Dom Cláudio Hummes, OFM, tornou-se presidente da Comissão Episcopal Especial para a Amazônia em 2011, com mandato até 2019.
Em 2014, assumiu também a presidência da Rede Eclesial Pan-Amazônica (Repam), função que desempenhou até 2020, tendo visitado as Comissões Episcopais da Venezuela, Guiana Francesa, Guiana e Equador para articulação de um trabalho integrado em favor dos povos e da Pan-Amazônia.
A Rede tem uma incidência internacional. Em março de 2017, por exemplo, Dom Cláudio Hummes compôs a Delegação da Rede Eclesial Pan-Amazônica que leva as denúncias de violação de direitos humanos da Pan-Amazônia à Comissão Interamericana de Direitos Humanos em Washington. Na ocasião, encontrou-se com a Comissão Episcopal dos Estados Unidos da América, para falar e pedir apoio em favor da Amazônia.
Em abril de 2017, por sua vez, com a delegação da Repam, Dom Cláudio acompanhou representantes dos povos Munduruku e Yanomami no Fórum Permanente de Assuntos Indígenas da Organização das Nações Unidas (ONU), para levar denúncia de violação dos direitos dos povos indígenas, em abril de 2017.
DEFESA DA RENCA
Em nota escrita em Brasília (DF), em 28 de agosto de 2017, Dom Cláudio escreveu uma nota na qual demonstrou seu repúdio ao decreto presidencial que extinguiria a Reserva Nacional de Cobre e seus Associados (Renca), publicado no dia 23 de agosto do mesmo ano.
A Renca é uma área de reserva, na Amazônia, com 46.450 km2 – tamanho do território da Dinamarca. A região engloba nove áreas protegidas, sendo três delas de proteção integral: o Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque, as Florestas Estaduais do Paru e do Amapá; a Reserva Biológica de Maicuru, a Estação Ecológica do Jari, a Reserva Extrativista Rio Cajari, a Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Rio Iratapuru e as Terras Indígenas Waiãpi e Rio Paru d`Este.
No texto, o Cardeal afirmou que “a abertura da área para a exploração mineral de cobre, ouro, diamante, ferro, nióbio, entre outros, aumentará o desmatamento, a perda irreparável da biodiversidade e os impactos negativos contra os povos de toda a região”.
Além disso, o Presidente da Repam denunciou que o Decreto “vilipendia a democracia brasileira, pois com o objetivo de atrair novos investimentos ao país o Governo brasileiro consultou apenas empresas interessadas em explorar a região. Nenhuma consulta aos povos indígenas e comunidades tradicionais foi realizada”.
LAUDATO SI’
Nos anos de 2016 e 2017 foram realizados 16 seminários para discutir a encíclica Laudato Si’ em diferentes regiões do Brasil, por meio da Repam. O documento foi publicado no ano anterior pelo Papa Francisco.
“A crise climática vem do aquecimento global, chamado também efeito estufa. A crise ecológica, por sua vez, é o processo de devastação e degradação da terra, a contaminação das águas, do solo, do ar, do meio ambiente. Essas duas crises, a climática e a ecológica, influem uma na outra. Elas se alimentam reciprocamente”.
Dom Cláudio recordou que o Papa Francisco, na Encíclica Laudato Si’, trata justamente desta crise global, que afeta todo o planeta e não apenas algumas regiões. “Ele convoca a sociedade humana a somar forças para superar a crise e envolve também a Igreja neste esforço. Ele diz que a terra é nossa casa comum, que está correndo risco iminente de não poder mais oferecer condições de vida aos seres deste Planeta. O risco é iminente e fatal.”
CRISE CLIMÁTICA
Em Paris, em dezembro de 2015, reuniu-se a COP21, que foi uma conferência de cúpula de todos os países para tratar da crise climática. “Nós, da Repam, também estivemos lá. No final, chegou-se a um acordo histórico, assinado por 195 países (quase a totalidade dos países do mundo)”.
“Requerem-se grandes reformas no modo como evitar o desmatamento e como fazer agricultura sustentável e aí será o agronegócio que não vai gostar e vai resistir. Muitas outras reformas serão também necessárias, como: a necessidade de um outro estilo de vida menos consumista, de maior cuidado com o solo, a água, o ar, e menor desperdício de energia, de água e de comida; um sistema econômico que tenha como meta o bem comum dos seres humanos e o bem do planeta e não a acumulação de lucros cada vez maiores, às custas da pobreza de centenas de milhões de seres humanos e às custas do planeta”, disse Dom Cláudio sobre como evitar uma crise climática mundial.
Sobre essa discussão, ele retomou a Laudato Si’ no trecho em que se afirma que “a Amazônia é um dos pulmões do planeta e, portanto, exigirá cuidados especiais para não ser destruída e devastada. Mas, para o Papa e para nós, não se trata só da Amazônia. A crise afeta todo o planeta e, portanto, também, todo o território brasileiro: basta pensar no agronegócio, na mineração, na situação dos nossos rios e nascentes fora da Amazônia, cujas matas protetoras, as matas ciliares – que são essenciais – foram praticamente todas dizimadas. Pensemos também na poluição do ar, do solo, da água, na falta de adequado tratamento do lixo, principalmente nas cidades pelo Brasil afora”.
