Desta vez, recomendaremos dois clássicos do cinema que abordam diretamente a religião.
O primeiro é o filme São Vicente de Paulo – “O Capelão das Galeras”, vencedor do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 1947. O filme retrata vários momentos da extraordinária vida de São Vicente.
De família pobre e profundamente católica, Vicente, desde cedo, destacou-se por sua inteligência e fervor. Nascido em 1581 e morto em 1660, viveu por um breve período como escravo no norte da África, foi escolhido Capelão Geral e Real da França e fundou ou orientou a fundação de inúmeras obras pias e caridosas. Foi, enfim, uma das grandes figuras da Reforma Católica na França.
O filme começa com uma cena que parece ter sido feita para nós, que vivemos com a atual pandemia. São Vicente, jovem sacerdote, chega a um vilarejo no qual todos estão trancados em casa, por conta de uma peste. Ele, que caminha pelas ruas e bate às portas, é recebido com pedras lançadas das janelas das casas. A um certo ponto, entra na casa do senhor do vilarejo, para o qual o isolamento não parece ser um grande problema: com vários convidados, dentro da casa, estão em meio a uma festa cheia de exageros.
A reação de Vicente nos faz refletir, porque oferece um exemplo de pessoa que raciocina à luz de sua fé, sem ceder a temores exagerados. Oferece também o exemplo de um corajoso pastor.
Há outros motivos pelos quais vale a pena assistir esse filme. Embora sejam poucas as referências à sua vida de oração, a paz interior – bem representada por Pierre Fresnay, ator que faz o papel do Santo, e pelo qual foi premiado – de Vicente deixa clara a presença da fé sobrenatural, dom da graça divina. Também a caridade fica bem representada. Em um diálogo no final do filme, Vicente, prestes a morrer, diz que fez pouco. Quando lhe perguntam o que mais desejaria ter feito, dá uma resposta que expressa muito bem o espírito daqueles que ardem na caridade: “mais”, diz ele.
Enfim, vale a pena assistir!
O segundo filme é “Don Camillo”, no Brasil traduzido por “O Pequeno Mundo de don Camilo”. Esse filme, de 1952, baseado no romance italiano de Giovannino Guareschi, foi um grande sucesso e teve outros capítulos – logo no ano seguinte, por exemplo, O Retorno de don Camilo.
O filme mostra, com humor, as brigas entre os dois personagens principais, dom Camillo, sacerdote reto e de personalidade bastante forte, e Peppone, prefeito do pequeno vilarejo em que moram e chefe da seção local do Partido Comunista Italiano. Embora no fundo tenham grande estima um pelo outro, ambos vivem se chocando.
As disputas entre os dois são bastante caricatas, mas não tão exageradas quanto alguém poderia pensar. A Itália do pós-guerra encontrou-se, de fato, em uma dura situação: por um lado, suas raízes tão profundamente católicas não permitiam conceber a identidade italiana sem o Cristianismo e a Igreja; por outro, possuía um dos partidos comunistas mais fortes da Europa, que por pouco não tomou o poder em 1948. Naquela ocasião, o então Papa Pio XII convocou energicamente os cristãos a se oporem nas urnas à coligação entre socialistas e comunistas. Provavelmente graças a essa intervenção, eles foram derrotados pela Democracia Cristã.
É verdade que o comunismo italiano trouxe consequências desastrosas para o país. Além de tantos assassinatos, inclusive de sacerdotes, e perseguições, teve seu papel na forte secularização que hoje assola a Itália. A presença do comunismo, porém, não deixou de criar situações um tanto divertidas. Ainda hoje, encontra-se algum caso do tipo: um seminarista cujo pai era membro do extinto Partido Comunista Italiano, mas que, como todas as crianças, frequentara com sua mãe as aulas de catecismo na paróquia do vilarejo e, desse modo, conheceu a fé; ou então, comunistas que criticam a Igreja e a religião e, ainda assim, batizam seus filhos, pois, até pouco tempo atrás, era quase inconcebível que uma criança italiana não fosse batizada.
Uma das coisas que se pode ressaltar no filme é a simplicidade com a qual dom Camilo fala com Jesus no crucifixo de sua paróquia. Há ali algumas lições para tirar sobre a oração: não esconder nada de Cristo, buscar um relacionamento pessoal com Ele, contar as próprias questões com confiança – como uma criança a seu pai –, jamais sequer considerar que possa desistir de nós. Enfim, embora seja destinado principalmente à diversão, é um filme do qual se podem tirar algumas lições – só pelo humor, porém, já valeria a pena. Além disso, nos mostra um pouco da Itália.
Bom proveito!