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Caminhos de superação da pobreza no mundo atual

A pobreza é um fenômeno que ultrapassa simples medidas de renda, inclui a falta ou o acesso limitado a educação, saúde, segurança, habitação e participação política. Combatê-la exige estratégias que vão além de aumentar o rendimento monetário, abordando também suas causas e consequências

Luciney Martins/O SÃO PAULO

A pobreza é um problema econômico ou moral? É resultado da escolha individual ou consequência de um sistema econômico? Essas questões geram controvérsias e foram centrais nos debates sobre desenvolvimento econômico no século XX.

Quando vista como questão moral, a pobreza é interpretada como opção voluntária pelo ócio e aversão ao trabalho, o que a torna moralmente condenável. Se entendida como resultado das dinâmicas econômicas, a pobreza seria involuntária, e os pobres mereceriam apoio social e solidariedade.

Essa distinção entre pobreza voluntária e involuntária é equivocada. A pobreza não decorre da preferência pelo ócio nem de leis imutáveis do mercado. Historicamente, a explicação moral justifica o controle da riqueza por poucos, enquanto a explicação econômica radical sugere que o capitalismo deve ser abolido para eliminar a pobreza. Contudo, as duas explicações, vistas de forma assim esquemática, não se sustentam, em uma observação empírica da realidade social e da história.

Como superar a persistência da pobreza diante do aumento do patrimônio global desde a Revolução Industrial? Para responder, é necessário definir pobreza. A literatura distingue pobreza extrema, foco principal das políticas públicas, e pobreza relativa, que persiste mesmo em países desenvolvidos.

No Brasil, famílias com renda domiciliar per capita inferior a cerca de R$ 218,00 (em 2024) são consideradas em pobreza extrema. A linha do Banco Mundial para pobreza extrema é US$ 3,00 por dia (PPC 2021), e até US$ 6,85 para pobreza moderada. Independentemente da linha usada, pobreza extrema indica incapacidade de suprir necessidades básicas essenciais à sobrevivência.

A pobreza extrema prevalece em muitos países da América Latina, África e Ásia, diferindo da pobreza relativa presente em países desenvolvidos, que embora menor em gravidade, ainda representa um problema social, dado que esses países possuem recursos para sua erradicação.

Existe fórmula para acabar com a pobreza extrema? Não há solução única e universal para combater a pobreza. O crescimento econômico já foi visto como suficiente, mas a experiência mostra que nem sempre isso ocorre.

Há países que registraram redução da pobreza acompanhando crescimento econômico, e outros em que a pobreza caiu sem crescimento significativo. A desigualdade de renda é fator crucial: quanto maior a desigualdade, menor o impacto do crescimento na redução da pobreza. No Brasil, a desigualdade alta restringe o alcance do crescimento sobre a pobreza.

Combater a pobreza exige reconhecer a interligação entre pobreza, crescimento econômico e desigualdade. Em países desiguais, o desenvolvimento econômico deve ser combinado com políticas específicas de transferência de renda.

Uma estratégia com resultados reconhecidos internacionalmente é a transferência condicionada de renda, que repassa recursos públicos para populações pobres mediante cumprimento de demandas específicas, como o programa Bolsa Família, que atualmente beneficia cerca de 19,6 milhões de famílias e condiciona a transferências à frequência escolar e a aplicação de vacinas. O programa tem contribuído para retirar milhões de pessoas da pobreza. Os estudos mostram que o programa contribuiu para a redução da pobreza e da desigualdade, estimulando a entrada dos beneficiários no mercado de trabalho (desafiando visões que associam transferência de renda à dependência econômica), e estimulam o desenvolvimento local. Outras políticas focadas em crianças, como educação gratuita de qualidade e acesso à medicina preventiva, são fundamentais para romper o ciclo intergeracional da pobreza.

As análises sugerem, contudo, que as transferências condicionadas de renda não são suficientes para resolver a pobreza estrutural e devem ser complementadas por políticas de geração de emprego de qualidade e oportunidades no setor produtivo. A proteção social deve ser combinada com o desenvolvimento econômico. Programas de microcrédito, por exemplo, contribuem para a autonomia financeira das famílias, permitindo criação e manutenção de pequenos negócios, reduzindo a dependência das transferências.

Como os recursos são sempre limitados, é fundamental escolher medidas com maior impacto social e retorno econômico para ampliar o alcance das políticas de combate à pobreza extrema.

Com políticas bem desenhadas e implementadas, é possível reduzir significativamente a pobreza extrema em prazo relativamente curto. Sua erradicação completa demanda mais tempo, mas é viável se o crescimento econômico robusto vier acompanhado de redução da desigualdade.

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