As dimensões social e comunitária da esperança cristã

A salvação [cristã] foi sempre considerada como uma realidade comunitária. A Carta aos Hebreus fala de uma “cidade” (cf. 11,10.16; 12,22; 13,14) e, portanto, de uma salvação comunitária. Coerentemente, o pecado é entendido pelos Padres como destruição da unidade do gênero humano, como a fragmentação e divisão. Babel, o lugar da confusão das línguas e da separação, apresenta-se como expressão daquilo que é radicalmente o pecado. Desse modo, a “redenção” aparece precisamente como a restauração da unidade, na qual nos encontramos novamente juntos numa união que se delineia na comunidade mundial dos crentes […] A vida verdadeira, para a qual sempre tendemos, depende do fato de se estar na união existencial com um “povo” e pode realizar-se para cada pessoa somente no âmbito deste “nós”.

Esta visão da “vida bem-aventurada” orientada para a comunidade visa, certamente, algo que está para além do mundo presente, mas é precisamente deste modo que ela tem a ver também com a edificação do mundo – segundo formas muito distintas, conforme o contexto histórico e as possibilidades por ele oferecidas ou excluídas […] Olhando precisamente a história atual, não se constata novamente que nenhuma estruturação positiva do mundo é possível nos lugares onde as almas se brutalizam?

É necessária uma autocrítica da Idade Moderna feita em diálogo com o Cristianismo e com a sua concepção da esperança. Nesse diálogo, também os cristãos devem aprender de novo, no contexto dos seus conhecimentos e experiências, em que consiste verdadeiramente a sua esperança, o que é que temos para oferecer ao mundo e, ao contrário, o que é que não podemos oferecer. É preciso que, na autocrítica da Idade Moderna, conflua também uma autocrítica do Cristianismo moderno, que deve aprender sempre de novo a compreender-se a si mesmo a partir das próprias raízes.

A verdadeira e grande esperança do homem, que resiste apesar de todas as desilusões, só pode ser Deus – o Deus que nos amou, e ama ainda agora “até ao fim”, “até à plena consumação” (cf. Jo 13,1 e 19,30). Quem é atingido pelo amor começa a intuir em que consistiria propriamente a “vida”. Começa a intuir o significado da palavra de esperança que encontramos no rito do Batismo: da fé espero a “vida eterna” – a vida verdadeira que, inteiramente e sem ameaças, em toda a sua plenitude, é simplesmente vida […] A vida, no verdadeiro sentido, não a possui cada um em si próprio sozinho, nem mesmo por si só: ela é uma relação. A vida na sua totalidade é relação com Aquele que é a Fonte da Vida. Se estivermos em relação com Aquele que não morre, que é a própria Vida e o próprio Amor, então estamos na vida; então “vivemos”.

Mas, a relação com Jesus é uma relação com Aquele que Se entregou a Si próprio em resgate por todos nós (cf. 1 Tim 2,6). O fato de estarmos em comunhão com Jesus Cristo envolve-nos no seu ser “para todos”, fazendo disso o nosso modo de ser. Ele compromete-nos a ser para os outros, mas só na comunhão com Ele é que se torna possível sermos verdadeiramente para os outros, para a comunidade […] Ao amor para com Deus se segue a participação na justiça e na bondade de Deus para com os outros […] O amor de Deus revela-se na responsabilidade pelo outro.(Spe salvi, SS 14-28).

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