Doze cestos cheios

Com a cena da multiplicação dos cinco pães e dois peixes para saciar uma multidão de gente, São João dá início ao longo capítulo 6º do seu Evangelho, com a catequese sobre o Pão da vida (cf. Jo 6). Muitas pessoas famintas seguem Jesus e não se afastam Dele, querendo ouvir mais e ver os sinais que Jesus realiza, “porque viam os sinais que Ele operava a favor dos doentes” (v. 2).

Jesus se compadece e se preocupa com a fome da multidão. Bem sabia Ele o que fazer, mas coloca seu discípulo Filipe à prova com a pergunta: “Onde vamos comprar pão para que eles possam comer?” (v. 5). Jesus não fica insensível diante das necessidades corporais do povo, mesmo sabendo que este vinha ao seu encontro sobretudo por causa de suas necessidades humanas e espirituais. Um outro evangelista observa, nessa mesma cena da multidão que se dirigia a Jesus, que Ele é o “‘servo de Deus’, que tomou sobre si nossas fraquezas e sofrimentos”, do livro do profeta Isaías.

No Evangelho segundo São João, Jesus manda trazer os cinco pãezinhos de cevada e dois peixinhos que um jovem previdente tinha levado consigo para a jornada. Jesus os abençoa e os faz distribuir à grande multidão. E dá para todos se saciarem. São 5 mil homens, sem contar mulheres e crianças, conforme o evangelista. Como as mulheres eram sempre mais numerosas nessas multidões, junto com seus filhos, pode-se supor facilmente que fossem bem mais de 10 mil pessoas. Um grande milagre a partir da partilha e da solidariedade. Quando se reparte o alimento, sempre dá para todos comerem e até sobra.

Pois é justamente com as sobras que Jesus se preocupa, mandando recolher tudo, “para que nada se perca” (v. 12). O alimento é precioso, uma bênção de Deus. Não deve ser desperdiçado. Oxalá isso nunca fosse esquecido também em nossos dias! Os discípulos recolhem doze cestos cheios de sobras do precioso alimento; muito mais do que havia no início. Jesus inaugura os tempos messiânicos do “banquete abundante sobre o meu santo monte”, para o qual todos os povos são convidados, conforme a profecia de Isaías. Há muitos elementos simbólicos de grande significado neste capítulo sobre o Pão da vida. No final, vai se concluir que o pão verdadeiro para saciar a fome da humanidade é o próprio Jesus Cristo, “pão vivo que Deus Pai enviou ao mundo”, para que tenham vida todos aqueles que dele se nutrirem.

Desejo concentrar-me sobre os “doze cestos cheios de sobras”. Poderíamos pensar que Jesus, ao mandar recolher as sobras, apenas fez uma ação “ecologicamente correta”, não desperdiçando para não sobrecarregar a capacidade produtiva da terra e do mercado. Não estaria errado, mas seria muito pouco. Antes de tudo, esse pão multiplicado simboliza o “pão descido do céu para a vida do mundo” e, portanto, é precioso e não deve ser desperdiçado e calcado sob os pés. Os dons do céu não devem ser desprezados nem vilipendiados. Mas os doze cestos representam muito mais: lembram as doze tribos de Israel, chamadas a se alimentarem deste verdadeiro “Pão descido do céu”, que é o próprio Jesus. Em sentido figurado, indicam a inteira humanidade, o “novo Israel de Deus”, convidado ao banquete do reino de Deus, sem distinção de raça, etnia, cultura, língua, nação ou condição social.

Os doze cestos com as sobras são entregues aos discípulos para que continuem a distribuir o precioso alimento a todos os povos e em todos os tempos, “até que Ele venha de novo”, quando o banquete se cumprirá plenamente no reino celeste da vida eterna. Os doze cestos, portanto, representam a missão da Igreja que, sempre e em toda parte, deve seguir cumprindo a ordem de Jesus: “Dai-lhes vós mesmos de comer”.

Também hoje existem as multidões famintas de alimento para o corpo e para a alma. Enquanto discípulos e missionários de Jesus Cristo, devemos sensibilizar-nos diante das multidões cansadas e abatidas, como ovelhas sem pastor. Há fome de pão, saúde, educação, moradia, respeito e dignidade; fome de liberdade verdadeira, de esperança, de futuro, de sentido para a vida, fome de Deus. Quanta fome há no meio da multidão, com a qual devemos solidarizar-nos e partilhar generosamente os cinco pães e dois peixinhos que sobraram e continuam à disposição de quem deseja saciar-se. Temos medo de que não sejam suficientes para tanta gente? Comecemos a partilhar o que temos e, no final, haverá sempre sobras, a serem ainda partilhadas. O amor caridoso e misericordioso faz maravilhas!

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