Já em relação aos povos indígenas, o Cardeal Hummes afirmou veemente que “é preciso defendê-los, defender seus direitos, dar-lhes de novo a possibilidade de serem os protagonistas de sua história, os sujeitos de sua história. Deles foi tirado tudo: a identidade, a terra, as línguas, sua cultura, sua história, tudo”. E pede que a Igreja e a sociedade brasileira não fiquem indiferentes a esta situação.
“Por todos estes motivos, sobretudo porque a crise é grave e urgente, os nossos seminários sobre a Laudato Si’ são importantes e querem dar uma contribuição concreta e decidida para a superação da crise”, conclui Dom Cláudio ao falar sobre os seminários.
SÍNODO DA PAN-AMAZÔNIA
“O Sínodo vai nos dar um novo impulso, maior valentia, novas linhas, caminhos, métodos para trabalhar dentro daquela área”, disse Dom Cláudio em uma entrevista concedida à Repam sobre o Sínodo da Pan-Amazônia, que aconteceria em outubro de 2019, em Roma.
“A Amazônia está passando por um momento em que está se definindo seu futuro. O Papa Francisco veio com a Laudato Si’, que ajudou ao mundo, mas sobretudo a nós cristãos a pensar mais concretamente sobre o sentido da Amazônia, sua missão, sua vocação, nem só como Igreja, senão também como região, como área socioambiental”, continuou Dom Cláudio ao falar sobre a convocação do Sínodo.
Sobre o papel dos povos indígenas no Sínodo, Dom Cláudio diz que eles devem participar da melhor forma possível. “Está claro que é um Sínodo de bispos e serão eles quem vai ter voto, mas é um trabalho que vai ser realizado com outros que não sejam bispos, seja padres, leigos, especialistas”, observou.
Sobre as perspectivas para o futuro, na mesma entrevista, o Cardeal Hummes admitiu que, no Brasil, durante muito tempo, ignorou-se a Amazônia. “Mas aos poucos, faz 42 anos que sou bispo, e conheço um pouco sobre a relação da Conferência com a Amazônia nesse tempo, foi se despertando a consciência o episcopado brasileiro em relação a nossa Amazônia. Depois da Campanha da Fraternidade de 2002 foi criada uma comissão de bispos para a Amazônia para fazer estabelecer um contato e manter viva a preocupação e solidariedade da Igreja do Brasil em relação à Amazônia”, recordou Dom Cláudio.
A partir das reflexões do Sínodo dos Bispos sobre a Amazônia, o Papa Francisco publicou em 2020 a exortação apostólica Querida Amazonia.
CEAMA
Ao deixar a presidência da Repam em 2020, Dom Cláudio assumiu a presidência da Conferência Eclesial da Amazônia (Ceama, criada em junho do mesmo ano com a missão de promover a ação pastoral e evangelizadora da Igreja na região amazônica, sendo um dos frutos concretos da Assembleia Especial do Sínodo dos Bispos para a Amazônia, realizada em 2019, no Vaticano.
“É difícil expressar em palavras os sentimentos pela Amazônia. Agradeço muito todo o carinho e creio que podemos continuar a nos dedicar totalmente a essa vocação que o Papa nos confirmou: trabalhar para a evangelização na Amazônia. Sou muito feliz com a Ceama. É um dom de Deus para a Igreja e para o povo”, manifestou Dom Cláudio na primeira assembleia da Ceama em 2021.
Dom Cláudio renunciou ao cargo em março de 2022, diante do agravamento de suas condições de saúde em decorrência do câncer.
Na carta de renúncia, ele ponderou que “os gritos da realidade atual, os da sociedade e da Igreja, e tudo o que vos apresento como presidente do nosso Ceama, convidam-nos a tecer uma estratégia de maior encarnação territorial que reforce os caminhos do Ceama. Isto implica um tempo e um esforço que, dadas as minhas atuais condições de saúde, não estou em condições de enfrentar, de modo a assegurar que o que vemos claramente no horizonte possa ser realizado com toda a força necessária […] Rezei e discerni, e falei com muitos colegas sobre este assunto, e também escrevi ao Santo Padre para comunicar a minha decisão, pois creio que é isto que o Senhor está a pedir para o bem do processo Ceama. Estou profundamente grato pela compreensão do nosso amado Francisco, bem como de todos vós, e deveis saber que continuarei inteiramente disponível, como a minha força permite, para servir e acompanhar no que for necessário neste projeto que nos dá tanta esperança”.
GRATIDÃO
Em junho de 2021, após Dom Cláudio Hummes ter recebido o título de Doutor Honoris Causa recebido da Universidade Nacional de Rosário (UNR), da Argentina, o Papa Francisco escreveu-lhe, agradecendo ao Cardeal brasileiro, a quem diz dever tanto, pelo “exemplo que me deu durante a sua vida”, recordando duas frases que ficaram na história, pronunciadas pouco depois de ter sido eleito Papa, quando lhe disse, “é assim que o Espírito Santo age”, e juntamente com isso “não se esqueça dos pobres”.
Na carta, o Santo Padre diz estar feliz com o reconhecimento que a universidade concedeu a Dom Cláudio, a quem disse estar entre aqueles “líderes que têm a coragem de abrir trilhas, caminhos e de provocar sonhos; a coragem de continuar sempre olhando o horizonte sobre os problemas e dificuldades do caminho”.
(Com informações cedidas pela Repam., Ceama e Vatican News)