Lemos no domingo passado, dia do Evangelho de São Marcos, no qual dois apóstolos, os irmãos Tiago e João, se aproximam de Jesus para lhe pedir alguma coisa bem combinada entre eles. Com muita familiaridade e confiança, eles pedem que Jesus lhes garanta antecipadamente os lugares de honra à esquerda e à direita do trono, quando Ele entrasse em sua glória (cf. Mc 10,35-45).
O pedido revela o que andava na cabeça desses dois irmãos: queriam ter um privilégio muito especial, que representava grande honra e poder e uma vida assegurada na companhia do futuro rei… E revela, também, como eles olhavam para Jesus e o que pensavam dele: o messias terreno, que logo venceria os inimigos e tomaria conta do trono de Davi, restabelecendo as glórias do passado, a liberdade e a segurança ao seu povo. E eles, os discípulos, seriam participantes desse “projeto de reinado”, assumindo postos de chefia no novo governo… Certamente, eles não eram os únicos que pensavam assim, quer entre os amigos de Jesus, quer entre os seus inimigos e perseguidores. No julgamento de Jesus perante Pilatos e Herodes e na sua paixão e morte essas expectativas aparecem claramente.
Diante dessa “oração” dos dois apóstolos pretenciosos, qual é a resposta de Jesus? Ele responde com compreensão e paciência: “Vocês não sabem o que estão pedindo”. E lhes pergunta, se seriam capazes de receber o batismo que Ele deverá receber e de beber do cálice que Ele deverá beber. Eles respondem que sim, mas ainda não sabem o que dizem. Jesus lhes fala do “batismo de sangue” e do “cálice amargo” da sua dor, paixão e morte. Mais tarde, eles também provarão desse cálice e desse batismo.
Os outros dez apóstolos irritam-se com os dois e mostram que também eles ainda não estão compreendendo nada. Certamente, estavam ambicionando os mesmos postos de privilégio e não lhes pareceu bem que os dois tivessem tentado isso sem eles participarem do pedido. Jesus tem mais paciência com seus apóstolos, que ainda precisam aprender muitas coisas para, depois, darem ao mundo o testemunho sobre Jesus, sua missão e sua obra. Eles o farão mediante a força do Espírito Santo, que os ajudará a compreender melhor quem é Jesus e qual é sua missão. Eles ainda têm projetos demasiado humanos, cheios de ambição e desejos de afirmação pessoal e privilégios.
Jesus, então, os adverte: se entre os grandes deste mundo acontece que alguns oprimem e tiranizam os seus súditos e buscam privilégios e poder, “entre vós, porém, não deve ser assim”. Esta firme advertência deveria ficar impressa com letras grandes em todas as páginas de nossa memória, para ser lembrada a todo instante nas nossas relações com o próximo. O cristão, em vez de buscar vantagens e privilégios a todo custo, deve estar sempre disponível para servir, a exemplo de Jesus. Também quem exerce a autoridade, qualquer que ela seja: deve ser exercida como um serviço. Do contrário, ela se torna despótica e opressiva.
Jesus não atende ao pedido de Tiago e João, seus dois queridos discípulos. O pedido não era movido por reta intenção e não era coisa boa, nem contribuía para a realização do reino de Deus. Ele próprio não está à procura das glórias deste mundo, mas está a serviço de Deus e da humanidade. E quem quiser participar da glória do seu reinado, deve colocar-se a serviço de Deus e do próximo, com sinceridade, humildade e desapego de si mesmo. Quem quiser ser grande, coloque-se ao serviço de todos. E quem quiser ser o primeiro, procure o último lugar. Jesus não veio para ser servido, mas para servir e entregar a sua vida pela salvação da humanidade.
Esta reflexão também leva a nos perguntarmos sobre o exercício da religiosidade: ela está voltada ao reconhecimento de Deus e à sua glória, ou, acima de tudo, à nossa autopromoção, talvez, à busca de privilégios e de poder? Essa pode ser uma grande tentação. Não é por nada que o primeiro de todos os mandamentos diz que devemos “amar a Deus de todo coração, com todo o entendimento e com todas as forças”. Não cabe entregar a Deus apenas um cantinho do nosso coração e da nossa vida, reservando sempre o espaço maior para a afirmação dos nossos desejos, caprichos e vaidades.
Jesus mostrou, na parábola dos dois homens que foram ao templo para rezar, que Deus detesta a oração do soberbo e pretencioso. Mas atende a oração dos humildes e sinceramente contritos. No trecho do Evangelho, sobre o qual refletimos, Jesus convida à purificação das intenções, desejos e atitudes quando nos dirigimos a Deus em oração. Nossa oração é sempre, ao mesmo tempo, um exercício de conversão sincera e de humildade.