Bendito o que vem

Iniciando a Semana Santa, a Igreja nos convida a fazer memória da entrada de Jesus em Jerusalém, indo ao seu encontro com ramos nas mãos, bem como participando de sua Paixão que se concretiza na doação de sua vida na cruz.

Jesus sai da periferia, Aldeia de Betfagé, por onde esteve a maior parte de sua vida, para agora entrar em Jerusalém, capital política e religiosa. Ele entra montado em um jumentinho, animal de pequeno porte, mas resistente e muito usado pelos camponeses para carregar peso, lavrar a terra, suportar longas viagens. Não era um animal usado nas guerras e nem para alimentar vaidades dos que queriam poder e domínio. 

Antes de entrar na grande cidade, a multidão o aclamava gritando: “Hosana ao Filho de Davi! Bendito o que vem em nome do Senhor”. Na multidão, podemos até imaginar a voz do filho perdoado, do leproso e do surdo, o cântico do publicano e do impuro, o grito do cego Bartimeu, o suspiro aliviado da pecadora que Jesus protegeu das pedradas e de tantos outros que tiveram restituída a vida, a dignidade e a esperança. Diz o texto bíblico que “a numerosa multidão estendeu suas vestes pelo caminho, enquanto outros cortavam ramos das árvores, e os espalhavam pelo caminho”. Quanta criatividade e espontaneidade no cuidado do caminho por onde Jesus ia andando. E hoje, o que colocaríamos nesse caminho?

A manifestação festiva da multidão incomodou muita gente, em especial aqueles que se consideravam justos e fiéis às leis e preceitos. É uma alegria insuportável e irritante. Gente religiosa e influente, no meio econômico e político, conseguiram convencer a multidão a gritar por morte violenta: “crucifica-o”. É um grito que vem recheado de calúnia e mentiras por parte daqueles que querem a morte de Jesus. Grito dos que querem destruir a esperança do povo, matar seus sonhos e frear a solidariedade. Preferem a soltura de Barrabás e a condenação de Jesus. E não bastando a autorização da multidão para que seja crucificado, da parte dos mais próximos sente o peso do abandono e da traição, traição daquele que o vendeu e daquele que o renegou. 

Diante de tanto barulho, negação, traição e gritaria, o mais importante foi o grito de Jesus, e este deve nos impactar. Ele morreu gritando de amor por cada um de nós, em especial por todos os que hoje sofrem na carne as dores das enfermidades, do abandono, da solidão, da indiferença e da fome. A esta última dor o pedido é este: “Dai-lhes vós mesmos de comer”.

Em meio a tanta agitação alguns atores tiveram participação decisiva, mas no silêncio e com discrição: Simão Cirineu ajudou a carregar a cruz, as mulheres e Maria permaneceram de pé observando tudo o que estava acontecendo, o Centurião bateu no peito reconhecendo Jesus como o Filho de Deus e José de Arimatéia tomou em seus braços o corpo do Senhor e o levou ao túmulo. 

Hoje, Deus continua a nos interpelar a partir dos crucificados. Não nos é permitido continuar vivendo como expectadores, levantando muros para não ver e nem ouvir o que está acontecendo do lado de lá. É vergonhoso ver parte da população que usufrui do serviço dos mais pobres tentar impedir que moradias populares sejam levantadas nas suas proximidades, com a justificativa velada de que seus imóveis possam ser desvalorizados. 

Hoje, Jesus entra em nossa cidade, na nossa Jerusalém, para nos dizer que é tempo favorável para construir espaços mais humanizados, ambiente acolhedor, lugar do cuidado e da comunhão. Alimentemos este sonho, postados, de pé como Maria, tendo os olhos fixos em Jesus.  Tenhamos confiança: Ele cuida de nós.

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