Crucifixos e prédios públicos

O grande assunto do momento, naturalmente, é a pandemia de COVID-19. Isso não impede, no entanto – ou ao menos não deveria impedir –, que a atenção se volte a outros assuntos de notável importância. Um deles, especialmente oportuno, é a tentativa de proibir símbolos religiosos em espaços e prédios públicos. Ou melhor: a retirada dos crucifixos ali entronizados desde há muito tempo.

A justificativa é a velha laicidade do Estado, aqui em sua versão mais distorcida. Porque Estado laico é simplesmente aquele que não tem religião oficial, garantindo ampla liberdade religiosa, sem se intrometer em ortodoxias e práticas religiosas (desde que não afrontem claramente o ordenamento jurídico e a ordem natural).

O adjetivo “laico” não se iguala a “ateu” ou “antirreligioso”. Estados comunistas são ateus. Estados democráticos não são nem uma coisa nem outra. No caso do Brasil, há mais um detalhe: a proteção de Deus é o fundamento de validade do ordenamento jurídico, invocada no preâmbulo da Constituição Federal para salvaguardar o Estado, as leis e a sociedade brasileira.

Como a Constituição Federal garante a amplitude da liberdade religiosa, sob a própria proteção divina, ninguém poderá se sentir por isso ofendido ou, em razão da crença nessa proteção, se ver relegado ao plano da subcidadania.

Não há Ocidente sem Filosofia Grega, sem Direito Romano, sem Cristianismo. O Brasil não apenas herda todos os três fundamentos da civilização, como ele próprio nasce do esforço apostólico de Portugal.

O primeiro nome que lhe deram foi Terra de Santa Cruz. Em sua primeira bandeira, esteve a Cruz da Ordem de Cristo; em seu primeiro ato solene, a Santa Missa. Mesmo hoje, e isso é facilmente constatável, inúmeras cidades e estados ostentam, no nome de cada qual, santos ou símbolos da fé católica.

Desrespeitar tudo isso não é privilegiar a visão laical de Estado, mas atacar os fundamentos morais do País, seu selo distintivo, sua história, sua cultura e sua identidade.

Compreendo que novos espaços públicos, novos prédios, não tenham símbolo religioso algum. Não gosto, porém, vá lá, aceito com algum esforço. O que não compreendo, e considero inaceitável, é a gana diabólica com que tentam retirar os símbolos da cultura que já estão lá, não poucos há mais de séculos, edulcorando os prédios do Estado com a mais poderosa mensagem de amor que pode haver.

No fundo, é o que pretendem os autores da ação que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF): exercer pelas vias legais o ódio ao catolicismo. Uma minoria de militantes anticristãos deforma a essência das funções públicas e desrespeita a vontade, os sentimentos e os valores da expressa maioria da população brasileira.

Anos atrás, a mesma discussão se deu na Itália e caminhou até o Tribunal de Direitos Humanos da União Europeia, em Estrasburgo, na França. E o Tribunal decidiu que os crucifixos deveriam permanecer onde estavam e, em especial, nas escolas públicas. A presença deles não ofendia sentimentos religiosos ou o Estado laico. Externava apenas a identidade e a cultura geral do país.

Lutemos pela permanência dos crucifixos. Mesmo na diabólica hipótese, contudo, de que os retirem, a fé remanescerá viva, indestrutível, como virtude em união íntima com a esperança e o fundamento do verdadeiro amor. Porque, em verdade, o Estado nada pode contra o poder que vem do alto.

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Antonio Marchionni
Antonio Marchionni
4 anos atrás

Com argumentos do passado o escrito quer convencer os presentes. É como dizer que por milênios os raios foram lançados por Júpiter e, portanto, tal narração deve permanecer ao lado da explicação física atual. Contra a petição de proibir o crucifixo nos órgãos públicos, o único argumento válido é o próprio crucificado, Jesus, não nomeado no escrito, e não por acaso. O nome de Jesus, “cujo nome está acima de qualquer nome”, já está proibido na universidade moderna e nas reflexões públicas, e estará ausente nas doutas defesas ante o STF. Nas salas de aula da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, onde dou aula, havia o crucifixo e já foi tirado. Já “estamos” laicos, e não será a decisão do tribunal a piorar as coisas. O único argumento é os laicos dizerem dos católicos “vede como se amam”, coisa que, para além de alguns fatos reais de amor nos fiéis, acontece de mentirinha nos católicos que falam bonito. É só ver que entre o clero há enormes diferenças econômicas na mesma diocese e dentro da universidade católica a diferença de salários vai de 1 a 30. O único argumento é “mostrar” que os cidadãos do país e os juízes do tribunal estamos necessitados do Pai de Jesus, do qual vem o que é “nosso”, o qual não deixa a Nação “cair na tentação” e a “livra do mal”.