A participação popular direta

Que tal mudar o foco das próximas eleições para repensar algo que já se encontra em nosso alcance? 

Nestes tempos de acirrado embate político pelas eleições estaduais e nacionais, o radicalismo impera e dificulta o diálogo. Assim é que a visão ideológica faz enxergar apenas defeitos nas obras e posicionamentos dos adversários políticos, atribuindo-se a si, normalmente, o monopólio de todas as virtudes; seja do lado progressista, com alinhamentos automáticos às lideranças da esquerda, seja do lado conservador, com suas pautas e agendas evocando os costumes e afins. Nessa colocação “estanque”, o eleitor fica mais confuso do que esclarecido. 

O que se presencia na sociedade se reflete no seio da Igreja. Muitos fiéis entendem que a religião não deveria se intrometer nos assuntos políticos, pois estes devem ser resolvidos em foros próprios distantes dos púlpitos e altares. 

O Magistério da Igreja tem se posicionado sempre a favor da Política, considerando-a como “uma das mais altas expressões da caridade cristã”. Conceito expresso por Pio XI, retomado por Paulo VI e, recentemente, pelo Papa Francisco (Fratelli tutti, FT, 180). 

A Igreja tem a Política como busca permanente do bem comum. O Catecismo esclarece (CIC 1924) o bem comum abrange “o conjunto das condições sociais que permitem aos grupos e às pessoas atingir a sua perfeição, do modo mais pleno e fácil”. A exortação Christifidelis laici afirma que, mesmo com a ‘‘opinião muito difusa de que a política é um lugar de necessário perigo moral, não justificam minimamente nem o ceticismo nem o absenteísmo (ausência) dos cristãos pela coisa pública” (CL, 42). 

O Compêndio da Doutrina Social da Igreja (CDSI 189ss) lembra que a participação é considerada um elemento fundamental para a construção do bem comum. Mesmo sem essa orientação, o bom senso e a lógica indicam a necessidade da participação política – conscientização e voto, como exercício indispensável da cidadania. 

Destacamos propositadamente o direito fundamental de participação popular direta (PPD), eis que a forma indireta exercida pelo voto é bem conhecida e evocada em toda a propaganda político-eleitoreira. 

A participação popular direta é direito constitucional. Existem, conforme o Art. 14 da Constituição federal (CF/88), o plebiscito (convocado antes da criação de um ato legislativo), o referendo (convocado posteriormente ao ato) e iniciativa popular. Para um “projeto de lei de iniciativa popular” tramitar na Câmara dos Deputados, deve ser “subscrito por, no mínimo, 1% do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco Estados, com não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles” (CF/88, Art. 61 § 2o). A “iniciativa popular” é pouco divulgada, apesar de termos muitas organizações, associações, sindicatos, profissões religiosas e outros segmentos da sociedade civil com enorme capilaridade, nos vários estados da Federação, que poderiam facilitar a coleta de assinaturas. O processo poderia, inclusive, se tornar mais ágil, utilizando-se da tecnologia da informação tão presente em nossa vida.

É certo que se debruçássemos todos sobre uma proposta, numa plena comunhão, elaboraríamos um dispositivo legal, capaz de promover uma mudança social no sentido de fazer prevalecer os reais interesses do bem comum. 

Pensemos comunitariamente sobre essa participação: quem sabe, possamos evitar a enorme dependência dos agentes políticos. 

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