Na semana que passou, celebramos a memória litúrgica de São Paulo Miki e seus 25 companheiros: frades franciscanos e missionários jesuítas, mas também leigos, homens e crianças, martirizados em 5 de fevereiro de 1597 em Nagasaki, Japão. O Ofício das Leituras trazia um comovente trecho da carta escrita pelo Padre Luís Fróis (1532-1597), outro jesuíta que havia décadas vivia como missionário no Japão e foi contemporâneo do suplício, ao Padre Cláudio Aquaviva, então Superior-geral dos jesuítas e quarto sucessor de Santo Inácio de Loyola.
Quando os 26 condenados, depois de terem sido expostos à humilhação pública em uma marcha de quase mil quilômetros ao longo de todo o Japão, sofrendo flagelos e maus-tratos de toda sorte, seriam, enfim, crucificados, o clima geral entre eles era de intenso júbilo espiritual e esperança. Um deles cantava salmos de ação de graças à bondade divina, e até mesmo os três adolescentes coroinhas exultavam de alegria com a chance de dar seu sangue por Cristo, invocando os nomes de Jesus e Maria, e cantando os hinos que haviam aprendido na catequese. São Paulo Miki tomou, então, a palavra e, depois de explicar que era japonês e que estava muito grato a Deus porque ia morrer por ter anunciado o Evangelho, deu este inesquecível testemunho: “Agora que cheguei a este momento de minha vida, nenhum de vós duvidará de que eu queira esconder a verdade. Declaro-vos, portanto, que não há outro caminho para a salvação fora daquele seguido pelos cristãos. E como este caminho me ensina a perdoar os inimigos e os que me ofenderam, de todo o coração, perdoo o Imperador e os responsáveis pela minha morte, e lhes peço que recebam o batismo cristão”.
O fenômeno do martírio voluntário, do derramar o próprio sangue para ser fiel a Cristo, de que são exemplo Paulo Miki e seus companheiros, é tão distante de nossa realidade do Brasil do século XXI que podemos ficar tentados a considerar esta cena como algo inalcançável, e até mesmo pertencente a outro mundo e a outra religião… E, no entanto, a fé que animava estes mártires não era outra senão exatamente a nossa: a vida de Jesus Cristo, e a doutrina por Ele confiada à Santa Igreja!
Como podemos compreender esta dimensão de nossa fé? Se a perseguição aos cristãos chegasse hoje a este ponto, será que teríamos a disposição dos mártires? Um bom termômetro para isso é entender que os mártires cristãos não buscam ativamente o espetáculo do martírio – isso, aliás, seria uma temeridade e presunção, pois é de Deus que vem a força para todas as boas obras, e não de nossa determinação e força de vontade. Pelo contrário, o martírio é apenas a culminação de uma vida cristã bem vivida, na fidelidade aos deveres e fadigas ordinários de todo cristão.