Vivemos tempos de confusão eclesiológica, com afirmações desencontradas sobre “a verdadeira Igreja” e sobre “a falsa Igreja”. Tais ideias são difundidas por diversas mídias e apregoadas por pessoas que pretendem defender e salvar a “verdadeira Igreja Católica”, fora da unidade da Igreja. E não se dão conta da grave desorientação na fé que introduzem na vida das pessoas, deixando-as fragilizadas e inseguras na sua adesão à Igreja de Cristo. Quais são as marcas próprias da Igreja Católica?
No Símbolo Niceno-Constantinopolitano de nossa fé católica, nós professamos: “Creio na Igreja, una, santa, católica e apostólica”. Essas quatro características, que definem a nossa Igreja, não podem faltar, apesar das múltiplas expressões culturais em que a Igreja se insere e se expressa. A Igreja é una, e isso significa que Jesus Cristo não fundou várias Igrejas nem quis Igrejas em luta entre si, ou contraditórias entre si. Onde se fere a unidade da Igreja e se introduzem partidos ou lutas fratricidas na Igreja, aí, certamente, há um desvio importante na atitude de quem fomenta divisões na comunidade eclesial. Humanamente, é compreensível que surjam problemas, divergências e até posições contrapostas. Mas isso deve ser superado mediante o diálogo sincero, motivado pela busca da verdade, do respeito ao próximo e, jamais, pela exacerbação das divergências por motivos de soberba ou de vaidades pessoais.
Nossa Igreja é una, antes de tudo, porque sua fonte é a Trindade Santa e sua expressão divino-humana tem origem na pessoa de nosso Salvador, Jesus Cristo; sua lei é o Evangelho, sua esperança é a realização plena das promessas de Deus. A Igreja Católica também é una, reunida em torno do mesmo e único Papa, sinal e garantia da unidade visível da Igreja na mesma fé; reunida em torno de cada bispo, unido ao Papa, e do conjunto dos bispos católicos, unidos entre si e unidos ao Papa. Como podem alguns católicos não reconhecer Francisco como verdadeiro Papa? Objetivamente, isso é falta contra a unidade na única Igreja Católica. Bento XVI foi um grande Papa, mas ele não é mais o Sumo Pontífice, desde quando renunciou. Francisco foi legitimamente eleito como seu sucessor. Colocar em dúvida isso é arrumar confusão na Igreja e “cantar fora do coro”, levado por argumentos enganadores e por especulações, baseadas em “teorias da conspiração”, sem nenhum fundamento.
A Igreja de Cristo é una e possui a mesma missão de anunciar e testemunhar ao mundo inteiro o Evangelho do Reino de Deus. Também é una pela riqueza dos dons recebidos do Espírito Santo para o bom desempenho de sua missão em todo tempo e lugar. Ela é una enquanto herdeira do testemunho dos santos do céu, que formam uma única comunhão de bens com a Igreja ainda peregrinante na terra (“creio na comunhão dos santos”). A Igreja Católica possui numerosos vínculos visíveis de comunhão e unidade, como a profissão de uma única fé, recebida dos apóstolos; a celebração comum da fé na Liturgia dos Sacramentos; a sucessão apostólica, por meio do sacramento da Ordem. São Paulo resumiu a unidade da Igreja em diversas passagens de seus escritos: “Embora sendo muitos, somos em Cristo um só corpo” (Rm 12,5); “Todos vós sois um só em Jesus Cristo” (Gl 3,28); “Há um só corpo e um só Espírito, como também há uma só esperança à qual fostes chamados. Há um só Senhor, uma só fé, um só batismo, um só Deus e Pai de todos, acima de todos, no meio de todos e em todos” (Ef 4,5-6).
As citações poderiam se multiplicar. A quem se interessar, sugiro ler o que o Catecismo da Igreja Católica diz sobre as características da Igreja, dos parágrafos 811 a 962. A unidade da Igreja pode ser seriamente ferida por motivos que nem sempre têm a ver com o conteúdo da fé, mas por razões culturais ou por uma inconfessada vaidade ou busca de poder pessoal. Lembro a observação do Cardeal Raniero Cantalamessa, pregador da Casa Pontifícia, na Sexta-feira Santa de 2021: as divisões na nossa Igreja, geralmente, não são motivadas pelo apego à fé, mas por escolhas ideológicas e partidárias. Lamentavelmente, parece que o pregador acertou em cheio. Dividimo-nos e criamos antipatias por gostarmos de líderes políticos diferentes, em vez de estarmos unidos em Jesus Cristo, acima de tudo, malgrado nossas diferenças. Ou nos dividimos porque acolhemos de maneira acrítica certas narrativas a respeito da Igreja ou de personalidades da Igreja, esquecendo-nos do dever de buscar a verdade e de não aderirmos ao primeiro que nos vem contar uma história…
Há valores na Igreja que devem estar acima das nossas diferenças, pequenas ou grandes que sejam. Nunca devemos nos esquecer de que a Igreja não é um clube de gente reunida por simpatias e atrações recíprocas, mas é a comunidade de discípulos de Jesus Cristo, reunidos por Ele e por causa Dele. No céu, não há compartimentos separados para grupos que não se dão entre si. Há uma só Igreja celeste, no mesmo e único louvor ao Criador. E isso deve começar já aqui na terra.