Que nenhum doente esteja ou se sinta só

O cuidado integral e a proximidade com todos os que enfrentam enfermidades, conforme pede o Papa Francisco no 32º Dia Mundial do Enfermo, ajuda na recuperação do paciente e fortalece os vínculos familiares de quem se abre a este gesto de amor

Comunicacao Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares/Arquivo

“A vós que vos encontrais na doença, passageira ou crônica, quero dizer-vos: Não tenhais vergonha do vosso desejo de proximidade e ternura. Não o escondais e nunca penseis que sois um peso para os outros”. Este é um dos trechos da mensagem do Papa Francisco para o 32º Dia Mundial do Enfermo, um chamado a acolher todas as pessoas que enfrentam complicações na saúde.

Celebrado em 11 de fevereiro, dia de Nossa Senhora de Lourdes, padroeira dos doentes, o Dia Mundial do Enfermo foi instituído por São João Paulo II em 1992 e, desde 1993, quando figurou no calendário religioso pela primeira vez, visa a chamar a atenção da Igreja e da sociedade para as condições de tratamento das pessoas enfermas.

SOLIDÃO QUE ATERRORIZA

Com o tema “Não é conveniente que o homem esteja só” (Gn 2,18), na mensagem deste ano o Papa Francisco busca levar os fiéis ao entendimento de cuidado aos doentes, uma vez que a frase revela, segundo o Santo Padre, o significado do projeto de Deus para a humanidade.

“Irmãos e irmãs, o primeiro cuidado de que necessitamos na doença é uma proximidade cheia de compaixão e ternura (…) Desde o início, Deus, que é amor, criou o ser humano para a comunhão, inscrevendo no seu íntimo a dimensão das relações. Assim, a nossa vida, plasmada à imagem da Trindade, é chamada a realizar-se plenamente no dinamismo das relações, da amizade e do amor mútuo. Fomos criados para estar juntos, não sozinhos”, escreve o Papa.

Na mensagem, o Pontífice alerta para os cenários sociais que agravam as situações de abandono dos enfermos, como contextos de guerras ou em que a velhice é vista como sinônimo de solidão. Além disso, Francisco cita as questões políticas que não colocam, no centro de suas estratégias, os recursos necessários para que todo o ser humano tenha acesso aos cuidados médicos adequados, lamentando que “esta triste realidade é consequência, sobretudo, da cultura do individualismo”.

NO CORAÇÃO DA IGREJA

As mudanças sociais são, para o Santo Padre, um canal para que os cristãos tenham o olhar compassivo de Jesus para com os que sofrem. Alimentados pela Eucaristia, Francisco exorta que “tratemos das feridas da solidão e do isolamento”, fazendo crescer a cultura da ternura e da compaixão.

Por fim, a mensagem lembra que os doentes, os frágeis e os pobres devem estar no coração da Igreja, das solicitações humanas e dos cuidados pastorais. “Não o esqueçamos! E confiemo-nos a Maria Santíssima, saúde dos enfermos, pedindo-lhe que interceda por nós e nos ajude a ser artífices de proximidade e de relações fraternas”, conclui o Papa Francisco.

DOAÇÃO DE AMOR

O cuidado com os doentes é uma realidade em inúmeras famílias. Na casa da comerciante Adriana Dal Rovere, a enfermidade atingiu seus pais, Elpidio Dal Rovere, diagnosticado com a doença de Parkinson, e Iride Costa Dal Rovere, com o mal de Alzheimer.

Em 2018, seu pai faleceu. Nessa mesma época, sua mãe apresentou os primeiros sinais do transtorno neurodegenerativo. Adriana, que conta com o apoio financeiro de quatro irmãs, é quem acompanha integralmente a paciente com a ajuda de uma cuidadora profissional.

“Pela fé, tenho a força e a paz de que preciso. Cuidar da minha mãe, como cuidei do meu pai, é pura doação de amor, porque sem amor essa tarefa seria quase impossível”, continuou.

Atualmente com 89 anos, a mãe de Adriana necessita integralmente de cuidados. A filha conta que acompanhar o quadro clínico da mãe se agravar gradativamente lhe causa, por vezes, o sentimento de pequenez, mas ela tem certeza de que a experiência a faz uma pessoa melhor: “Em cada fase do Alzheimer, que são muitas, você vai se adaptando, tentando entender e dar maior conforto [ao paciente]. A enfermidade foi no corpo deles, mas a evolução como pessoa foi minha, aprendendo sobre resiliência, paciência e amor”, completou.

UMA FORMA DE RETRIBUIR

A dinâmica de cuidados paliativos para o Alzheimer é também uma missão para a pedagoga e confeiteira Maria Cecília Mello Fernandes, filha de Maria Luiza Mello Fernandes, 83, e Nelson dos Santos Fernandes, 88.

Atualmente, a doença se manifesta de diferentes maneiras entre os dois: a mãe sofre a forma mais avançada e caminha para o estágio acamado do diagnóstico. O pai, por outro lado, tem o quadro clínico moderado e apresenta dificuldades na coordenação motora.

Cecília avalia que a sociedade, e até mesmo familiares, não sabem lidar com tais condições de saúde e, por vezes, se afastam. Ela tem buscado aprender todos os dias e enxergar na assistência uma forma de retribuir o amor que sempre recebeu dos pais: “Eu estou aqui por eles, eu existo por eles”.

“Ser responsável por cuidar é um aprendizado diário, muitas vezes é amargo, mas tem sua beleza. Hoje estou melhor, pois chorava, me desequilibrava, eu tinha medo, muito medo. São muitos desafios, mas o maior deles é aceitar a doença e entendê-la como oportunidade de aprender que essa afetividade e esse amor (oferecidos) permanecem latentes também em você mesmo”, completou a pedagoga.

PARA TODOS OS PACIENTES

A assistência integral ao enfermo contribui para sua melhor recuperação. Quem assegura é o médico psiquiatra Ivan Piazarolo Ho, da Rede de Hospitais São Camilo de São Paulo, uma vez que, além de auxiliar as questões emocionais, tal assistência garante a infraestrutura clínica mais eficaz para os casos.

O sentimento de solidão é desfavorável aos pacientes, segundo o médico, pois em situações de estafa emocional, as pessoas tendem a não realizar os cuidados de saúde adequadamente, aumentando o risco de complicações.

“Um acompanhamento benéfico requer que o familiar ou pessoa amiga compreenda o que está acometendo o enfermo e o que esse tratamento requer. Também permite que o enfermo partilhe as angústias e preocupações, seja no entendimento de termos técnicos do tratamento, sobre as opções de tratamento e possibilidades, e que esse momento de adoecimento não se torne o início de uma perda de funcionalidade e independência”, explicou o psiquiatra.

Ainda segundo o profissional, existe uma atenção maior no acompanhamento de pacientes específicos como oncologia, transplantes e reabilitação. Entretanto, até mesmo em casos mais simples, é preciso atentar-se à qualidade de vida do enfermo, pois todos os cuidados são de extrema importância para que este se recupere.

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