O discernimento espiritual da vocação

Discernimento tem sido uma palavra muito utilizada pelo Papa Francisco desde o início de seu magistério. Na exortação apostólica Christus vivit, diz o Sumo Pontífice: “Sem a sapiência do discernimento, podemos facilmente transformar-nos em marionetes à mercê das tendências da ocasião… e isso revela-se particularmente importante, quando aparece uma novidade na própria vida, sendo necessário, então, discernir se é o vinho novo que vem de Deus ou uma nova novidade enganadora do espírito do mundo ou do espírito maligno” (CV, 279).

No mistério de toda vocação e seu discernimento está a ação do Espírito Santo que requer a abertura e generosidade de coração, disponibilidade para seguir a Jesus, viver e testemunhar o Evangelho. Sabemos que um aspecto fundamental do chamado divino e da resposta humana é o discernimento progressivo e gradual. Discernir é justamente isto: conhecer a vontade divina na história pessoal e comunitária. Há um processo, um caminho, que vai da escuta, passa pelo entendimento e a acolhida, se concretiza na resposta generosa. Trata-se de um percurso a ser seguido e assumido, com perseverança, confiante na providência divina. O amadurecimento gradual na fé e na oração alimenta a resposta de cada um enquanto adesão livre à vocação e à missão para a qual se é chamado.

Somos convidados a discernir os apelos divinos e os sinais dos tempos que emergem da realidade concreta em que vivemos (cf. Lc 12,54-57). Todo chamado se manifesta na vida cotidiana, como no Evangelho de Mateus: “Ao passar, Jesus viu um homem chamado Mateus (…) e disse-lhe: ‘Segue-me’” (Mt 9,9). O chamado é sempre contextualizado, acontece na família, no trabalho, na escola, na comunidade cristã. Toda experiência vocacional, no discipulado, é marcada por tensões, dúvidas, consolações, medos, alegrias, conflitos, esperanças. Distinguir a voz de Deus que se dá a conhecer por meio de tantas vozes que ressoam é o desafio permanente de todo vocacionado, como nos diz os Atos dos Apóstolos: “Quem és tu, Senhor?” (cf. At 9,1-9).

O campo próprio do discernimento espiritual e vocacional é a tomada de consciência do chamado e assumi-lo com fé e humildade, na compreensão daquilo que Deus propõe ao longo do caminho (cf. Rm 12,1-2). Cada pessoa é única, e já que os contextos históricos e eclesiais se renovam de forma permanente, o chamado será sempre único e irrepetível. Há um Deus criativo no seu amor misericordioso, dinâmico no seu agir salvífico, capaz de surpreender o ser humano a cada passo de sua aproximação e presença na sua realidade concreta. Por isso, diante da novidade do agir divino, faz-se sempre necessário o discernimento de sua vontade salvífica no projeto de vida que Deus preparou para cada um de nós. Que o Espírito Santo nos conceda o dom do discernimento.

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