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A caridade como fruto da oração: um caminho de santidade 

A caridade, entendida como o amor sobrenatural que nos une a Deus e ao próximo, é o mais alto mandamento cristão. No entanto, ela não nasce espontaneamente do coração humano ferido pelo pecado; ela é dom de Deus, cultivado no silêncio fecundo da oração. O Catecismo da Igreja Católica afirma: “A oração é a elevação da alma a Deus ou o pedido a Deus de bens convenientes. De onde falamos com Ele, como filhos que se dirigem a seu Pai” (CIC 2559). Nesse diálogo com Deus, a alma é transformada e capacitada a amar como Cristo amou. 

A Escritura é clara ao apresentar a relação entre oração e caridade. Jesus, ao ensinar seus discípulos a orar, os leva a reconhecer Deus como Pai: “Pai nosso que estais nos céus” (cf. Mt 6,9). Tal reconhecimento não é apenas teológico, mas relacional. Se Deus é Pai, todos somos irmãos; logo, orar é abrir-se à comunhão com o próximo. São João, em sua primeira carta, expressa de forma contundente: “Quem não ama o seu irmão, a quem vê, não pode amar a Deus, a quem não vê” (cf. 1Jo 4,20). Assim, a oração autêntica conduz inevitavelmente ao exercício da caridade, pois nela o coração se conforma ao de Cristo, o qual “passou fazendo o bem” (cf. At 10,38). 

Santos e doutores da Igreja foram unânimes ao afirmar essa fecunda ligação entre oração e caridade. Santa Teresa de Jesus, doutora da Igreja, escreve em seu Livro da Vida: “O fim da oração não é ter grandes consolações, mas a aquisição de virtudes; e a principal delas é a caridade”. Ela nos ensina que não basta buscar momentos de êxtase ou consolo espiritual na oração: sua eficácia se mede pela capacidade de amar concretamente, sobretudo nos momentos mais difíceis. São João da Cruz, místico carmelita, vai além: “A alma que ama a Deus verdadeiramente não se contenta com amar só a Deus, mas quer que todos O amem”. Daí nasce o zelo apostólico, a caridade missionária que impulsiona os santos a sair de si mesmos e servir os outros, até o sacrifício. 

O Papa Bento XVI, na encíclica Deus caritas est, afirma que “a caridade é possível e podemos praticá-la porque fomos criados à imagem de Deus. […] A oração é decisiva porque nos liberta do fechamento do nosso ‘eu’ e nos abre para Deus e, assim, para o outro” (n. 36). Ele reforça que a vida interior não nos afasta do mundo, mas nos capacita a amar com mais profundidade, autenticidade e sacrifício. São Vicente de Paulo, grande apóstolo da caridade, também via na oração o alimento essencial para o serviço aos pobres. Dizia ele: “Dai-me um homem de oração e ele será capaz de tudo. Ele poderá dizer como São Paulo: ‘Tudo posso naquele que me fortalece’” (cf. Fl 4,13). Sua vida é testemunho de que a ação caritativa só permanece fiel ao Evangelho quando enraizada em profunda vida de oração. Santa Teresa de Calcutá, em tempos mais recentes, viveu radicalmente essa união entre contemplação e ação. Ela afirmava: “As mãos que servem devem ser sustentadas pelos corações que oram”. Seu serviço aos mais pobres dos pobres nascia de horas diárias diante da Eucaristia. Para ela, só um coração transformado pela oração é capaz de reconhecer o Cristo escondido no sofrimento do irmão. 

Dessa forma, compreendemos que a caridade não é mero filantropismo ou impulso emocional, mas fruto maduro da oração que nos une a Deus. Na intimidade com Ele, aprendemos a amar como Ele ama: gratuitamente, com misericórdia, e até o extremo. Sem oração, a caridade perde seu sabor evangélico e se converte em ativismo. Com oração, ela se torna expressão da presença viva de Cristo no mundo. Fiquemos com as palavras de São Paulo: “A caridade é paciente, é benigna, não é invejosa… tudo crê, tudo espera, tudo suporta” (cf. 1Cor 13,4-7). Essas virtudes não se improvisam: são fruto da alma que, pela oração constante, se deixa plasmar pelo Espírito de Deus. Quem ora verdadeiramente, ama verdadeiramente. 

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