‘Ele me amou e Se entregou por mim’

Chegamos mais uma vez à Semana Santa, ao momento central em torno do qual orbita a liturgia do ano inteiro. Precisamos aproveitar esta ocasião tão especial para nos abrir às graças abundantes que Deus quer nos conceder – mas como fazê-lo?

A primeira coisa é entendermos que a Semana Santa é muito mais que a mera recordação de eventos históricos passados – como as encenações das grandes batalhas medievais ou napoleônicas, que promovem as associações de entusiastas pela história bélica…

Não! O Mistério Pascal de Nosso Senhor não é um acontecimento que ficou no passado, alheio às nossas vidas. É que, embora seja um acontecimento real, ocorrido na nossa história há dois milênios, ele é diferente de todos os outros eventos do universo: enquanto os demais acontecem uma vez e passam, devorados pelo passado, o acontecimento da cruz e da Ressurreição permanece e atrai tudo para a vida, e não passa jamais (Catecismo da Igreja Católica, CIC 1085).

O Mistério da Páscoa é o centro da história da humanidade e, portanto, do universo inteiro. A Bíblia nos fala de três grandes momentos de completude: no início da criação, quando Deus concluiu toda a obra que fizera (Gn 2,2); e no fim dos tempos, quando Aquele que está sentado no trono dirá com grande voz: “Está feito! Eu sou o Alfa e o Ômega, o Princípio e o Fim” (Ap 21, 5-6). Entre a consumação da Criação e a consumação do Juízo Final, Cristo proclama, do alto da Cruz, a consumação da Redenção: sua vida e morte nos abrem as portas do Céu, e dão o sentido de toda a história do universo.

Além de entendermos que o Mistério da Páscoa é diferente de tudo o que veio antes e do que veio depois, a outra coisa que precisamos compreender para viver bem esta Semana Santa é que cada um de nós estava presente naqueles acontecimentos, na inteligência e no coração de Jesus.

Pensemos bem: São Paulo, quando fala da Paixão, diz que Jesus “me amou e se entregou por mim” (Gl 2,20). Ora, mas quando Cristo sofria a Paixão, Paulo ainda nem sabia quem era Jesus! De fato, somente muito depois, quando Cristo já havia ascendido aos Céus e os cristãos começavam a se multiplicar, é que Paulo teve a famosa visão de Jesus, a quem ainda perguntou, “Quem és, Senhor?”.

Sim, porque Nosso Senhor não era apenas perfeito homem, mas também perfeito Deus: e assim sua inteligência
humana, pela sua união com a Sabedoria divina na pessoa do Verbo Encarnado, conhecia e manifestava em si tudo o que próprio de Deus (cf. CIC 473-474) – ou seja, a cada momento de sua vida terrestre e de sua Paixão, Nosso Bom Jesus pensava em cada um de nós, conhecia-nos intimamente, oferecia suas dores por mim e por você… Eu te redimi e te chamei pelo nome, tu és meu! (Is 43,1). Eu e você, portanto, de alguma forma, estávamos presentes na Paixão.

Para vivermos bem esta Semana Santa, portanto, peçamos a Deus a graça de nos enxergarmos como participantes da Paixão. Uma dica bastante concreta é rezarmos, com muito recolhimento e espírito de oração, alguma das tantas Vias-Sacras que os santos nos deixaram – por exemplo, o texto de Santo Afonso de Ligório. Enquanto lemos e rezamos, nos esforcemos para visualizar as chagas, os açoites, a aceitação amorosa… e cantemos, como na sequência de Nossa Senhora das Dores: Que do Cristo eu traga a Morte, que da Paixão seja consorte!

Outra sugestão espiritual muito rica é lermos as meditações da Beata Anna Catarina Emmerich, sobre a Vida e Paixão do Cordeiro de Deus. Vivamos, então, com todo o coração, esta Semana Santa, tornemo-nos participantes da Paixão e Morte do Cristo, para junto com Ele ressuscitarmos na Páscoa!

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