Direita, esquerda e o sangue dos mártires: a ideologia mata

A Doutrina Social da Igreja (DSI) é, desde seu início, um obstáculo às ideologias extremistas e forças políticas opressoras, tornando-se um incômodo aos mais diversos regimes e governos. Católicos que pregaram a DSI sofreram perseguição e até mesmo o martírio. Direita e esquerda, quando vividas de forma fechada, radical e apaixonada, levam à morte, destruição e opressão. A história prova isso, mas também os mártires são testemunhas do perigo das ideologias. 

Em El Salvador, em 1980, o então bispo São Óscar Romero, foi assassinado por criticar a ditadura militar do seu país, colocando-se ao lado dos pobres e denunciando o autoritarismo de direita que fez muitas vítimas. Três anos antes, o Beato Padre Rutílio Grande já tinha sido morto, acusado de ser comunista e crítico ao governo, como confessou um dos assassinos. 

No Vietnã, em 1975, o Cardeal Van Thuan foi preso pelo regime comunista, acusado de conspirar, junto com São Paulo VI, contra o governo autoritário do seu país. 

O próprio São Paulo VI, quando padre dos universitários, foi perseguido pelo fascismo, acusado de atividades revolucionárias e antipatrióticas, viu amigos serem mortos, como o hoje Beato e Mártir Teresio Olivelli, ícone do antifascismo, preso e torturado na Itália, em 1945. 

Em 1945, na Itália, foi cruelmente assassinado o Beato Rolando Rivi, por guerrilheiros comunistas. 

Na Guatemala, em 1981, o Beato Padre Rother foi assassinado por um grupo paramilitar que caçava comunistas; o missionário, que havia anos assistia aquele povo, teve sua casa invadida e foi morto. 

No México, em 1927, o Beato Padre Miguel Pró foi morto por militares a serviço do governo liberal, nacionalista, revolucionário, do maçom Plutarco Calles. 

Na Espanha, nos anos 1930, muitos cristãos foram perseguidos pelos comunistas, entre eles o Beato Álvaro del Portillo, preso e torturado. 

Na Hungria, em 1949, o Cardeal Mindszenty foi preso e brutalmente torturado pelo regime comunista soviético, acusado de conspirar contra o governo. Antes disso, já tinha sido preso pelo regime nazista (que por sinal era opositor do comunismo). 

Na Argentina, um bispo, dois padres e um pai de família foram beatificados (os mártires de La Rioja). Eles foram alguns dos assassinados, nos anos 1970, pela ditadura militar argentina, que perseguia “comunistas” e se dizia cristã. 

Casos como esses são inúmeros, cada país sabe quem são suas vítimas do fanatismo político. Também no Brasil, em toda a América, na Europa, África etc., muitas foram as vítimas das ideologias radicais, opostas entre si, mas iguais no autoritarismo, esperando apenas a oportunidade para atuar. 

Já há algum tempo, as ideologias políticas não usam mais armas de fogo para matar, mas continuam fazendo vítimas seus opositores, seja pela destruição da reputação, o cancelamento, as fakes news, o patrulhamento/milícias digitais, o ódio ou qualquer forma mais discreta de eliminar. 

O Papa Francisco alertou: “Exorto-vos a ter cuidado com as ideologias. As ideologias destroem porque nos fazem ver de uma só maneira e fecham a visão universal. As ideologias destroem a humanidade de uma pessoa”. “Não vos deixeis arrastar por ideologias míopes que pretendem mostrar-vos o outro, o diverso, como um inimigo. O outro é uma riqueza.” – discurso aos reitores, 16/05/2022, e aos jovens, 06/07/2022, respectivamente. 

A DSI, e eu destacaria as encíclicas do Papa Francisco, são caminho de reflexão e cura para esse mal incutido em nossa sociedade. Sem o diálogo, o olhar de que todos somos irmãos, às vezes adversários políticos, mas não inimigos, e a abertura para ouvir o diferente, não conseguiremos superar o perigo. 

Júlio César de Paula Ribeiro, psicólogo, mestrando em Ciências Sociais (UERJ), membro do movimento Comunhão Popular, colabora na página Apostolado Ratzinger – Caritas In Veritate. 

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