Em 1999, há 25 anos, morria o Governador Franco Montoro, um dos mais emblemáticos políticos católicos brasileiros do século XX. Aos poucos a história vem reconhecendo o papel fundamental deste líder na construção de um Brasil mais democrático e justo. Às vésperas das eleições municipais, vale a pena resgatar, em especial, o valor do testemunho cristão de Montoro e colher de sua vida política alguns de seus princípios e bandeiras que podem iluminar o cenário atual e futuro do país.
O testemunho cristão é sempre importante para a vida pessoal, social e religiosa. Cristo deu testemunho de Deus Pai assim como seus discípulos deram testemunho do Deus Filho, na Graça do Espírito Santo. A tradição testemunhal da Igreja Católica, com os santos e santas, ilumina a vida de fé no presente. O testemunho cristão é particularmente importante no campo da política que tem como tarefa essencial zelar pelo bem comum.
André Franco Montoro (1916-1999), ao longo de sua vida pública, deu exemplo do que é ser um político cristão. Percorreu um caminho de desenvolvimento crescente. Foi vereador, deputado estadual e federal, senador e governador de São Paulo. O seu discurso humanista, cheio de entusiasmo, foi uma constante neste percurso. Implementou propostas arrojadas para sua época, como a descentralização federativa e a participação dos cidadãos. A atuação concreta dos políticos é o que torna visível a coerência entre o discurso e a prática. A coerência confirma o voto dos eleitores e motiva outras pessoas a participar da missão política.
Os cristãos, leigos e leigas, são chamados a atuar nas instituições de representação política e no Estado. Montoro costumava dizer que qualquer pessoa de boa vontade, com espírito público, independentemente do seu credo ou visão de mundo, deve envolver-se com a política. Considerava que havia um chamado especial aos jovens, às mulheres e às lideranças comunitárias.
Montoro formou políticos dentro e fora de seu próprio partido. Não queria o poder para si, mas compartilhava sua liderança com outras pessoas. Ao lado de outras lideranças cristãs de seu tempo como Ulysses Guimarães, Tancredo Neves e Pedro Simon, esta geração de Estadistas constituiu as bases do período democrático mais longo da história.
Antes de finalizar, é importante responder a uma objeção: será que os bons políticos cristãos são moralmente infalíveis? A resposta é óbvia: todo político cristão é moralmente falível e provavelmente cometerá erros no exercício de seus mandatos. Mas como lidar com o erro? Em primeiro lugar reconhecendo-se pecador e dependente da Graça de Deus para avançar.
Quando era Arcebispo de Buenos Aires o Papa Francisco escreveu Corrupção e Pecado (São Paulo: Ed. Ave Maria, 2021), onde ensina que somos todos pecadores, mas nem por isso corruptos. Diz o ditado que errar é humano e insistir no erro é pecado. Na política, aquele que insiste no pecado certamente cairá na tentação da corrupção. Por isso, do ponto de vista da fé católica, é preciso nutrir-se dos Sacramentos, em especial, da Eucaristia e da Confissão.
Hannah Arendt diria que diante da irreversibilidade das ações erradas a única saída libertadora é a força do perdão. Quem sabe a política, tão desacreditada, possa ganhar um novo impulso quando tivermos mais testemunhos de cristãos capazes de pedir perdão e corrigir seus erros criando uma cultura política fundada na humildade. Isso ocorreu em vários momentos da história, dentre eles, no restabelecimento da paz entre os países europeus após a II Guerra Mundial.
Os conhecidos líderes católicos, tidos como pais da União Europeia, Konrad Adenauer, Robert Schuman e Alcide De Gasperi criaram em torno de si comunidades de políticos que atuavam com base nos valores humanistas cristãos. Para isso, a educação política teve um papel fundamental. Surgiram assim, na Alemanha, as Fundações políticas, dentre elas a Konrad-Adenauer, que teve Franco Montoro como presidente de seu Conselho Consultivo, no Brasil.
A caminhada da Oficina Municipal, uma escola de cidadania e gestão pública vinculada à Fundação Konrad Adenauer, confirma a importância desta experiência das comunidades de políticos. Ela não somente oferece cursos e espaços de formação para aperfeiçoar e compartilhar boas práticas na gestão, mas, sobretudo, cria comunidades onde prefeitos, prefeitas e gestores se encontram, se apoiam, se motivam e se corrigem em seus percursos políticos, muitas e muitas vezes solitários.
O Santo Padre Paulo VI dizia que a Política é uma das expressões mais perfeitas do amor, da caridade. Um amor que transborda a comunidade familiar, a comunidade de amigos e a comunidade religiosa. Neste sentido, a vida cristã ao longo da história provou que é possível experimentar o amor político e a amizade social. Este é o testemunho que Franco Montoro e tantos outros políticos cristãos nos deixaram.