Fé e razão não são incompatíveis

Não é de surpreender que o mundo conduzido pelo inimigo de Deus esteja repleto de pecado, sofrimento e mentira. Sabemos que em tudo ele imita Nosso Senhor, objetivando que o gênero humano se afaste cada vez mais de Deus, e se ajoelhe diante dele em adoração.

Para isso, suas mentiras precisam ser espalhadas aos sete ventos, repetidas milhares de vezes, até que aqueles, já um tanto ao largo da Graça, acabem por ser encantados pelo canto dessa serpente, que enganou nossos primeiros pais.

A máquina de espalhar suas mentiras está em potência máxima e nós a conhecemos: suas engrenagens são as propagandas, as novelas, os telejornais, os famosos. Seus recursos são infinitos e seu alcance, assustador.

Assim, mesmo aqueles que batalham no árduo caminho da santidade, objetivando a porta estreita que parece que nunca seremos capazes de passar, acabam sendo enganados. Tomamos algo como verdade porque nunca nos debruçamos sobre o tema armados do conhecimento de nossa fé.

Uma dessas “verdades”, repetida há centenas de anos, diz que “fé e razão são incompatíveis”. 

A frase usa variações como: “razão”, “ciência” ou “inteligência”, mas o objetivo é sempre o mesmo: desqualificar a fé. 

Por vezes, quer-se convencer de que a fé é coisa de incultos. Outras vezes, de que a ciência moderna é capaz de provar tudo (outra mentira), justamente o que faltaria à fé: “comprovação científica”. 

Nos livros, nas artes, na música, esse mantra vem se repetindo, por vezes de forma clara, outras disfarçada. Mas será que podemos responder a isso sem usar uma “fé cega” como “faca amolada”?

Apenas ao pensar em uma resposta, já a estamos respondendo. Não é à toa que escolhi a expressão “conhecimento de nossa fé” ali atrás. Se a fé necessita do conhecimento, ela já não é cega e nem ausente de razão. Mas vamos mais adiante.

É pelo conhecimento que nos lembramos das parábolas, das lindas frases de Cristo e de seus ensinamentos. É por nossa inteligência que somos capazes de analisar nossas ações e comandar a vontade a frear o impulso da nossa concupiscência. É por nossa razão que sabemos analisar nossos próprios atos, para confessá-los. 

Mas é a partir daí que a Fé, virtude teologal, entra em ação por obra do Espírito Santo. A Graça Divina eleva nossa razão para perceber as coisas além da razão natural. É o que costumo chamar em minhas aulas de “o olhar da fé”.

Com nossa razão, lemos no Evangelho Jesus dizer: “Eu Sou Caminho, a Verdade e a Vida”. Mas é pela fé que sabemos, de forma inquestionável, que Ele é o “único Caminho”, “única Verdade” e a “única Vida”. 

Por essa mesma fé, entendemos plenamente por que Pedro respondeu a Jesus dizendo: “Senhor, a quem iremos, só tu tens palavra de vida eterna”.

É impossível ter fé sem a ajuda da razão, como é impossível amar alguém que não conheçamos. Como disse o João Paulo II em sua carta Fides et ratio: “A fé e a razão constituem como que as duas asas pelas quais o espírito humano se eleva para a contemplação da verdade”.

Há alguns anos, assistindo a um documentário sobre astronomia, vi a entrevista do chefe do “Observatório do Vaticano”, um cientista e padre jesuíta. Ele foi questionado se não vivia dentro de si uma batalha entre a sua fé de padre, contra a sua razão de cientista. Com muita sabedoria e docilidade, respondeu: “Pela fé, eu sei que Deus criou tudo. Pela ciência, eu descubro como Ele fez isso”.

Mas não paramos aí. Voltemos a Cristo e nos perguntemos: acreditamos de fato que Jesus é Deus? Ele é de fato a Verdade e a Vida, fonte de todo amor e de toda a Verdade? O próprio Amor, a própria Verdade?

Sabemos a resposta, sim, então sabemos também que o Amor não mente, e que a Verdade não pode ser contradita, pelo simples fato de ser a verdade.

Assim, não há ciência no mundo que possa contradizer Deus, não há razão no mundo que possa lhe causar desconforto. Pelo contrário, é o racionalismo hedonista, focado no prazer, que destrói a vontade do homem em elevar sua razão com o auxílio da Graça.

É por isso que muitos de nossos irmãos na fé perderam sua conexão com o transcendente, esperando que a felicidade do homem esteja nesta terra, que a salvação de Deus se consegue materialmente neste mundo. Sabemos que não.

Então, não caiamos nessa conversa mole, no canto da serpente do Éden, de que fé e razão sejam incompatíveis. Elas são complementares, segundo o ordenamento divino dado a Adão e perdido por causa do pecado original. 

Não tenhamos vergonha de nossa fé, pois a fé ilumina a razão. É ela que eleva a razão até Deus.

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