige o envolvimento de todos: famílias, escolas, profissionais de saúde, governos, empresas e a sociedade. Criar um ambiente que incentive escolhas saudáveis desde cedo é o caminho mais eficaz e duradouro”, afirmou Wilma Accioly Paiva, nutricionista infantil.
FATORES PARA A OBESIDADE

Entre os fatores que contribuem para o sobrepeso e a obesidade infantil, Wilma destaca três:
Alimentação inadequada, com consumo frequente de alimentos ultraprocessados, ricos em açúcar, gordura e sódio (refrigerantes, salgadinhos, biscoitos recheados etc.);
Sedentarismo, devido à diminuição das atividades físicas e ao tempo excessivo diante de telas;
Fatores genéticos e hormonais, pois filhos de pais obesos têm maior predisposição ao ganho de peso.
Wilma também aponta que desequilíbrios hormonais, uso de certos medicamentos e questões emocionais — como ansiedade, depressão e estresse — podem contribuir para o problema; assim como aspectos socioeconômicos, culturais e os hábitos familiares.
A nutricionista reforça que as crianças tendem a imitar o comportamento dos adultos. Por isso, é fundamental que os pais adotem um estilo de vida saudável e mantenham um ambiente emocional sem utilizar a comida como forma de recompensa ou punição, prestem atenção às emoções dos filhos.
“É importante lembrar que a obesidade infantil é uma condição tanto prevenível quanto tratável. A intervenção precoce é essencial para evitar complicações futuras. Também é crucial combater o estigma associado ao peso, a partir de uma abordagem empática, respeitosa e focada na saúde e no bem-estar da criança e da família como um todo”, conclui a nutricionista.
4 ESTRATÉGIAS DE PREVENÇÃO
- Educação alimentar nas escolas, com oferta de refeições equilibradas e restrição de alimentos ultraprocessados;
- Apoio às famílias, com ações de conscientização sobre hábitos saudáveis, organização de rotinas, incentivo à introdução alimentar adequada e valorização do aleitamento materno;
- Reformulação de produtos infantis, com redução de açúcar, sal e gordura, além de rótulos mais claros e acessíveis;
- Disponibilização de espaços públicos seguros para atividades físicas, como parques, praças e ciclovias
(Por Wilma Accioly Paiva, nutricionista infantil)
Pastoral da Criança atua no combate à obesidade infantil

Em seus mais de 40 anos de história, a Pastoral da Criança tem feito acompanhamento nutricional em todo o território nacional. Somente em 2024, cerca de 4,4% das crianças atendidas apresentavam obesidade, e 8%, sobrepeso.
Nesse contexto, os voluntários da Pastoral realizam, trimestralmente, medições de peso e altura das crianças, o que permite identificar precocemente casos de excesso de peso. Com os dados do IMC em mãos, os agentes conversam com as famílias e oferecem orientações sobre uma alimentação adequada, com base em um material elaborado pela equipe técnica da Pastoral, em parceria com a Universidade de São Paulo e com respaldo do Ministério da Saúde.
Segundo Juliana Cantanhede, nutricionista da Pastoral, os voluntários incentivam hábitos alimentares mais conscientes, priorizando alimentos in natura e minimamente processados – como frutas, legumes e preparações caseiras. O objetivo é promover saúde e bem-estar nutricional às crianças acompanhadas.
Para saber mais sobre esta ação, acesse https://pastoraldacrianca.org.br.