Diz o ditado que os noivos devem comer “um quilo de sal” juntos antes de se casar. É uma expressão para significar que, nas dificuldades, nós manifestamos a nossa intimidade e quem realmente somos. Debaixo do coqueiro na praia, com suco gelado e brisa no rosto, tende-se a se comportar mais de acordo com as alegrias do ambiente.
Todos têm a sua experiência de viver situações como um pneu furado na chuva, o atraso no trânsito para um compromisso importante, a regurgitação do leite do bebê no vestido quando saía para a festa, o desemprego, a notícia da filha adolescente grávida… São situações que tiram as nossas máscaras comportamentais e cutucam no fundo o que somos. Evidentemente, há de se considerar o contexto. A vida é dinâmica, e jamais uma avaliação pode ser feita baseando-se apenas em um episódio isolado. Não é, muito menos, um julgamento. Trata-se de conhecer. Interessante como as reações podem ser perfeitamente esperadas, ou seja, compatíveis com o cotidiano vivido; ou surpreendentes: “Não imaginava que você pudesse fazer isso!”
As reações obedecem a um conjunto de elementos que se fazem presentes na constituição (herança genética, gestação, temperamento); na contextualização biográfica (nascimento, família, lugar, cultura) e nas circunstâncias passageiras (como gravidez) ou permanentes (como sequelas). Estão sujeitas a fatos que ocorrem no âmbito pessoal (vestibular, novo emprego, timidez para um namoro), assim como na esfera social (crises econômicas, violência, épocas festivas). A relação de ser e conviver está presente, permanentemente, no cotidiano individual, familiar, profissional, em compromissos administrativos e de lazer. Complexo? Sim. Conhecer-se ou conhecer o outro não é julgar, mas, sim, um caminho para aqueles que desejam melhorar a si próprios ou ajudar alguém. Julgamentos imediatistas, portanto, são sempre inadequados. Repito, a atitude não deve ser de julgar, mas conhecer, compreender e, se possível, poder ajudar, quando necessário.
“Tudo isso parece ser verdade, mas viver poderia ser mais fácil, não?” O fato é que, frequentemente, nos damos conta disso quando as situações se tornam mais difíceis, ou seja, conhecemos essa complexidade pelas consequências indesejáveis. Como não se havia preparado ou educado para isso, fica-se sem saber o que fazer. Haja vista a procura por terapeutas nos últimos anos, associada ao consumo de drogas antidepressivas, ansiolíticos etc.! O que fazer, porém?
Sem desvalorizar os recursos terapêuticos, importantes e necessários em muitos casos, é possível associar uma educação desenvolvida numa percepção que permita crescer no caminho de paz e serenidade. Sem a intenção de simplificar tudo em duas linhas – impossível –, pode-se apontar uma direção. Este sentido é seguir para o bem. Para se chegar a ele, é imprescindível que acreditemos que ele exista, e possa ser alcançado. Nas atuais circunstâncias em que vivemos, poderão perguntar: “Onde está o bem?” Se optamos por um sentido, devemos procurar informações que nos levem a ele. Sem mais entrarmos no mérito da pandemia, mas apenas utilizando-a como fato circunstancial, vamos olhar para o que aconteceu e está acontecendo de bom. Sim, de bom! Não estou dizendo que a pandemia é boa, mas olhemos para as reações e atitudes de pessoas que, diante desta enorme dificuldade, conseguiram agir para o bem.
Recentemente, circulou a iniciativa de um empresário que colocou na porta de sua loja dois cartazes: “Quem tem põe” (com espaço para depósito) e “Quem não tem tira” (com algumas cestas básicas). Essa atitude resultou, em algumas horas, na distribuição de cestas básicas a milhares de pessoas carentes. Doadores generosos faziam fila e, por instantes, maior que a dos necessitados! Tudo isso em consequência de alguém que abandonou o noticiário deprimente, para agir na direção do bem. Ao término do dia, deixava um depoimento emocionado, entusiasmado de quem assistira à “multiplicação dos pães”, agradecido à bondade de Deus. Nesta última frase, encontra-se o motor para seguir no caminho: ele se colocou como um instrumento de fé, e alcançou muito mais do que esperava.
Fala-se muito das dificuldades que virão após a pandemia. Ouçamos o apóstolo: “Nós sabemos que, em Deus, tudo concorre para o bem daqueles que O amam” (Rm 8,28). Todos podem despertar a generosidade que, às vezes, está adormecida dentro de nós. O desafio vale a pena!