Alguém escreveu a carta aos Efésios e usou o nome de Paulo para dar autoridade ao escrito. Este alguém seria um cristão que conhecia os ensinamentos de Paulo, mas foi avante na reflexão sobre a Igreja, sua natureza e sua função no mundo como comunidade una e universal.
Sabemos que Paulo escreveu com certeza as sete cartas canônicas: aos Romanos, a primeira e a segunda aos Coríntios, aos Gálatas, aos Filipenses, a primeira aos Tessalonicenses e a Filemon. É bem provável que tenha escrito também a segunda aos Tessalonicenses, aos Colossenses e a segunda a Timóteo. Efésios, Tito e a primeira a Timóteo são obras da Escola Paulina. Hebreus é obra autônoma, de um cristão bem formado, possivelmente Apolo, de Alexandria, que viveu em Éfeso e em Corinto.
A carta aos Efésios é de tipo universal. Foi escrita para toda a Igreja e não exatamente às comunidades de Éfeso. Ao longo do tempo recebeu esse nome de Carta aos Efésios e foi atribuída ao apóstolo Paulo. Ela tem certo parentesco com a carta aos Colossenses. As duas cartas destacam a idéia da Igreja como um Corpo e basta estar nesse Corpo para ser seguidor de Jesus Cristo. Não há necessidade de outras práticas. A Igreja aparece com a função de mediação. São Paulo já tinha morrido quando a carta foi escrita. Era, pois, importante manter a unidade das comunidades em torno de idéias firmes e claras sobre o significado da própria comunidade.
O cristão, que continua vivendo no mundo, mas passou a integrar uma comunidade de fé formada por seguidores de Jesus Cristo, deve saber que faz parte de um Corpo cuja cabeça é Cristo. A Igreja, que sua pessoa ajuda a formar, é um ser em Cristo, uma nova construção, um templo santo, a esposa de Cristo, a plenitude de Cristo, a nova criatura, o homem perfeito. Ela é na terra o espaço no qual se pode viver a novidade de vida trazida pelo Salvador.
Uma passagem de especial importância para a compreensão da obra de Jesus nesta terra e da unidade universal em sua pessoa encontra-se em 2,11-22. Aqui se vê que a Igreja é o que é por causa de sua cabeça, Jesus Cristo. A carta não propõe uma “eclesiolatria”, mas uma eclesiologia fundamentada numa clara cristologia. A Igreja não vem ocupar o lugar de Jesus. Ela está a seu serviço em favor do mundo.
“Ele é a nossa paz”, diz o texto. A paz não é simples ausência de guerra ou um bem estar interior quando as relações sociais vão bem. A paz é alguém, e esse alguém é Jesus. Nele estamos na paz, porque ele vem fazer dos dois povos um só. Dois povos são os judeus e os gregos, ou a toda a humanidade. Ele veio fazer do mundo inteiro um só povo. Para isso ele derruba o muro que separa uns dos outros e mata a inimizade em sua própria carne. As distâncias começam e crescem. Ele vem encurtá-las. Entre mim e o outro, um tijolo dá início ao muro de separação. Conhecemos na história o muro de Berlim e hoje em dia o muro que separa israelenses e palestinos. Ele veio derrubar “o muro de separação, suprimindo em sua carne a inimizade”. Ele não mata o inimigo. Ele mata a inimizade, e a mata em si mesmo. Ele se sacrifica para que a inimizade desapareça. O resultado da reconciliação é o Homem Novo ou a Paz. Agora todos, judeus e pagãos, num só Espírito, podemos chegar até o Pai.
Curiosamente, o autor coloca no centro da sua reflexão como a causa da inimizade e da separação, ou como explicação do que é a inimizade, “a Lei dos mandamentos expressa em preceitos”. Podemos entender de forma rápida essa expressão como a afirmação de que uma vida na Paz, com relacionamentos humanos de qualidade, não se faz sobre a observância de leis e de preceitos, e sim na caridade. A entrega de Jesus foi um ato livre de amor. A observância dos preceitos pode dar a falsa idéia de superioridade e de separação.
Depois da introdução, da saudação e da benção do início (1,1-23), a carta desenvolve longamente o tema da Igreja una e universal, explicando em que consiste ser um mesmo Corpo (2,1-3,21) e viver nesse corpo (4,1-6,9). A conclusão (6,10-24) é feita de exortações e saudações finais.
Um bom propósito para o ano paulino é ler as cartas de São Paulo, as 14 atribuídas ao Apóstolo.
Por Cônego Celso Pedro