Entre 15 e 22 de junho, o Serviço Pastoral dos Migrantes celebra seus 40 anos de existência, durante a Semana do Migrante, que tem por tema “Migração e Esperança”. A data e o contexto mundial nos convidam a uma reflexão…
Ser estrangeiro nunca foi fácil. Não é à toa que, no Antigo Testamento, os judeus são instados a tratarem o estrangeiro como um “natural da terra” (Lv 19,33-34) e Jesus mesmo diz de si: “era estrangeiro e me hospedaste” (Mt 25,35-36). Em 1989, quando a crise migratória atual ainda estava se desenhando, São João Paulo II foi categórico: “As migrações oferecem às Igrejas particulares a oportunidade de verificar a própria ‘catolicidade’, que consiste não só em acolher as diversas etnias, mas, sobretudo, em fazer comunhão com elas […] Por conseguinte, cada Igreja particular deve sentir-se empenhada em cultivar a pedagogia do acolhimento e em exercer a solidariedade para com os migrantes”. Esta solidariedade, para o cristão, transcende uma questão de direitos, leis ou pactos internacionais, faz parte da sua identidade, da sua “catolicidade”, sublinhava o Pontífice.
No contexto de uma crise mundial de migrantes e refugiados, quando a multidão de deslocados parece para muitos uma ameaça aos próprios direitos e à própria identidade, esse compromisso é ainda mais urgente. Na Caritas in veritate (CV), escrita em meio à grande crise financeira internacional de 2008, Bento XVI escreveu: “A caridade supera a justiça, porque amar é dar, oferecer ao outro do que é ‘meu’ […] A caridade supera a justiça e completa-a com a lógica do dom e do perdão. A ‘cidade do homem’ não se move apenas por relações feitas de direitos e de deveres, mas antes e sobretudo por relações de gratuidade, misericórdia e comunhão” (CV 6). Esta encíclica, diga-se de passagem, foi escrita a partir da intuição de que a solidariedade é a melhor resposta para qualquer situação de crise.
A primeira resposta solidária para uma crise migratória é o apoio internacional às regiões de onde partem os deslocados. Melhor que não precisem sair de sua terra para encontrar condições de vida adequadas. O “desenvolvimento humano integral” é a melhor resposta para o drama das migrações. Além disso, os investimentos feitos nas regiões mais pobres, se bem planejados, podem trazer ganhos também para quem investe – um ganho para todos! Mas, infelizmente, essa alternativa ideal nem sempre é possível…
Em nosso coração, contraditório como tudo o mais no ser humano, sentimos empatia com os que sofrem, mas também queremos nos proteger diante dos diferentes. Assim, a acolhida aos deslocados sempre será polêmica e conflitiva em uma sociedade. Tanto a resposta solidária, porém mal planejada, quanto a hostil, desrespeitosa da pessoa humana, levam a dificuldades sociais que podem chegar ao caos institucional, como temos em algumas situações.
Uma sociedade que não trata com respeito nem busca garantir a dignidade do seu povo terá muita dificuldade em acolher o estrangeiro. Para as elites, o migrante não parece uma ameaça; mas a percepção pode ser muito diferente para aqueles que se sentem excluídos, necessitados e desrespeitados em sua dignidade. Uma acolhida tranquila aos migrantes supõe uma sociedade solidária com seus pobres e capaz de criar programas eficientes de integração daqueles que chegam.
Mas tudo isso pressupõe um espírito de solidariedade que permeie a sociedade. Seremos capazes de ser como a viúva de Sarepta, que dividiu sua pobreza com Elias, e, por isso, foi cumulada de bênçãos por Deus, não tendo passado necessidade? (cf. 1 Rs 17,9-16).