Vida Consagrada

No mês de agosto, é costume da Igreja no Brasil rezar por cada um dos estados de vida que constituem vocações específicas dentro da Igreja – e, assim, se na semana passada refletíamos sobre o sentido do sacerdócio, hoje gostaríamos de meditar sobre a vocação à vida consagrada e sua íntima ligação com a vida matrimonial.

Dizíamos, da última vez, que o sacerdócio é hoje frequentemente mal-entendido, como se se tratasse de uma “segunda opção” para quem não tem aptidão para se casar e se desenvolver no mundo laical. Também sobre o significado do celibato consagrado dentro da Igreja é preciso corrigir uma visão equivocada, que às vezes ainda se insinua: a de que a verdadeira “pureza” ou “santidade” estaria apenas na vida consagrada, e de que o Matrimônio seria apenas um “remédio para os fracos”.

Nada disso! Quando convida seus filhos e filhas a consagrarem sua virgindade a Deus, a Igreja de modo algum está negando valor à união conjugal entre um homem e uma mulher. Aliás, é o contrário: pois, se o Matrimônio fosse tido como ruim, então a vida consagrada seria apenas “menos pior” – mas, sendo a vida matrimonial uma realidade boa, santa e querida por Deus, a renúncia a este tesouro em favor da vida consagrada se compreende como “trocar o bom pelo ótimo”.

Na verdade, para um cristão, Matrimônio e vida consagrada são duas formas diferentes de viver a mesma centralidade de Cristo. O Matrimônio, com a união do marido e da mulher que se doam inteiramente um ao outro, é um símbolo para o amor e a aliança de Deus com a Igreja.

A vida consagrada, por sua vez, é um sinal de que só Deus é capaz de saciar os anseios mais profundos de nosso coração – só Ele é a pérola preciosa que é preferida a qualquer outro valor (cf. Familiaris consortio, n. 16). Ao mesmo tempo, o celibato coloca diante de nossos olhos que o Matrimônio é uma realidade provisória, pois no Céu ninguém se casa nem se dá em casamento (Mt 22,30).

Quando propõe a jovens rapazes e moças a vida consagrada, a Igreja Católica está simplesmente repetindo o convite feito pelo próprio Cristo, que falava dos eunucos que nasceram assim do seio materno, dos que foram feitos eunucos pelos homens, e dos que se fazem a si mesmos eunucos por amor do Reino dos Céus (Mt 19,12).

Ser “eunuco” por amor do Reino dos Céus, no entanto, não significa ser estéril: o celibato cristão, se bem vivido, é sempre fecundíssimo. Seja ele padre ou freira, o celibatário é pai e mãe de muitos filhos espirituais – tendo seu coração e tempo mais livres de vínculos pessoais íntimos, ele tem condições de fazer uma entrega maior de si aos irmãos, de gastar-se pelas almas até o fim, como uma vela que queima e se derrete até esgotar o pavio.

Um exemplo comovente e recente de vida consagrada bem vivida é o da Irmã Clare Crockett, jovem irlandesa que tinha à sua frente uma brilhante carreira na indústria cinematográfica, e no início dos anos 2000, com pouco mais de 20 anos de idade, passou por uma profunda experiência de conversão, e entendeu o amor imenso que Jesus lhe tinha, e o chamado que lhe fazia de um seguimento radical na pobreza, castidade e obediência.

Depois de alguma hesitação ante a renúncia, mas apoiada no testemunho de alegria de outras freiras e na amizade íntima com Deus que vinha da oração, Clare decidiu fazer-se freira, e pelo resto de sua breve vida espalhou a alegria profunda do Evangelho a crianças, adultos e idosos nos vários países em que exerceu seu apostolado. Em 2016, aos 33 anos, faleceu subitamente num terremoto, no Equador, em odor de santidade. Sua vida está muito bem contada no documentário Tudo ou Nada, disponível gratuitamente na internet – e assistir a ele pode ser uma boa forma de fomentar em nós todos o amor à vida consagrada.

Rezemos por nossos jovens que pensam em entregar-se radicalmente a Deus na vida consagrada: que ouçam o chamado e tenham a coragem de dizer seu Fiat!

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