Os que receberam a grande graça da fé

Essas observações sobre o caráter da esperança cristã são apresentadas, de modo mais amplo, em GIUSSANI, L. É possível viver assim? São Paulo: Companhia Ilimitada, 2008.

A esperança cristã não é otimismo, nem incerteza, pois se apoia totalmente em uma Presença, em Alguém que está presente e que nos disse: “Eis que estarei convosco todos os dias, até o fim do mundo” (Mt 28, 20). É uma certeza do futuro que nasce da fé na presença de Cristo conosco, que já mudou nossa vida e deu-lhe um rumo, um sentido, um sabor novo – como afirmaram Bento XVI (Deus caritas est, DCE 1) e Francisco (Evangelii gaudium, EG 3,7). A dinâmica da fé torna-se certeza de um futuro bom, na medida em que desejamos e pedimos que dure o dom que Cristo faz de si mesmo a nós, no presente. Desejamos que dure o relacionamento com Ele e a certeza de que Ele não nos abandonará nunca. A esperança dialoga com a “memória” da companhia de Cristo – memória que não é uma lembrança sentimental, mas a consciência de um fato que aconteceu e continua a acontecer em nossa vida.

O poeta francês C. Pèguy, em Os portais do mistério da segunda virtude (Lisboa: Paulinas, 2014), ao refletir sobre a esperança, diz que “para esperar é preciso ter recebido uma grande graça”: a certeza de que Cristo existe e está conosco. A promessa cristã não é a de que tudo vai dar certo, conforme nossos planos, mas sim de que, em qualquer situação, por mais difícil, o desejo de bem irá se realizar, ainda que em meio a sofrimentos. A felicidade e a plenitude da vida podem ser bens árduos e difíceis de alcançar, mas podemos estar cheios de confiança porque não estamos sozinhos.

A esperança cristã que pode sustentar nossa vida e a vida do mundo vem de algo que experimentamos e que não depende das circunstâncias conjunturais. Mas o mundo, e nós cristãos muitas vezes, estamos muito longe dessa experiência. Por isso, somos chamados a não nos iludirmos com as esperanças vãs e, vivendo o relacionamento pessoal com Cristo presente, dar sabor ao mundo. O sabor que Cristo traz chama-se fortaleza, coragem, discernimento, inteligência, sabedoria, sobriedade, prudência, justiça, e, sobretudo, paciência. É como um sal que carregamos: “Vós sois o sal da terra. Se o sal for insípido, com que se há de salgar?” (Mt 5,13). Que os cristãos possam redescobrir a esperança!

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