O catolicismo e a ortodoxia possuem a mesma origem em uma única Igreja nascida em Jerusalém, fundada pelo próprio Cristo. Após a ressurreição de Jesus, os apóstolos saíram em missão em direção ao ocidente fundando várias comunidades.
Entre os séculos IV e V, as cinco primeiras Igrejas apostólicas receberam o título de patriarcados, dando origem à chamada pentarquia (do grego: penta – cinco, e arquia – governo ou governante), isto é, seus bispos eram patriarcas e tinham primazia sobre as outras comunidades cristãs. Os cinco patriarcados eram Roma, Constantinopla, Alexandria, Antioquia e Jerusalém. Na pentarquia, o Bispo de Roma, sucessor de Pedro, tinha o primado de honra entre os demais patriarcas, sendo o primus inter pares (o primeiro entre os iguais) na ordem de precedência das Igrejas.
O GRANDE CISMA
A separação entre os cristãos do Oriente e do Ocidente, chamada de “Grande Cisma” se concretizou no ano de 1054. Os fatores que, em um lento processo, levaram à separação são vários: políticos, culturais, eclesiásticos e doutrinários. “O ano que marcou essa separação foi 1054, mas também não podemos achar que, do dia para a noite, as Igrejas se separaram. Foi um processo desgastante para ambas, uma série de mal-entendidos e conflitos que levaram a uma ruptura formal”, explicou, ao O SÃO PAULO o Padre Gregório Teodoro, responsável pelo diálogo ecumênico na Igreja Ortodoxa Antioquina de São Paulo. Com a autonomia dos patriarcados, os cristãos passaram a diferenciar-se em questões de fé e liturgia bastante significativas, como a questão trinitária do filioque, na qual os orientais professam a fé de que o Espírito Santo procede somente do Pai, enquanto os ocidentais professam que este procede do Pai e do Filho.
No âmbito político, as tensões entre as duas Igrejas começaram com a divisão do Império Romano em oriental e ocidental, e a transferência da capital da cidade de Roma para Constantinopla, no século IV. Já do ponto de vista eclesiástico, a discordância entre orientais e ocidentais diz respeito à aceitação da autoridade do bispo de Roma, o papa, em relação aos demais patriarcas.
O fato que marcou o Cisma foi o envio do Cardeal Humberto à Constantinopla como legado do Papa Leão IX na tentativa de solucionar a crise. O resultado, porém, foi uma carta de excomunhão deixada sobre o altar da Basílica de Santa Sofia para o Patriarca de Constantinopla, Miguel Cerulário, que, por sua vez, retribuiu com a excomunhão do pontífice romano. Após o Cisma, os cristãos do Oriente passaram a ser chamados “ortodoxos” (que vem do grego orthos – reto, correto, e doxa – louvor, doutrina ou opinião), enquanto os do Ocidente passaram a ser chamados “católicos romanos”, por sua ligação à Sé Apostólica de Roma.
Assim como os católicos, os ortodoxos possuem os sete sacramentos com variações em relação aos ritos elaborados por São João Crisóstomo, São Basílio e São Gregório Magno. Também possuem organização hierárquica semelhante, com bispos (sucessores dos apóstolos), padres e diáconos, sendo que os padres e diáconos podem ser celibatários, geralmente monges, ou homens casados antes da ordenação. Já os bispos devem ser sempre escolhidos dentre os celibatários.
Ritos Católicos orientais
Entretanto, algumas comunidades orientais independentes mantiveram os vínculos com o Papa ou retornaram à plena comunhão com Roma com o passar dos anos. Desse modo, a Igreja Católica é constituída de 24 Igrejas autônomas em plena comunhão com o Romano Pontífice. A maior e mais conhecida delas é a ocidental, a Igreja Católica Apostólica Romana, também chamada de Igreja Latina. As demais seguem os diversos ritos orientais, como os maronitas, greco-melquitas, siríacos, ucranianos, entre outros que, embora tenham ritos e símbolos semelhantes aos dos ortodoxos, são Igrejas Católicas.
CAMINHO DE UNIDADE
Ao longo desses quase mil anos, foram muitas as tentativas de reunificação entre Oriente e Ocidente, principalmente nos concílios ecumênicos de Lyon (1274) e Florença (1439), mas sem sucesso. Porém, as mútuas excomunhões só foram levantadas em 7 de dezembro de 1965, pelo Papa Paulo VI e o patriarca ecumênico de Constantinopla, Atenágoras I, em um histórico encontro em Jerusalém e, posteriormente, de uma Comissão de Diálogo Teológico.
O jubileu de ouro deste histórico encontro foi celebrado no ano passado entre o Papa Francisco e o Patriarca Bartolomeu, também em Jerusalém.
