Para onde se orienta nossa vida e a existência do mundo? Para o nada? O caos? O eterno retorno? Filósofos, sábios e fundadores de religiões ocuparam-se com essas questões, tentando encontrar respostas. Alguns não conseguiram ir além dos próprios limites e do horizonte da imanência, concluindo pelo não sentido da vida. Mas muitos outros apontam para um sentido superior, que transcende os limites da existência presente.
Para os cristãos, a resposta é luminosa a partir do núcleo central da fé em Deus Criador e Salvador. O mundo criado, do qual também o homem faz parte, não é autoexplicável nem fechado sobre si mesmo. Deus deu origem a tudo em vista da manifestação de sua glória e imprimiu um sentido a todos os seres. Ao ser humano, especialmente, concedeu uma orientação que transcende a sua existência neste mundo, dando-lhe um desígnio eterno. No coração humano, existe a capacidade de reconhecer Deus e de ser colaborador na obra de Deus, nele há uma espécie de bússola, que o orienta para o porto derradeiro de sentido e felicidade.
Nessa linha de reflexão, compreendemos melhor o significado da solenidade de Cristo Rei, que a Igreja celebra no último domingo do ano litúrgico. A festa celebra a esperança cristã. Do evangelho de Jesus, aprendemos que a meta final da existência humana é a participação plena no reino de Deus, que já se manifesta neste mundo, mas ainda não plenamente. O salmista foi capaz de perceber que a glória de Deus resplandece em toda a criação, ao exclamar: “Ó Senhor, como é grande o vosso nome em todo o universo!” (Sl 8,2). Percebem-no os músicos, poetas e demais artistas, quando tentam traduzir em suas obras algo da infinita beleza e harmonia da criação; também os cientistas, quando conseguem decifrar as leis da natureza e a realidade imensamente esplêndida e complexa dos seres deste mundo.
No entanto, a meta da existência humana não se reduz a conhecer, admirar, narrar e cantar os mistérios do céu e da terra, nem em possuí-los e, de alguma forma, dominá-los. Essa pode ser a pretensão de muitos. E foi essa a grande tentação de Adão e Eva no paraíso, quando se deixaram levar pela tentação de “serem como Deus” (cf. Gn 3,5). O homem não é o dono do mundo, mas seu hóspede transitório e zelador responsável.
A grande realidade, na qual nós e o mundo já estamos mergulhados, é o reino de Deus, e Jesus ensinou que ele já está presente neste mundo, como os sabores e o clima de festa já estão presentes no aperitivo que precede o banquete. Há quem se contente com o aperitivo, mas é bom saber que Deus nos chama ao banquete. Nossa vida, orientada por uma infinidade de sinais da benevolência de Deus, está orientada para o banquete da vida eterna e a plenitude do reino de Deus, “quando o veremos como Ele é” (cf. 1Jo 3,2). No Apocalipse, o livro da profecia sobre os acontecimentos derradeiros da história, Deus diz: “Eis que estou à porta e bato; se alguém ouvir a minha voz e abrir a porta, eu entrarei na sua casa e tomaremos a refeição, eu com ele e ele comigo” (Ap 3,20). A companhia de Deus e de Jesus glorificado, para sempre, será o grande banquete, para o qual nos encaminhamos.
Nada nesta vida é insignificante, na perspectiva da fé e da esperança. De muitas maneiras, no peregrinar desta vida, já podemos perceber os sinais do reino de Deus. A meta do peregrinar, porém, é o encontro com Cristo Rei e Senhor do mundo. Ele atrai todos a si mediante as infindáveis ações do Espírito Santo, “até que Cristo seja tudo em todos”. Somos “peregrinos de esperança”, de uma esperança “que não desilude”. Trata-se da esperança do reino de Deus em sua plenitude: “Reino eterno e universal; reino da verdade e da vida, reino da santidade e da graça, reino da justiça, do amor e da paz” (prefácio litúrgico da festa).
Nosso coração tem saudades. Por isso, Jesus ensinou a pedir: “Venha o teu reino, Senhor!” (cf. Mt 6,10). O reino de Deus é o máximo bem para a nossa existência. Deixemo-nos guiar por essa saudade de infinito, de beleza, de vida, de eternidade.
Primoroso artigo e meditação, Sr. Cardeal! Cristo reine em nossa existência e nos dê o Seu reino, Seu coração!