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Aprender, com Maria, a viver a esperança 

Existem dimensões da vida cristã que, embora não sejam formalmente apresentadas como “mistérios da fé”, permanecem de alguma forma sempre misteriosas para nós. Remetem a experiências humanas tão profundas que, mesmo depois de as termos feito, levam-nos a nos perguntarmos, fascinados: Como isso foi possível? Que maravilha é esta que estou contemplando? A misericórdia de Deus e o testemunho dos mártires são exemplos clássicos dessas situações. 

A esperança cristã também nos causa essa sensação. Ela não é a expectativa de que as coisas darão sempre certo. Pelo contrário, quantas vezes nós, cristãos, como qualquer outro ser humano, temos de experimentar o sofrimento e a frustração! Tampouco é uma ilusão escapista. Aqueles que a vivem na realidade mergulham ainda mais fundo na dor e nas dificuldades, procurando experimentá-las plenamente e transformá-las. Não pode ser reduzida à promessa da vida eterna. Sem dúvida, a esperança cristã só se realizará plenamente na vida eterna, mas, como escreveu Bento XVI na Spe salvi, sua encíclica sobre a esperança, a fé nos dá “já, agora, algo da realidade esperada, e esta realidade presente constitui para nós uma ‘prova’ das coisas que ainda não se veem” (SS 7). 

Neste ano do Jubileu da Esperança, como entendê-la? Duas comparações talvez nos ajudem. O casal que se esposa sabe que o casamento não resolverá todos os seus problemas. Continuarão com todos os desafios cotidianos que tinham antes de casar-se, pode acontecer de terem até mais alguns! Sua alegria não vem de um otimismo ilusório, mas da companhia que cada um será para o outro a partir de agora. As mães também sabem que geraram filhos para o mundo e não para elas mesmas, mas são muito mais felizes por causa daqueles que lhes dão tanto trabalho e tantas preocupações. Para nós, cristãos, a esperança é a companhia de Cristo, que não afasta as provações, mas nos faz viver tanto as alegrias quanto as tristezas de um modo totalmente diferente e mais belo, porque é inundado pelo Seu amor. 

Na Bula Spes non confundit (SNC), de convocação para este Jubileu, o Papa Francisco nos alerta: “A esperança encontra, na Mãe de Deus, a sua testemunha mais elevada. Nela, vemos como a esperança não seja um efêmero otimismo, mas dom de graça no realismo da vida” (SNC 24). Olhar para Nossa Senhora nos ajuda a mergulhar mais neste mistério da esperança cristã. 

Para maio último, mês tradicionalmente consagrado a Maria, o Caderno Fé e Cultura do O SÃO PAULO estaria consagrado à reflexão sobre a relação entre a Mãe de Deus e a esperança… Mas Deus quis diferente… Com a morte do Papa Francisco, dedicamos nossos Cadernos a ele e sua herança para nós. O tema da esperança e sua relação com Nossa Senhora teve de esperar – ainda que fosse um tema tipicamente “bergogliano”. Voltamos a ele neste mês de julho, com um artigo do Padre Alexandre Awi, um especialista na mariologia do Papa Francisco. Mas, agora, Deus nos presenteou com um novo dom: o Papa Leão XIV. Assim, o Caderno deste mês, além de refletir sobre o testemunho de Maria, tal qual apresentado na Spes non confundit, traz algumas das primeiras reflexões do novo Papa sobre estes dois temas: a esperança e Nossa Senhora. 

A tristeza pela morte de um papa vem seguida pela alegria diante da eleição de outro. Nessa passagem, parte do natural “ciclo da vida”, a fé enxerga o renovar-se da esperança. Deus não deixa de caminhar com seu povo. As gerações se sucedem, continuamos, muitas vezes, como diria São Paulo, não fazendo o bem que queremos, e sim o mal que não queremos (cf. Rm 7,19), mas Deus continua conosco. Por isso, ainda seguindo as lições do Papa Francisco, na expectativa da vida eterna, caminhemos cantando juntos, que as nossas lutas e preocupações não nos tirem a alegria da esperança (cf. Laudato si’, LS 244). 

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