Ainda em 2015, os primazes de Roma e Constantinopla se encontraram outras vezes, uma delas durante a visita do Pontífice à Turquia. Em 2013, Bartolomeu também foi à missa inaugural do início do pontificado de Francisco. Em 2006, Bento XVI também esteve na Turquia e se encontrou com o Patriarca Ecumênico. Atualmente, católicos e ortodoxos se consideram “Igrejas irmãs”, embora ainda não haja comunhão plena canônica e sacramental.
Nesses vários séculos, algumas comunidades orientais independentes voltaram para a plena comunhão com Roma, sendo assim instituídas as Igrejas Católicas de Rito Oriental Sui Iuris, sob a jurisdição do Papa, como as Igrejas Greco-Católica Melquita, Greco-Católica Ucraniana e Católica Siríaca. Ao todo são 23 dessas Igrejas. Já a Igreja Maronita, também de rito oriental, sempre permaneceu unida à Igreja de Roma, não aderindo ao Cisma de 1054.
ORGANIZAÇÃO ATUAL
Desde a separação da Igreja Católica, o Patriarcado de Constantinopla, também chamado de Patriarcado Ecumênico, ocupa o lugar de primus inter pares entre os ortodoxos. Hoje no mundo existem cerca de 300 milhões de ortodoxos, distribuídos em 14 Igrejas “autocéfalas”, isto é, que possuem um patriarca ou primaz com jurisdição própria em plena comunhão umas com as outras. Dessas, nove são patriarcados – os históricos de Constantinopla, Alexandria, Antioquia, Jerusalém, mais os da Rússia, Sérvia, Romênia, Bulgária e Geórgia, instituídos posteriormente – e cinco arcebispados com honras de patriarcados – Chipre, Grécia, Polônia, Albânia, República Tcheca/Eslováquia.
Também existem as Igrejas autônomas, independentes em questões internas, mas dependentes de algum patriarcado, como, por exemplo, para a confirmação da eleição de seu líder máximo. Entre elas estão as Igrejas ortodoxas da Finlândia (Constantinopla); Igreja do Monte Sinai (Jerusalém); Japão e China (Moscou), entre outras.
A Igreja Ortodoxa na América é um caso especial, pois é reconhecida como autocéfala pelo Patriarcado de Moscou e algumas Igrejas eslavas, mas não pelo Patriarcado Ecumênico de Constantinopla. Cada uma dessas Igrejas é governada pelo seu próprio Santo Sínodo, constituído de todos os bispos e arcebispos e presididos por seu líder máximo, que delibera sobre questões internas e a escolha ou remoção dos bispos, inclusive, patriarcas ou primazes. A reunião dos patriarcas e primazes da comunhão ortodoxa é chamada de Sinaxe, sempre convocada pelo Patriarca de Constantinopla.
‘CISMA’ DE MOSCOU
Em outubro de 2018, o Patriarcado de Moscou rompeu todos os vínculos de comunhão com o Patriarcado Ecumênico de Constantinopla. A decisão foi tomada pelo Sínodo da Igreja Ortodoxa Russa, após o Patriarca de Constantinopla, Bartolomeu I, reconhecer a autocefalia da Igreja Ortodoxa da Ucrânia. Em 1991, o grupo ucraniano havia se declarado independente da Igreja Russa, após a dissolução da União Soviética.
IGREJAS PRÉ-CALCEDONIANAS
Antes ainda de 1054, durante os séculos IV e V, algumas Igrejas orientais passaram a se organizar independentemente por não aceitarem totalmente as formulações do 4º Concílio Ecumênico de Calcedônia (451) como, por exemplo, a duas naturezas, humana e divina, de Jesus Cristo. Por isso, são chamadas “Pré-Calcedonianas”.
Elas não possuem comunhão plena com ortodoxos nem com os católicos. São as Igrejas Apostólica Armênia, Syrian-Ortodoxa, Copta e Ortodoxa da Etiópia.
NO BRASIL
A primeira Igreja ortodoxa e da América Latina foi construída pelos imigrantes sírio-libaneses em 1904 em São Paulo, na região da rua 25 de Março (Em julho passado, este templo foi destruído parcialmente por um incêndio de grandes proporções em um edifício vizinho). Em 1922, foi elevada à Arquidiocese pelo Patriarcado de Antioquia. Posteriormente, os imigrantes gregos, russos, poloneses e ucranianos organizaram suas comunidades ortodoxas segundo suas etnias e patriarcados.
(Reportagem originalmente publicada no jornal O SÃO PAULO, edição de 24 de fevereiro de 2016)
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