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Um país cristão

No contexto internacional, os dados do Censo de 2022 demonstram que o Brasil continua sendo um grande país cristão – ainda que o Cristianismo seja mais plural, com o crescimento do número de cristãos evangélicos pentecostais.

O Censo de 2022 indica a continuidade na mudança no perfil dos grandes grupos de religião no Brasil. O declínio na população católica é particularmente marcante. De 93,1% das pessoas com 10 anos ou mais de idade em 1950, a proporção de católicos caiu para 56,8% da população em 2022. Pode ter ocorrido um aumento nos católicos nominais (não praticantes), que, apesar de se identificarem como católicos, não se envolvem ativamente em práticas religiosas, embora isto não seja medido pelos dados censitários. Em contrapartida, há uma tendência de aumento dos evangélicos, em especial entre os jovens adultos, embora a sua taxa de crescimento anual tenha se desacelerado nos últimos anos. A urbanização, com 87,4% dos brasileiros vivendo em cidades em 2022, tende a amplificar essas mudanças, pois os jovens nos centros urbanos são mais propensos a encontrar e adotar perspectivas culturais variadas e, às vezes, conflitantes sobre religião e moralidade. 

Em relação à crença da população em Deus, de acordo com a pesquisa Global Religion de 2023, 89% dos brasileiros afirmam acreditar em Deus ou em um poder superior. Isso coloca o Brasil no topo do ranking entre 26 países, empatado com a África do Sul e a Colômbia. A taxa de crença no Brasil é significativamente maior do que a média global de cerca de 60%, destacando o forte senso de fé do País.

Apesar da alta porcentagem de brasileiros que acreditam em Deus, menos pessoas se identificam com uma religião específica. Enquanto 89% acreditam em um poder superior, apenas 76% dizem seguir uma religião, o que excede a média global de 67%. Entre os que têm religião, 70% dos brasileiros se identificam como cristãos (incluindo católicos e evangélicos), enquanto 5% seguem outras religiões. Curiosamente, 20% dos brasileiros não seguem religião alguma, refletindo uma tendência crescente em direção ao secularismo ou práticas espirituais individuais.

A pesquisa Global Religion 2023 também destaca uma divisão geracional, particularmente entre os católicos. Enquanto 38% da população adulta se identifica como católica, apenas 23% da Geração Z (nascida entre 1997 e 2012) adere à fé, uma diferença de 15 pontos percentuais. Entre os evangélicos, a diferença é menor, com 29% dos adultos e 26% dos jovens se identificando com a religião. Isso sugere que o cristianismo evangélico conseguiu atrair mais jovens seguidores do que o catolicismo, refletindo mudanças na dinâmica religiosa no Brasil. Nesse sentido, o survey internacional do Projeto Footprints sobre valores morais e crenças religiosas de 2023 revela que, entre os jovens adultos de 18 a 29 anos, 27% se identificam como católicos (tanto romanos quanto gregos), 31% como evangélicos e 13% como não religiosos. Isso se alinha às tendências observadas de um perfil mais jovem da população evangélica, conforme o Censode 2022, destacando tanto a crescente proeminência das afiliações evangélicas quanto da população não religiosa entre os jovens brasileiros. 

Estudos da sociologia e da demografia das religiões apontam a questão da dificuldade da estrutura hierárquica territorial da Igreja para acompanhar a população em áreas de expansão residencial das aglomerações urbanas, em especial as periferias metropolitanas, concedendo espaço para o avanço das comunidades evangélicas. Considerando a Região Metropolitana de São Paulo, observa-se que enquanto a proporção de evangélicos é de 23% na capital, nos municípios do entorno atinge 30% em 2022. Alguns autores destacam o processo de secularização associado à emergência da concorrência do mercado religioso, particularmente nas áreas urbanas. Além disso, a crescente diversidade das redes sociais entre os jovens, influenciada pela exposição a uma variedade de fontes de informação além da família e das instituições religiosas tradicionais, pode contribuir para essa mudança no perfil das religiões no País. 

Apesar de todas as mudanças apontadas, mais da metade da população adulta continua a ser católica. Um em cada quatro adultos brasileiros se declara evangélico, mas o ritmo de crescimento da população evangélica diminuiu na última década. Por isso, ainda é uma incógnita saber se a hipótese da transição religiosa – de que em poucas décadas a proporção do total de evangélicos ultrapassará a de católicos – será uma realidade. Resta saber quando e como os católicos irão com mais entusiasmo e fé aos jovens das periferias territoriais e existenciais das nossas metrópoles, conforme pregava o Papa Francisco. Vamos aguardar a próxima rodada dos censos de 2030, que não está tão distante.

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