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A santidade no mundo: vocação universal e testemunho de vida

A santidade constitui a vocação fundamental de todo cristão. O Concílio Vaticano II, na constituição Lumen gentium (LG), afirma: “Todos na Igreja, quer pertençam à hierarquia, quer sejam dirigidos por ela, são chamados à santidade” (LG, n.39). Tal afirmação rompe com a visão elitista da santidade como privilégio de poucos, evidenciando-a como dimensão constitutiva da vida cristã. 

No contexto contemporâneo, marcado por secularização, avanços tecnológicos e crise de valores, a santidade permanece não apenas atual, mas urgente. Ela se apresenta como caminho de humanização e plenitude, um testemunho profético diante de uma cultura que frequentemente reduz a vida ao consumo e à superficialidade. 

A Sagrada Escritura estabelece a santidade como horizonte da existência humana: “Sede santos, porque eu, o Senhor vosso Deus, sou santo” (cf. Lv 19,2). No Novo Testamento, Jesus sintetiza este chamado: “Sede perfeitos como vosso Pai celeste é perfeito” (cf. Mt 5,48). A perfeição, no entanto, não consiste em impecabilidade, mas na maturidade do amor, que encontra sua plenitude no mandamento maior: amar a Deus e ao próximo (cf. Mt 22,37-39). O apóstolo Paulo reafirma esse chamado, lembrando que fomos escolhidos “para sermos santos e irrepreensíveis diante dele, no amor” (cf. Ef 1,4). Assim, a santidade não é um acessório da fé, mas sua expressão mais autêntica. 

São João Paulo II ressaltou a centralidade da santidade como “programa pastoral” da Igreja no início do novo milênio, declarando: “Toda a vida da comunidade eclesial e de cada cristão deve convergir para este objetivo: a santidade” (cf. Novo Millennio Ineunte, NMI, n.30). Bento XVI, por sua vez, destacou que a santidade não é fruto de esforços morais, mas consequência do encontro com Cristo, que transforma a vida daqueles que creem (Homilia na Canonização de Frei Galvão, 11 de maio de 2007). O Papa Francisco, na exortação apostólica Gaudete et Exsultate (2018), atualiza esta perspectiva, sublinhando que a santidade se vive no cotidiano: “Gosto de ver a santidade no povo paciente de Deus: nos pais que criam com tanto amor os filhos, nos homens e mulheres que trabalham para trazer o pão para casa, nos doentes, nas religiosas idosas que continuam a sorrir” (cf. GE, n.7). Essa ênfase recorda que a santidade não se limita a feitos extraordinários, mas floresce na simplicidade do amor vivido. 

A Igreja, em sua história recente, apresenta modelos de santidade que dialogam profundamente com os desafios atuais. Entre eles, o mais novo declarado santo, São Carlo Acutis (1991–2006) que se destaca como expressão da juventude cristã inserida no mundo digital. Apaixonado pela Eucaristia, Carlo utilizou a informática como instrumento de evangelização, elaborando uma exposição sobre milagres eucarísticos acessível pela internet. Sua célebre afirmação, “A Eucaristia é a minha estrada para o céu”, sintetiza uma espiritualidade profundamente cristocêntrica, capaz de inspirar as novas gerações. Outros exemplos incluem Santa Teresa de Calcutá, cuja vida mostrou a santidade na radicalidade do serviço aos pobres, e São João Paulo II, cuja fidelidade no sofrimento expressou a santidade como oferta total de si. Esses testemunhos confirmam que a santidade não pertence ao passado, mas se atualiza em cada tempo e lugar. 

Portanto, santidade no mundo contemporâneo não é uma utopia, mas uma vocação concreta e realizável. Trata-se de viver em Cristo e deixar-se transformar pela graça, sendo sal e luz (cf. Mt 5,13- 14) em meio a uma sociedade sedenta de sentido. Inspirados pela Escritura, pelo Magistério e pelos santos de nosso tempo, os cristãos são chamados a tornar-se sinais vivos do amor de Deus no hoje da história. 

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