A Igreja e o dom do serviço aos doentes

Em 11 de fevereiro, a Igreja celebra o Dia Mundial do Doente, instituído por São João Paulo II em 1992. Nesse dia, o calendário litúrgico católico faz memória de Nossa Senhora de Lourdes. Esta data marca o início das aparições da Imaculada Conceição numa gruta na localidade de Lourdes, na França, em 1858, a uma adolescente daquelas paragens chamada Bernadette Soubirous. 

As aparições de Lourdes estão relacionadas ao dom de curar enfermidades, pois, no dia 25 de fevereiro daquele ano, a testemunha das aparições, em atenção ao pedido daquela Senhora, cavou no chão da gruta e viu surgir uma nascente, cuja água curou várias pessoas. A Igreja reconheceu em 1860 a autenticidade das aparições, e o local passou a receber peregrinos de todo o mundo.

Desde a instituição do Dia Mundial dos Doentes, os pontífices costumam enviar uma mensagem exortando a Igreja ao serviço dos enfermos. Neste ano, o Papa Francisco escolheu como lema: “Um só é o vosso Mestre e vós sois todos irmãos” (Mt 23,8). Ele exorta para que o bálsamo da proximidade e de relações interpessoais de confiança perpasse ações de cuidado aos adoecidos. 

O Papa convida à vivência do “amor fraterno que em Cristo gera uma comunidade capaz de curar”. A comunidade não pode se descuidar do dom que lhes foi concedido por Jesus de “curar os enfermos”. Quanto ao sentido desta “cura”, Francisco esclarece no final da mensagem: “As curas realizadas por Jesus nunca foram gestos mágicos, mas fruto de um encontro, uma relação interpessoal, em que o dom de Deus, oferecido por Jesus, corresponde a fé de quem o acolhe”. Eis a razão pela qual o Senhor se despedia nesses encontros dizendo: “A tua fé te salvou”. 

A expressão “comunidade capaz de curar” (mensagem do Papa Francisco para o XXIX Dia Mundial do Doente, 3) deve ser entendida como exortação às paróquias para exercerem a missão imprescindível de cuidar dos enfermos. Sobretudo no contexto da pandemia de COVID-19, que requer isolamento dos infectados, com poucas pessoas no auxílio. Diante do perigo de contágio, os próprios ministros e visitadores paroquiais passaram a ter dificuldades de se aproximarem desses doentes. Mesmo assim, Francisco enfatiza justamente o aspecto relacional para a “comunidade ser capaz de curar”.

Certamente, o faz porque a proximidade é fundamental para as comunidades se exercitarem no serviço em termos samaritanos, sobretudo junto aos mais frágeis. O Evangelho da liturgia de domingo passado narrou Jesus curando a sogra de Pedro, com a aproximação e o gesto de tomá-la pelas mãos para ficar novamente de pé, em condições de retomar o seu serviço ao demais (cf. Mc 1,31).

Nesse gesto de Jesus, vemos concretamente o que Francisco diz na mensagem sobre o serviço, em referência aos enfermos: “O serviço fixa sempre o rosto do irmão, toca a sua carne, sente a sua proximidade e, em alguns casos, até ‘padece’ com ele e procura a promoção do irmão”. “Por isso, o serviço nunca é ideológico, dado que não servimos ideias, mas pessoas” (Francisco, Homilia em Havana, Cuba, 20/09/2015 – Mensagem aos Doentes, 2021). Esta citação também indica a preocupação do Papa com o perigo da “hipocrisia de quantos dizem, mas não fazem” (Mt 23,1-12), e reduzem a fé a “exercícios verbais estéreis”. 

O mesmo aspecto relacional deve ser a baliza para a Pastoral da Saúde junto aos profissionais e voluntários que se ocupam dos adoentados e do acompanhamento deles no itinerário de recuperação. A relação de proximidade e estabelecimento de confiança e respeito no trato é fundamental para o enfermo sentir sua dignidade respeitada em momento de fragilidade, e até de dependência, por aqueles que o servem.

No Dia Mundial dos Doentes, há que se lembrar dos milhares de brasileiros ceifados pela pandemia, lamentar o descaso de autoridades em disponibilizar condições adequadas para o tratamento dos atingidos pela COVID-19 e em disponibilizar com rapidez a vacinação para todos, e exigir mais compromisso e respeito pelo bem maior que é a vida.

Roguemos a intercessão de Nossa Senhora de Lourdes pela saúde de todo o povo brasileiro, por comunidades empenhadas no cuidado dos enfermos, por atendimento humanizado e condições de tratamento de saúde dignas.

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