Paz e misericórdia

Iniciamos o tempo pascal e a liturgia nos ajuda a viver o grande mistério da nossa fé, a Ressurreição de Jesus, o Cristo. A Igreja nos convida a celebrar os 50 dias entre o domingo da Ressurreição e o domingo de Pentecostes com imensa alegria e exultação, como se fossem uma grande festa, um grande domingo. Por isso mesmo se chamam “domingos da Páscoa”, como este segundo, chamado da “Divina Misericórdia”. Somos chamados a ser um sinal visível de Cristo, testemunhando a sua misericórdia, no perdão e na paz.

Jesus, o Ressuscitado, está presente na vida da comunidade, sente-se a sua presença na ação do Espírito que vai conduzindo a Igreja para realizar o Reino de Deus (cf. Jo 20,19-31). A presença do Ressuscitado faz a comunidade cristã ser igreja de portas abertas, em saída. De fato, Jesus se apresenta no meio da comunidade e saúda os discípulos com a saudação da plenitude dos bens messiânicos – “shalom” –, a paz. O fruto é a alegria, que abre à missão, enviados pela força do Espírito Santo. Os discípulos e a Igreja continuam a missão de Jesus, manifestando por palavras e obras o amor gratuito e misericordioso do Pai. Na dúvida de Tomé, sua incredulidade, diante do Cristo Ressuscitado, temos a sua resposta decidida – “Meu Senhor e meu Deus” –, confirmando sua fidelidade. Em tudo e sempre, a paz e a misericórdia, na fé, para que “acrediteis que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais a vida em seu nome” (Jo 20,31).

Só o amor é verdadeiramente extraordinário, pois Deus é amor (cf. 1Jo 5,1-6). Sua paternidade é universal e se encarna nas relações fraternas entre as pessoas, pois amamos a Deus guardando seus mandamentos. Que bela e sugestiva Palavra: “Pois isto é amar a Deus: observar os seus mandamentos” (1Jo 5,3). Sede amorosos e misericordiosos, como vosso Pai é cheio de misericórdia e compaixão. No centro do anúncio e testemunho cristão, o amor ao próximo como expressão do amor a Deus. Deus é Pai de todos, nós somos seus filhos e filhas, somos todos irmãos. A fé consiste na adesão plena a Jesus Cristo até a entrega da própria vida, sustentados pelo Espírito da verdade, com fidelidade. Não sejamos incrédulos, mas fiéis.

O retrato da vida e missão das primeiras comunidades (cf. At 4,32-35) nos mostra um mundo novo, uma nova realidade, um só coração, uma só alma, tudo em comum, testemunhando a Ressurreição do Senhor, praticando seu projeto de amor. Esta unidade e comunhão expressa a vitória de Cristo sobre a morte, tendo como sinal e fruto a partilha, para que ninguém passe necessidade, viva com dignidade. É a verdadeira paz, com justiça, na gratuidade, na qual a vida é plena e abundante.

É justamente no Cenáculo – Evangelho de hoje – que está o grande anúncio da misericórdia divina e onde Jesus confia aos apóstolos o seu ministério. Ao mostrar-lhes as mãos e o lado, ou seja, suas chagas, as feridas da Paixão, diz: “A paz esteja convosco. Como o Pai me enviou, também vos envio… Recebei o Espírito Santo. A quem perdoardes os pecados, eles lhes serão perdoados; a quem os não perdoardes, eles lhes serão retidos” (Jo 20,21-23). É deste coração ferido, onde corre “sangue e água” (Jo 19,34), que nasce a grande onda de misericórdia que inunda a humanidade. Sangue que evoca o sacrifício da cruz e o dom eucarístico; água que recorda não somente o Batismo, mas também o dom do Espírito Santo.

Deixemo-nos inundar pela misericórdia divina. Que a paz do Ressuscitado nos abra o coração para a missão: somos enviados a evangelizar, como discípulos missionários do Senhor.

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