Por meio de recursos de inteligência artificial e tecnologia de reconhecimento facial, o aplicativo potencializa o encontro de desaparecidos, mesmo que passados alguns anos
Para milhares de famílias em todo o Brasil, a angústia por não encontrar um parente desaparecido pode durar semanas, meses ou até mesmo anos, como é o caso de Ivanise Esperidião da Silva Santos: em 23 de dezembro de 1995, Fabiana, sua filha, então com 13 anos de idade, desapareceu, e o paradeiro é até hoje desconhecido.
“Eu não vou me acostumar nunca em não ter a minha filha, mas só me restavam duas opções: aprender a viver com essa dor ou morrer. Eu transformei a minha dor em uma luta não só por ela, mas também pelas quase 11 mil mulheres que já passaram pela minha vida nesses quase 25 anos”, enfatizou Ivanise, que em 31 de março de 1996 criou o movimento Mães da Sé.
Desde então, a cada 15 dias, aos domingos pela manhã, ela e outras mães levam às escadarias da Catedral da Sé cartazes com as imagens dos filhos desaparecidos para chamar a atenção das autoridades e da sociedade para essa realidade. Apenas em 2019, por exemplo, quase 80 mil pessoas desapareceram no Brasil, conforme dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. No caso do estado de São Paulo, de acordo com Ivanise, de 40% a 43% dos desaparecidos são crianças e adolescentes.
Além dessa iniciativa, por ora suspensa em razão da pandemia de COVID-19, as Mães da Sé, ao longo desses anos, buscaram parcerias para estampar o rosto dos desaparecidos em sacolas plásticas, tíquetes de pedágio, caixinhas de palitos de dentes e onde mais fosse possível. Esse empenho resultou em mais de 10 mil pessoas cadastradas e 5.016 encontradas.
Com a ajuda da tecnologia
A empresa Mult-Connect, que atua no ramo de tecnologia, auxilia as Mães da Sé desde 1996, quando desenvolveu o site do grupo. Nos últimos meses, uma nova perspectiva se abriu para o encontro das pessoas desaparecidas, com o desenvolvimento, em parceria com a Microsoft, do Family Faces, um aplicativo (app) que já está disponível para download gratuito nas principais lojas virtuais para smartphones.
Por meio de recursos de inteligência artificial e tecnologia de reconhecimento facial, o aplicativo auxilia no reconhecimento e busca de pessoas.
Em entrevista ao O SÃO PAULO, Luiz Vianna, diretor-executivo da Mult- -Connect, explicou que, ao acessar o aplicativo, o usuário tem duas opções de busca: uma é apresentando as características da pessoa desaparecida – como a cor dos olhos, idade aproximada e tipo de cabelo – e outra é por identificação fotográfica. “O usuário tira uma foto da pessoa que acredita que seja alguém desaparecido ou seleciona alguma de sua galeria. Depois, essa imagem será enviada para o nosso sistema, que fará o reconhecimento facial, consultando toda a nossa base de dados, para saber se é alguém que estamos procurando. Na sequência, o sistema mostra para o usuário o rosto de pessoas que são as mais parecidas com a foto que foi enviada, a fim de que se faça uma checagem final. Por fim, é enviada a foto com o nome cadastrado. Se o usuário tiver razoável certeza de que é mesmo a pessoa, aciona um botão de alerta e nós recebemos essa informação, junto com o posicionamento do GPS do celular e, assim, conseguimos ver no mapa onde isso ocorreu”.
O passo seguinte é o repasse dessa informação à associação Mães da Sé, que fará o contato com a família do desaparecido ou reportará o caso à Polícia Civil ou ao Conselho Tutelar, quando se tratar de criança ou adolescente.
Mesmo para desaparecimentos ocorridos há muito tempo, como o da filha de Ivanise, o sistema consegue gerar respostas por meio da tecnologia de reconhecimento facial. “Essa tecnologia artificial é criada com milhões de imagens de rostos humanos. Há 27 pontos do rosto, como os olhos, o canto da boca e o nariz, que com o passar do tempo não mudam muito. Assim, a pessoa já pode ter rugas, um mendigo pode estar maltratado, mas como essas métricas não mudam após a criança atingir uma certa idade, é possível identificar essas pessoas desaparecidas”, detalhou Vianna.
Em favor do próximo
Ivanise está esperançosa com o novo app: “Alguém pode olhar a foto da minha filha e, pela progressão de imagem, encontrar alguém na rua que ache ser semelhante a ela, com o rosto que tem hoje. Isso ajudará muito para a identificação”.
Para o diretor-executivo da empresa Mult-Connect, o aplicativo potencializa as chances de algo que antes dependia de uma série de coincidências, como a de que alguém passasse em lugar onde estivesse a foto do desaparecido, guardasse este rosto na memória e, por acaso, um dia, visse uma pessoa parecida: “Agora, a busca se dá em uma única base de dados. Usamos o reconhecimento facial para procurar todo mundo, as chances de encontrar alguém aumentam demais”.
Vianna, que é catequista, comentou, ainda, a respeito das motivações de fé que o levaram a desenvolver o sistema. “Como católicos batizados, não fazemos isso porque somos especiais. Somos, sim, mandados por Cristo. No meu caso, eu tenho o acesso à tecnologia, conto com uma equipe de desenvolvimento e já ajudava a associação das Mães da Sé. Ao juntar todas essas coisas, não havia outra opção a não ser fazer este aplicativo”, concluiu.
(Colaborou: Jenniffer Silva)
Faça o download gratuito do Family Faces para smartphones
– Google Play Store (sistema Android)
– App Store (sistema iOS)
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