Drogas e desenvolvimento humano integral

O mundo parece estar perdendo a guerra contra as drogas. Diante disso, nos vemos tentados a respostas simplistas, que minimizam os riscos evidentes da droga ou maximizam a repressão e o encarceramento. As duas respostas são ideológicas e falsas, soluções simplistas e esquemáticas que não enfrentam os problemas em sua complexidade, negando dados da própria realidade. Em todos os países, as respostas que se mostraram mais eficazes envolvem uma visão integral da questão, com ações que ajudam os jovens a descobrir o sentido e a beleza da vida, favorecem a recuperação e reintegração social dos dependentes, enfrentam o crime organizado em seu âmago, não apenas em suas ramificações exteriores e promovem a segurança pública. Trata-se de um desenvolvimento humano integral, que alcança todas as pessoas, em todas as suas dimensões, um caminho realista de amor e acolhida à pessoa.

Arte sobre foto de Luciney Martins/O SÃO PAULO

A polêmica descriminalização da maconha, entre muitos outros problemas, repete um erro típico de nossa sociedade: querer resolver nossas questões com discursos inflamados ou decisões normativas sem respaldo na realidade. O consumo de drogas e o narcotráfico estão crescendo em todo o mundo – e a maior parte das sociedades parece estar perdendo essa verdadeira guerra. A resposta convencional, baseada no encarceramento massivo, tem se mostrado ineficaz. Mas o caminho inverso, de maior permissividade, por mais simpático que pareça, também não mostra a tão aclamada eficácia. Os melhores resultados, como esperamos fique claro neste Caderno Fé e Cidadania, vêm sendo colhidos onde se buscam soluções integrais, que respeitam a autonomia e a dignidade da pessoa, mas conscientizam para os perigos das drogas e promovem a recuperação e reinserção social dos dependentes químicos.

Um drama cada vez maior. Tanto nossos jovens quanto nossos adultos vivem num mundo cada vez mais exigente e competitivo, pressionados pela demanda por desempenho e sucesso material, muitas vezes defrontando-se com uma realidade desigual, que não lhes dá verdadeiras oportunidades. O ser humano sempre procurou momentos de descanso e alívio das tensões, se valendo de substâncias que o ajudassem a relaxar e até esquecer as dificuldades. Nesse contexto, o álcool desempenhou um papel histórico inegável – seja para o bem, seja para o mal.

Com a pressão crescente, é compreensível que as pessoas também procurem alternativas cada vez mais extremas para descansar e relaxar. Se não encontram alternativas adequadas tanto para o desenvolvimento pessoal quanto para o repouso e a diversão, tornam-se presas cada vez mais fáceis para as drogas. Por isso, particularmente com os jovens, o combate às drogas passa por um acompanhamento responsável de pessoas mais sábias, reais possibilidades de crescimento pessoal, opções sadias de diversão. Uma sociedade que não cuida bem de seus jovens, perde a guerra contra as drogas e as chances de um futuro promissor.

Não se pode escamotear os dados da realidade: drogas, lícitas ou ilícitas, são perigosas. No caso daquelas socialmente aceitas, em particular o álcool, devem ser usadas com extrema moderação e prudência. No caso daquelas ilícitas, o melhor é evitar, buscar alternativas sadias para enfrentar as pressões e desgostos do cotidiano. Evidentemente, isso depende de espaços de acolhida e apoio adequados, a começar pelas famílias, mas também nas escolas e outras organizações sociais.

Para aqueles que já se enveredaram pelo caminho da dependência, é fundamental uma companhia que ajude e apoie na superação do vício, espaços comunitários e de acolhida. Nos vários países, soluções truculentas não têm se sustentado. Podem afastar o problema por um período ou de um território, mas ele voltará mais à frente, ainda maior do que antes. É verdade que certas soluções irrealistas e permissivas também acabam por aumentar o problema. Contudo, tanto na truculência quanto na permissividade, ver-se-á a mesma falha: a falta de uma companhia que apoie de forma adequada a pessoa.

Alternativas eficazes ao encarceramento massivo. O aumento da influência do crime organizado, as prisões abarrotadas, a vulnerabilidade dos mais pobres nos levam – ou deveriam levar – a uma justa indignação e ao compromisso de encontrar novos caminhos. Contudo, soluções formais, que alteram legislações para tentar alterar a realidade, sem criar novas estratégias de ação, são ineficazes.

O encarceramento massivo não é solução, mas já existem caminhos alternativos e bem conhecidos. Por exemplo, a justiça terapêutica, que já vem sendo aplicada no Brasil, procura encaminhar pessoas que cometeram pequenos delitos e que estão envolvidas com drogas para instituições que podem ajudá-las em sua recuperação, em vez de enviá-las para um sistema prisional ineficiente.

A truculência policial e as penas cada vez mais duras também parecem não ser alternativas. Mesmo as prisões mais seguras frequentemente têm se tornado centros de decisão das lideranças criminosas, mesmo que essas permaneçam presas. Os Estados Unidos é um dos países que mais prende no mundo, mesmo assim o problema das drogas só cresce por lá.

Para vencer o narcotráfico é necessário atacar seus centros de comando e não apenas suas ramificações, que crescem sem parar. As ações mais eficazes, normalmente indicadas por especialistas, estão centradas em desmantelar suas redes e valer-se de medidas econômicas que evitem o enriquecimento dos traficantes. Em relação ao “varejo da droga”, é fundamental desenvolver um policiamento comunitário eficaz, pelo qual o policial é visto como um parceiro de pais, professores e membros da comunidade em geral, acompanhando e protegendo os jovens, evitando que o narcotráfico se infiltre nas escolas e comunidades.

São ações que exigem vontade política, investimentos bem delineados, mudanças culturais de médio e longo prazo. Portanto, tentar enfrentar o problema das drogas com respostas fáceis e esquemáticas não será possível.

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