No dia 13 de maio passado, transcorreu o 15º aniversário da V Conferência Geral do Episcopado da América Latina e do Caribe, celebrada em Aparecida, junto do Santuário Nacional, de 13 a 31 de maio de 2007. Com o tema “Discípulos e missionários de Jesus Cristo para que, nele, nossos povos tenham vida”, a Conferência produziu o “Documento de Aparecida”, com avaliações e diretrizes pastorais de grande importância para a vida e a missão da Igreja na América Latina e no Caribe.
Entre as reflexões feitas neste aniversário, surgiu com frequência a pergunta: até que ponto o “Documento de Aparecida” ainda continua atual e adequado para responder aos desafios que a Igreja enfrenta atualmente neste subcontinente? A pergunta faz sentido, uma vez que a história e a vida da Igreja são dinâmicas. Foi também isso que o Papa Francisco pediu à Igreja na América Latina e no Caribe: avaliar, até que ponto o “Documento de Aparecida” produziu frutos, verificar eventuais lacunas na aplicação das suas diretrizes e ver quais novos desafios à vida e missão da Igreja surgiram nesta parte do mundo depois de 2007.
A Conferência de Aparecida e o seu Documento estavam situados no contexto de grandes constatações e preocupações prévias à realização da Conferência: os efeitos da globalização sobre a vida dos nossos povos, as profundas mudanças culturais que a virada do milênio trouxe consigo (“mudança de época”), a situação da Igreja na América Latina e no Caribe, também em rápida transformação, a perda de relevância da Igreja na vida social, cultural e política dos nossos povos, as transformações religiosas, com o crescimento dos grupos neopentecostais e dos “sem religião”, a persistente pobreza e a exclusão social no Continente mais católico do mundo, entre outros.
A V Conferência procurou olhar para essa realidade “com um olhar de discípulos-missionários de Jesus Cristo” e encontrar respostas para os muitos questionamentos postos. Mas antes de responder de maneira programática, com ações, a Conferência, orientada pelo discurso inicial do Papa Bento XVI, confrontou-se com a motivação mais profunda que a anima em sua ação.
A primeira resposta foi: “partir novamente de Jesus Cristo”. Nessa res- posta está incluída a identidade da Igreja e como se faz parte dela. Qual é sua missão? E também: quem somos nós, enquanto cristãos? Como se chega a ser cristão? O que nos anima, enquanto cristãos?
Sem responder a isso, todo programa de renovação da Igreja poderia carecer de consistência e motivação. A Igreja, de fato, não surge de uma doutrina, por mais bela que seja, nem de um grande ideal ético, por mais importante que esse seja, nem de um pacto social. Ela surge de Jesus Cristo, a partir dele. Jesus não é uma ideia ou doutrina, mas uma pessoa viva, o Filho de Deus que se fez homem, que nos amou de amor extremo e entregou sua vida por nós sobre a cruz.
Partir do renovado encontro com Jesus Cristo vivo, presente de tantas maneiras entre nós, leva a se confrontar com a conversão pessoal e comunitária; a ver o mundo com olhos de discípulo e missionário, de testemunha do Evangelho do amor e da vida para o mundo. O caminho da conversão “pastoral” passa por isso também e inclui a coragem de rever métodos e maneiras de fazer a evangelização e a pastoral, que de- vem ser sempre inspirados no Evangelho. Em Aparecida, fala-se da coragem de superar uma pastoral de mera conservação do que a Igreja já alcançou, para se abrir às novas realidades trazidas pela “mudança de época”, iluminando-as com a luz do Evangelho.
O “Documento de Aparecida”, portanto, não está superado porque se ocupa de questões perenes da vida dos cristãos e da Igreja. Conservam sua atualidade a evangélica opção preferencial pelos pobres e pelos jovens, o respeito profundo pela dignidade humana e a justiça social, a atenção à formação dos discípulos missionários para a superação da fé superficial e pouco esclarecida; também o cuidado do ambiente da vida conserva a sua plena atualidade, como bem destacou o Papa Francisco nos seus ensinamentos posteriores à Conferência de Aparecida. Todas essas questões não estão resolvidas e nem o serão, de uma vez por todas.
Evidentemente, nos 15 anos que se seguiram à Conferência de Aparecida, surgiram questões novas, que também necessitam de nossa atenção. Mas, se tivermos compreendido bem a proposta do “Documento de Aparecida”, não nos será difícil encontrar caminhos para enfrentar os novos desafios postos. Enquanto isso, como pede o Papa, retornemos ao “Documento de Aparecida”.